“Quem não é capaz de sonhar com a história diante dos documentos não é historiador.” F. Braudel

“Quem não é capaz de sonhar com a história diante dos documentos não é historiador.” F. Braudel
Villa Borghese, Roma, Itália.

Entrevista: O Ofício de Historiador

quarta-feira, 31 de maio de 2017

Pesquisa em inquéritos policiais do século XIX no Arquivo Público do Estado do Espírito Santo. Início de 2008.

Como mencionei na página de agradecimentos da minha dissertação de mestrado, o historiador é um solitário. Seu trabalho é incansável, mas muito recompensador. Imagine descobrir, em meio às páginas amarelecidas de um arquivo, ou mesmo em fontes publicadas e já conhecidas, histórias incríveis, estudos inovadores e ideias que continuam atuais. Soma-se a isso o privilégio de lembrar o que os outros esquecem e contribuir para a preservação do patrimônio material e imaterial da humanidade, que são algumas das mais nobres funções sociais dos historiadores. 

Na entrevista abaixo, concedida a um aluno que cumpre um pré-requisito de uma especialidade, eu explico um pouco sobre o ofício de historiador.   

1. O que o motivou na escolha de ser um historiador ou professor de História?
A primeira observação que faço a essa pergunta é que não faço qualquer distinção entre ser historiador ou ser professor de História, não só por ter cursado tanto a licenciatura quanto o bacharelado, como também por não enxergar a menor separação entre o ensino e a pesquisa. Um professor deve ser um pesquisador, e um pesquisador precisar divulgar as suas descobertas, através das melhores ferramentas didáticas que dispõe.

Respondendo propriamente a pergunta, digo que sempre amei a História. Desde pequeno, sempre fui muito curioso, e na História eu encontrei uma fonte inesgotável de conhecimentos. Conhecer as diferentes culturas e civilizações, constatar a alteridade nas formas de organização social, no pensamento e na religião e perceber os extremos da existência humana é um desafio pra lá de instigante. 

2. O que mais lhe chama a atenção ao estudar História? 
O cumprimento exato das profecias bíblicas ao longo dos séculos, sobretudo as que constam nos livros de Daniel e Apocalipse. É também muito interessante perceber como a arqueologia e a investigação histórica têm confirmado muitos relatos das Escrituras.

3. Qual seria o aspecto mais interessante de sua profissão? Qual é o mais difícil?
Sobre o aspecto mais interessante da pesquisa, é tudo o que respondi acima: a constante descoberta ao estudar as diferentes civilizações e a constatação do cumprimento das profecias. Sobre o aspecto mais interessante do ensino, é poder inspirar alguns alunos a amarem a História, a se tornarem pessoas melhores. 

A pesquisa histórica é tremendamente difícil, uma vez que o historiador precisa penetrar nas consciências humanas a partir de apenas alguns vestígios do passado, as fontes. Além disso, o historiador é um "sujeito" da História e, portanto, confunde-se com o seu objeto de estudo. Desta forma, a duras penas persegue a meta da objetividade, fundamental a qualquer pesquisa que se pretenda científica. No campo do ensino, o desafio também imenso, sobretudo num país como o Brasil, que não valoriza o professor ou a educação. 

4. O que é História?
É a ciência dos homens no tempo, segundo o grande historiador Marc Bloch (1836-1944). Se quisermos levar em consideração uma definição mais detalhista, podemos considerar a História como "a ciência dos atos humanos do passado e dos vários fatores que neles influíram, vistos na sua sucessão temporal" (José Van Den Besselaar).

