“Quem não é capaz de sonhar com a história diante dos documentos não é historiador.” F. Braudel

“Quem não é capaz de sonhar com a história diante dos documentos não é historiador.” F. Braudel
Villa Borghese, Roma, Itália.

O Discurso Instrutivo: expor e dissertar

domingo, 17 de dezembro de 2023

 

Por uma questão de concisão, listarei, sem longo comentário, uma série de recomendações que, caso seguidas, devem aumentar a efetividade da instrução didática em sua forma oral.

1. Para estimular a escuta ativa, a apresentação deve atrair e prender a atenção. Ela só será bem-sucedida se os estudantes esperarem ser questionados pelo professor tanto durante a aula como posteriormente. O conteúdo nunca está "acabado".

No período de aula, nunca se deve dedicar mais da metade do tempo à exposição, permitindo, assim, que a outra metade seja reservada a perguntas. Desse modo, nenhuma aula se tornará uma sessão de escuta passiva e sonolenta, ou uma em que os alunos tomam notas a fim de memorizar o que esperam que se repita nas provas.

2. O discursivo instrutivo deve ter uma dimensão tanto retórica como lógica. Apenas a organização e o rigor não bastaram para que a instrução didática seja efetiva. Para que os professores sejam eficazes retoricamente, devem mostrar que possuem um interesse vívido no assunto como um todo e "reencenar" o tópico específico que estão abordando. O entusiasmo e o discurso imaginativo são contagiantes, por meio deles se prende a atenção dos ouvintes que precisam ser estimulados. Quando os professores apenas contam o que sabem e mostram-se entediados pelo que dizem, esse tédio também é contagioso.

3. O interesse enérgico, a mente ativa e a atenção fixa são causados, seja nos professores, seja nos alunos, pelas emoções do fascínio e da descoberta. Os professores devem tentar incluir, no começo das suas aulas, um certo elemento de fascinação e, então, incitar nos alunos o sentimento de excitação causado pela descoberta, que, por sua vez, requer o fascínio. Este pode ser gerado ao se apresentar a lição como uma espécie de quebra-cabeça; desse modo, o prazer da descoberta será a resposta do enigma.

4. Professores que já sabem aquilo que os estudantes devem aprender inevitavelmente colocam-se a uma certa distância dos seus alunos. Se, durante a exposição instrutiva, eles permanecerem nessa posição distante, não serão capazes de alcançar os alunos. Se tentarem eliminar essa distância supondo que o desconhecimento dos alunos é o mesmo da média da população, acabarão avançando muito pouco. Em vez disso, devem encontrar um ponto intermediário entre o seu conhecimento e a ignorância dos alunos.

Em outros termos, os professores devem evitar estes dois extremos: não devem falar muito acima do nível dos alunos, ou seja, além da capacidade deles de entender o que se diz, e também não devem simplificar demais a exposição e, assim, perder a atenção da classe ao serem óbvios, tediosos e terem ares de superioridade. O ponto intermediário está em dizer coisas que os estudantes podem facilmente compreender acompanhadas de coisas que lhes demandam certo esforço par se entender. Este esforço deve, então, ser "reencenado" no período de perguntas depois da exposição.

5. O período de perguntas e respostas que, em todas as aulas, vem depois da exposição instrutiva deve sempre ser uma conversa bilateral. Deve incluir perguntas feitas pelos alunos e respondidas pelo professor e também perguntas do professor aos alunos. O ensino didático, se não acompanhado dessa conversa autêntica, sempre deixa os professores num estado de ignorância sobre o que conseguiram de fato realizar. Se essa falta de contato crescer com o passar do tempo, o ensino será cada vez menos efetivo. A menos que o professor descubra, por meio de perguntas e respostas, o que se passa na mente dos seus ouvintes, ele não tem como direcionar os seus esforços didáticos.

6. Para que se obtenha máxima efetividade, no começo da aula deve-se dizer aos alunos o que se espera que aprendam e por que eles devem prestar atenção nisso. Esses comentários iniciais devem ser ditos clara e enfaticamente. Depois, o conteúdo principal da exposição segue as linhas gerais dadas no início, de modo que os ouvintes percebam como um ponto leva a outro. Se uma aula tem três pontos principais, cada um pode ser brevemente resumido depois de exposto. Talvez o professor precise repetir algumas coisas. A apresentação deve terminar com um resumo claro e breve que conduza à sessão de perguntas e respostas.

Ao longo de toda a apresentação, a linguagem empregada deve ser clara e simples, porém sem ser enfadonha, e também elevada sem ser obscura. Os professores não devem ter medo de ser eloquentes, ou até mesmo dramáticos, e não devem usar gírias ou baixo calão na tentativa de serem populares. Mudanças no ritmo da expressão e no tom de voz podem ser muito úteis para prender a atenção do público e, se puderem, os professores devem acompanhar a sua fala com gestos e outros tipos de linguagem corporal. Os melhores professores não têm medo de se verem como atores num teatro.

7. Por último, e mais importante, vem o conselho de que menos é mais. Em qualquer aula dedicada à exposição didática, o objetivo não é apresentar certo conteúdo pré-definido, mesmo se essa "apresentação" deixar os estudantes confusos. O objetivo sensato é apresentar tanto conteúdo quanto os alunos sejam capazes de absorver, o que pode ser medido por meio da conversa bilateral depois da "mini-palestra". Pode ser que se apresente menos conteúdo do que se esperava, mas, assim, os alunos aprenderão mais.

As sete recomendações oferecidas acima aplicam-se principalmente à exposição instrutiva acerca de assuntos não explicados nas leituras obrigatórias. Quando houver leituras obrigatórias, a exposição na sala de aula deve consistir num resumo breve (quinze minutos, por exemplo), porém claramente organizado, em que se detalha o que os alunos deveriam ter aprendido com o livro e, a seguir, deve vir uma sessão de perguntas e respostas mais longa que de costume.

MORTIMER, Adler J. A Proposta Paidéia. Tradução de Paulo Bonafina. Campinas, SP: CEDET, 2021, p. 242-245.

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