terça-feira, 8 de dezembro de 2020
"Meus pais eram europeus por devoção. Nunca se consideraram russos ou poloneses, lituanos ou ucranianos. Amavam a Europa. Eram poliglotas, amavam diferentes culturas e tradições, a variedade de tesouros artísticos e literários, a arquitetura, as paisagens, as pradarias e as florestas, as cidades antigas com suas alamedas calçadas com pedras arredondadas. Amavam os cafés; amavam até mesmo o som dos sinos das igrejas. E acima de tudo, amavam a música.
Hoje, isso não é nada de mais. Quase todo mundo na Europa é um europeu, e muitos estão na fila para se tornar europeus. Mas noventa anos atrás, meus pais e muitos judeus modernos como eles eram os únicos europeus da Europa. Cada um dos outros era um patriota búlgaro, um patriota holandês ou um patriota irlandês. Alguns eram pan-eslavistas ou pangermanistas. Meus pais eram, noventa anos atrás ou se tanto, os únicos europeus da Europa. Eram jovens estudantes em universidades europeias, e seu amor pela Europa nunca foi retribuído. Por serem europeus, foram rotulados como cosmopolitas, parasitas, intelectuais sem raízes. Alguns de vocês são idosos o suficiente para lembrar desses três pejorativos, que foram parte de um vocabulário compartilhado por nazistas e comunistas. Eles se dirigiam aos meus pais."
OZ, Amós. "Em Louvor das Penínsulas" (novembro de 2015). In: Como Curar um Fanático - Israel e Palestina: entre o certo e o certo. Tradução de Paulo Geiger. São Paulo: Companhia das Letras, 2015.
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