5. O que é historiografia?
Trata-se do estudo e da escrita da História. O registro e a interpretação dos eventos passados têm evoluído ao longo dos tempos e, no início do século XIX, os historiadores Barthold G. Niebuhr (1776-1831) e, sobretudo, Leopold von Ranke (1795-1886) revolucionaram a historiografia, fundando a moderna ciência histórica. Ainda no século XIX, Karl Marx (1818-1883) e Friedrich Engels (1820-1895) desenvolveram o materialismo histórico dialético, que marcaria gerações de historiadores marxistas, interessados nos acontecimentos relacionados à luta de classes. A partir de 1929, com a fundação da revista Annales d'Histoire Economique et Sociale, por Lucien Febvre (1878-1956) e Marc Bloch, a historiografia passou a fazer importantes cruzamentos com a Antropologia, a Sociologia, a Economia e muitas outras áreas do conhecimento. A noção de documento histórico se ampliou, passando a incluir fontes iconográficas, arqueológicas, orais, etc., além das fontes textuais. Graças a Fernand Braudel (1902-1985), difundiu-se a perspectiva de se estudar a história a partir da curta, da média e da longa duração.

6. Qual é a importância do estudo da História?
A História nos permite ampliar os horizontes mentais e culturais, nos obrigando a adotar uma postura de humildade perante a vida. Como dizia o historiador Henri-Irénée Marrou (1904-1977), "para quem não uma alma pequena e vil, a História é de uma grandeza que nos aniquila." Através da História, adquirimos maturidade e sabedoria, e nos tornamos mais tolerantes. 

7. Qual é o trabalho de um historiador e seu campo de trabalho?
A partir de sua matéria-prima, as fontes ou documentos históricos, o historiador pesquisa sobre os mais diversos temas que envolvem os seres humanos. A partir da "Nova História", os historiadores seguem a máxima "onde há homens, há história", tomando para si um campo extremamente amplo de pesquisa e estudos (de biografias e temas políticos e militares ao imaginário e à história das mentalidades; de conjunturas econômicas e estruturas sociais à história da sexualidade, do medo, do beijo, da moda).

8. Quais são as principais técnicas de pesquisa e levantamento histórico?
São a heurística (a pesquisa de fontes) e a crítica histórica (o exame judicioso das fontes ou documentos históricos - todos os vestígios deixados pelo homem ao longo do tempo). A crítica histórica divide-se em crítica externa, que corresponde à etapa em que o historiador pede ao documento a prova da autenticidade para ver se pode servir de testemunha e crítica interna, que é o ato em que o historiador passa a julgar a veracidade da testemunha.

9. O que é Cronologia e Periodização?
A cronologia é a verdadeira coluna vertebral da análise documental, a primeira estrutura do método histórico. Trata-se do estudo do tempo e de suas divisões, com o objetivo de distinguir a sucessão dos fatos. A periodização, por sua vez, é uma operação de "corte" do tempo, de segmentação da cronologia em etapas temporais fortemente individualizadas. Assim, a periodização foi uma das primeiras operações intelectuais destinadas a tornar inteligível o passado das sociedades humanas. 

A partir dos Annales, tornou-se forte a tendência para fragmentar a história e ver nela a justaposição de durações, de fenômenos, de fatos heterogêneos.

10. Qual é a diferença entre conhecimento histórico e a reflexão histórica?
O conhecimento histórico refere-se aos conhecimentos básicos que um historiador ou estudante de História deve dominar: a crítica histórica, os principais fatos, suas causas e consequências. A reflexão histórica, por sua vez, cabe a um homem maduro, segundo o grande historiador holandês Johan Huizinga (1872-1945). A partir dela, esse estudioso experimentado da experiência humana poderá tecer com segurança algumas generalizações, elaborar teorias e, segundo alguns, até "leis", embora a maioria dos historiadores na atualidades rejeitem em absoluto a existência de "leis da História".

