“Quem não é capaz de sonhar com a história diante dos documentos não é historiador.” F. Braudel

“Quem não é capaz de sonhar com a história diante dos documentos não é historiador.” F. Braudel
Villa Borghese, Roma, Itália.

Geoffrey R. Elton (1921-1994)

terça-feira, 13 de novembro de 2018

Geoffrey Rudolph Elton, filho de Eva Dorothea Sommer e do historiador da Antiguidade Victor Ehrenberg, graduou-se em história antiga na Universidade de Londres. Durante a Segunda Guerra Mundial (1939-1945), Elton alistou-se no Exército britânico. Após a guerra, ele iniciou um doutorado em história inglesa pela mesma universidade onde havia se graduado. 

Sob a orientação de J. E. Neale, ele pesquisou documentos sobre a administração de Thomas Cromwell, ministro do rei Henrique VIII de 1531 até sua execução em 1540. A tese resultante desse estudo continha ideias que fundamentariam todo o seu trabalho histórico subsequente. Após obter o título de doutor, Elton lecionou brevemente na Universidade de Glasgow e de lá seguiu para a Universidade de Cambridge. Nesta universidade ele trabalhou até sua aposentadoria, em 1988. 

O cerne do trabalho histórico de Elton é a ideia de que Thomas Cromwell promoveu uma "revolução Tudor no governo". O período Tudor, segundo o historiador, não teria sido despótico. A ordem e a paz pareciam mais importante nessa época do que os princípios e os direitos. Assim, tirando proveito do plano do rei de romper com a Igreja Católica, Cromwell promoveu tantas reformas expressivas que, no início do século XVII, a Inglaterra já era administrada de forma moderna. Essa tese foi radical, uma vez que poucos historiadores haviam identificado as raízes do governo moderno na década de 1530 e aqueles que o fizeram consideraram Henrique VIII o autor das reformas. 

Elton apresentou mais detalhes sobre sua tese em artigos e em dois livros, England under the Tudors (1956) e The Tudor Constitution (1960). Assim, ele logo convenceu os eruditos e o público em geral de que a "revolução" de Cromwell foi o evento britânico mais importante do século XVI. No entanto, dentre os críticos de sua obra, Penry Williams e G. L. Harris afirmaram que ele havia negligenciado precedentes medievais dos planos de ação de Cromwell. Para Elton, as reformas de Cromwell podem não ter sido originais, mas ainda assim foram significativas. 

Embora a essência da tese de Elton tenha permanecido a mesma, o retrato de Cromwell elaborado por ele mudou ligeiramente. Em 1986, seis pesquisadores (dentre eles, ex-alunos de Elton) publicaram Revolution reassessed: Revisions in the History of Tudor Government and Administration. A pesquisa de Elton sobre a corte, o Conselho Privado e os recursos financeiros do governo foram colocados em dúvida, bem como a importância que ele atribui a Cromwell. Sem se dobrar às críticas, Elton sustentou até a morte que as reformas financeiras da década de 1530 anunciaram o começo do governo moderno. 

Elton era duro consigo mesmo e com aqueles cujas ideias eram diferentes das dele. É a partir de suas investidas agressivas contra Christopher Hill, Adorno, Hayden White, E. H. Carr, Foucault, Arnold Toynbee e muitos outros que obtemos uma ideia mais clara sobre como ele entendia a natureza da história. 

O estudo da história, segundo Elton, deve ser reconstruído por pelo menos sete grupos de pessoas: 

1º) Os amadores. Essas pessoas tendem ao sentimentalismo e veem o excepcional no que é comum e vice-versa. Além disso, não estão aptas a formular perguntas significativas sobre o passado e a julgá-lo de acordo com as condições próprias do passado. 

2º) Aqueles que adotam ideias e métodos de disciplinas afins, sem seguir uma postura crítica. Elton não se opunha à tentativa de explorar novos métodos de investigação da história, mas alertava que quando o método obtido externamente se tornava uma doutrina, isso estupidifica o estudo da história, que se resume a um repositório de exemplos selecionados ou distorcidos para apoiar esse método. 

3º) Aqueles que buscam leis gerais no passado na esperança de conseguir prever o futuro. Os historiadores fazem generalizações, sem as quais não seria possível descrever para os outros o passado. Porém, os eventos e as pessoas são individuais e particulares. Assim, as tentativas de identificar leis serão frustradas, uma vez que a história demonstra quão imprevisíveis podem ser os pensamentos e os atos dos seres humanos.

4º) Há aqueles que "buscam a salvação" em estruturas teóricas. Essas teorias dizem mais sobre o presente do que sobre o passado, e aqueles que se deixam seduzir por elas fazem perguntas que sempre apoiam a teoria, e todas as respostas são predeterminadas por isso. Nesse quesito, historiadores marxistas foram nominalmente criticados por Elton, além de filósofos e teóricos que escrevem presunçosamente sobre a história sem nunca ter empreendido qualquer investigação histórica.

5º) Os que escrevem uma história "centrada no presente". Esse tipo de historiador seleciona no passado aqueles detalhes que se encaixam com as preocupações do presente. Tratar o passado dessa forma é "suspeito e perigoso". Se se pretende entender o passado, é necessário fazê-lo de acordo com as condições próprias do passado, de "dentro" para fora.  

6º) Os que usam a história para defender mitos. Embora esses mitos possam nos confortar, os historiadores devem perseguir inflexivelmente a verdade, por mais desconfortável que isso seja.  

7º) Finalmente, há aqueles que "absorveram a convicção visivelmente difundida de que determinados excessos correntes entre os estudantes de literatura acabam impossibilitando todas as formas de estudo objetivo e, portanto, inabilitam o historiador de algum dia alcançar o que há um bom tempo ele já havia estabelecido como sua ambição." 

Assim, Elton se opôs energicamente ao relativismo e, embora admitisse que o historiador não pudesse se autolibertar totalmente de pressuposições e ideias preconcebidas, ainda assim pensou que o conhecimento objetivo era possível. Para tal, os historiadores profissionais devem se basear no estudo meticuloso das fontes históricas. Para que esse estudo seja bem-sucedido, em primeiro lugar eles devem se certificar de que as perguntas que eles levantam em relação a uma evidência não tendem a uma resposta que eles já têm em mente. 

Depois, os historiadores devem conservar na memória que no passado as pessoas não possuíam o benefício da percepção tardia. Em terceiro lugar, os historiadores devem se manter imparciais e conceber a possibilidade de empreender estudos adicionais para modificar suas ideias. Por fim, os historiadores tentar apresentar suas ideias aos outros de uma maneira inteligível. Esses desígnios e princípios devem ser inculcados nos estudantes de história. Atividades que exigem a solução de problemas, raciocínio, muita leitura e avaliação de evidências são o meio para aplicar tudo isso.        

Adaptado de HUGHES-WARRINGTON, Marnie. 50 Grandes Pensadores da História. Tradução de Beth Honorato. São Paulo: Contexto, 2002, p. 101-109.

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