«César - a Vida de um Soberano»

terça-feira, 30 de maio de 2017

Adrian Goldsworthy nos brindou, mais uma vez, com uma obra que se recomenda a si própria. Eis a referência:

GOLDSWORTHY, Adrian. César - A Vida de um Soberano. Tradução de Ana Maria Mandim. Rio de Janeiro / São Paulo: Record, 2011

Em Portugal, César foi traduzido já há alguns anos, pela Esfera dos Livros. Notem que, em terras lusitanas, o subtítulo foi ainda mais condizente com os feitos do biografado: A Vida de um Colosso

Sem sombra de dúvidas, César foi um colosso. Ainda em vida, teve a oportunidade de colher os frutos de seus grandes feitos na esfera militar e política. Após o seu trágico assassinato em pleno Senado da República, no ano 44 a.C., o fascínio do mito que envolveu o homem só se intensificou. Na política, César foi crucial para o fim do sistema republicano, que durava já há quatro séculos. Na esfera militar, sua influência atravessou os séculos, e Napoleão Bonaparte foi apenas um dos comandantes famosos que se inspiraram nos seus relatos sobre a Guerra das Gálias (aliás, uma obra que colocou César entre os grandes escritores de sua época). Eis uma relação das suas principais campanhas: 
Além da leveza indescritível do texto, a biografia escrita por Adrian Goldsworthy - um dos mais brilhantes romanistas da atualidade - demonstra ter grande erudição. Como cabe a todo historiador digno desse nome, reconhece as lacunas e os pontos controversos do seu objeto de pesquisa. Muito além de explicar a vida de um homem, Adrian Goldsworthy forneceu um quadro geral da República e, mais especificamente, do mundo romano no século I a.C. Para auxiliar o leitor, foram disponibilizados nada menos que quinze mapas, duas dúzias de imagens, um epílogo (no qual consta as interpretações de César ao longo da História), uma cronologia, uma bibliografia, notas e um índice onomástico. Enfim, essas 767 páginas certamente não serão as últimas escritas sobre Caio Júlio César, como Adrian admite à p. 674, mas certamente estão à altura de um dos maiores líderes de todos os tempos.      

A Era Vargas (1930-1945)

segunda-feira, 29 de maio de 2017

A Prof.ª Isabel Aguiar disponibilizou um excelente resumo da Era Vargas, com direito a documentários, charges, imagens e tópicos. Confira-o aqui

Para os alunos do 9º ano do Ensino Fundamental, esse resumo é imperdível.

Atravessando o Rubicão

domingo, 28 de maio de 2017

Em algum momento no início do dia 11 de janeiro de 49 a.C., César alcançou as coortes em marcha e chegou ao Rubicão. Antes de cruzar a ponte, César teria parado, ficando algum tempo em silêncio antes de começar a falar aos seus oficiais. Ao decidir cruzar o rio, teria declarado: "A sorte está lançada" (iacta alea est). 

"A frase de apostador é apropriada, porque ele embarcava em uma guerra civil quando pouco mais de um décimo de suas forças estava com ele. Mesmo quando todas as suas tropas concentraram-se, ele ainda seria superado em recursos por seus inimigos. Embora, retrospectivamente, saibamos que César venceu, isto não era de modo algum -, talvez nem mesmo provável - na época. Ele escolheu lutar porque, no que lhe dizia respeito, todas as opções eram piores. A República fora dominada por uma facção que ignorava a prática comum das leis e, particularmente, recusava-se a admitir os poderes e direitos tradicionais do tribunato. César foi, no entanto, muito claro em que, primeiro e antes de tudo, era porque esse grupo de homens o atacara que ele agora se movimentava contra eles. O mundo romano estava sendo mergulhado no caos e no sangue porque um homem estava determinado a proteger sua dignitas enquanto outros estavam decididos a destruí-la. (...) A guerra civil, que começou em janeiro de 49 a.C., poderia não ter acontecido não fosse o ódio amargo, quase obsessivo, a César, de homens como Catão, Domício Aenobardo e outros, que os tornava irredutíveis em seu propósito de impedir sua volta à vida pública como cônsul. Mas até isso pouco teria importado se Pompeu não tivesse visto a oportunidade de demonstrar sua supremacia e mostrar a esses homens, bem como a César, que precisavam satisfazê-lo. Finalmente, a luta não teria começado se César não tivesse estipulado um preço tão alto para o seu prestígio e status." 

GOLDSWORTHY, Adrian. César - A Vida de um Soberano. Tradução de Ana Maria Mandim. Rio de Janeiro / São Paulo: Record, 2011, p. 494-495. 

Lutero em Worms (1521)

sábado, 27 de maio de 2017

Lutero na Dieta de Worms, por Anton von Werner (1877).

"Lutero combatia a tirania e a impiedade. Em vez de condená-lo sem querer ouvi-lo, que lhe dessem juízes; que discutissem suas ideias; que lhe mostrassem em que eram perniciosas. 

O provisor de Trier retomou a palavra. 'Sem discussão: retratava-se ou não?' Deu-se então a célebre declaração, cujas muitas versões passaram imediatamente a circular por toda a Alemanha. Traduzimos a mais provável: 'A menos que me convençam, por testemunhos das Escrituras ou por  uma evidência da razão (pois não acredito apenas no papa e nos concílios: está provado que por vezes demais erraram e se contradisseram), tenho um compromisso com os textos que produzi; minha consciência é cativa das palavras de Deus. Não posso nem quero revogar o que quer que seja, porque agir contra a própria consciência não é seguro nem honesto. Que Deus me ajude, Amen!' 

Fez-se um imenso alvoroço. Em meio às injúrias e exclamações, Lutero retirou-se. Voltou para a estalagem. E, tão logo avistou de longe seus amigos, ansiosos, ergueu as mãos. 'Ich bin hindurch!', gritou duas vezes. 'Eu saí de lá!' No dia seguinte, o mundo inteiro era informado da grande recusa do irmão Lutero, 'que escreve contra o papa'. E aqueles que julgavam conhecê-lo e o amavam surpreendiam-se com uma ousadia de que não percebiam a razão sobre-humana."  

FEBVRE, Lucien. Martinho Lutero, Um Destino. Tradução de Dorothée de Bruchard. São Paulo: Três Estrelas, 2012, p. 200-201.

Pompeu e o Primeiro Triunvirato

sexta-feira, 26 de maio de 2017

Busto de Pompeu, o Grande (106-48 a.C.). 
Carlsberg Glyptotek, Conpenhagen. Créditos: Ancient.eu 

"Pompeu aceitara Crasso como igual, porque este era muito mais velho e lutara por Sulla. Talvez tão importante seja o fato de que Pompeu sempre confiara em que seu próprio carisma e seus espetaculares feitos militares - três triunfos em comparação com uma mera ovação a César - davam-lhe vantagem confortável sobre o rival. (...) Ele achava mais fácil gostar de César que de Crasso, mas, talvez, isso fosse assim porque não o via, a princípio, como competidor. Mesmo após os sucessos de César na Gália, Germânia e Britânia, Pompeu ainda o considerava um aliado menor. Afinal, ele triunfara em três continentes - Ásia, África e Europa - e derrotara muitos opositores diferentes, alguns deles romanos, no processo, e não apenas tribos bárbaras."

GOLDSWORTHY, Adrian. César - A Vida de um Soberano. Tradução de Ana Maria Mandim. Rio de Janeiro / São Paulo: Record, 2011, p. 484-485. 

A Civilização Helenística

quinta-feira, 25 de maio de 2017

Farol de Alexandria, uma das sete maravilhas do Mundo Antigo. Um desenho do arqueólogo alemão H. Thiersch (1909). Créditos: Ancient.eu

Assim ficou conhecido o mundo nascido das conquistas de Alexandre, o Grande. Após a morte deste, em 323 a.C., nenhum herdeiro foi capaz de manter a unidade de seu império. Consequentemente, durante cerca de meio século foram travadas sucessivas guerras e lutas entre seus quatro generais (Ptolomeu, Selêuco, Lisímaco e Cassandro). 

Após tais disputas, houve um certo equilíbrio no fim dos anos 80 do século III. A Macedônia dos antigônidas, a Ásia dos selêucidas e o Egito, domínio dos lágidas (ou ptolomeus), foram os três Estados que dividiram os despojos do conquistador. Entre esses três reinos, as velhas cidades gregas foram objeto de rivalidades, e apenas Rodes e as confederações de Acaia e Etólia conservaram durante certo tempo alguma liberdade de manobra. A partir do fim do século II a.C., porém, Roma passou a arbitrar as querelas entre elas e a impor o seu domínio. 

A civilização helenística foi caracterizada pelo surgimento de uma nova forma de monarquia, um poder que 1º) se estendia por vastos estados territoriais; 2º) era resultante de uma conquista e, finalmente, 3º) baseava-se - ao menos teoricamente - nas qualidades pessoais de quem o exercia. Existiam, contudo, diferenças entre as três grandes monarquias. Os antigônidas precisavam levar em consideração a antiga "lei macedônica" e os poderes da assembleia do exército. Os selêucidas logo perderam partes de seu Estado heterogêneo; assim, surgiram reinos como o dos atálidas de Pérgamo. Os lágidas, por outro lado, herdeiros das estruturas do Egito dos faraós, conseguiram, por um século, manter uma autoridade absoluta sobre o país. Graças a essa autoridade e riqueza, Ptolomeu fundou em Alexandria a famosa Biblioteca e o Museu (um centro de pesquisas), tornando essa cidade o centro mais esplendoroso do mundo helenístico. 

Ao longo do século IV a.C., o idioma grego foi substituído pelos dialetos locais por quase toda a parte, mas tornou-se a língua oficial das chancelarias reais. No plano religioso e artístico, a dominação greco-macedônica não pôde suprimir tradições que existiam no Egito, na Síria, na Palestina e na Ásia Menor. Certas elites, especialmente as religiosas, podiam aspirar a conservar uma autoridade, seja integrando-se à civilização dos conquistadores ou instigando contra eles movimentos de resistência à helenização (caso da Revolta dos Macabeus, na Judeia, durante o reinado de Antíoco IV). 

Houve considerável desenvolvimento da vida econômica, artística e cultural no período helenístico. No plano econômico, as trocas se intensificaram e a videira e a oliveira foram introduzidas em certas regiões orientais. No plano artístico, destacam-se os grandes conjuntos arquitetônicos (como o de Pérgamo). Na ciência, os progresso mais consideráveis ocorreram em Alexandria, e Euclides, Arquimedes e Aristarco de Samos se destacaram, respectivamente, na matemática, na física e na astronomia.  

Bibliografia consultada:
MOSSÉ, Claude. Dicionário da Civilização Grega. Tradução de Carlos Ramalhete, com a colaboração de André Telles. Rio de Janeiro: Zahar Ed., 2004, p.159-160.

Tarefas - EEEFM Joaquim B. Quitiba

quarta-feira, 24 de maio de 2017


Os alunos do 2° N1 deverão responder as questões passadas em sala e também copiar no caderno a seguinte citação:

"As ideias de Locke passaram da Inglaterra para a França com Voltaire, em 1789; foram adotadas por Montesquieu em sua visita à Inglaterra, em 1729-1731; encontraram ressonância em Rousseau e outros, antes e durante a Revolução Francesa; e apareceram explosivamente na Declaração de Direitos do Homem, na Assembleia Constituinte, em 1789. (...) Os direitos que Locke reivindicara passaram a Carta de Direitos nas dez primeiras emendas à Constituição norte-americana. (...) Seus ensaios sobre tolerância influenciaram os pais fundadores da república norte-americana a separarem a Igreja do Estado e a decretarem a liberdade de culto. Raramente, na história da filosofia política, teve um homem influência tão duradoura."
DURANT, Ariel & DURANT, Will. História da Civilização - A Era de Luís XIV. São Paulo: Companhia Editora Nacional, 1967, p. 121. 

Os alunos do 3° N1, por sua vez, deverão ler e resumir o artigo A História Invertida. As orientações sobre como fazer a tarefa foram passadas na aula de ontem (os faltosos deverão se informar com os colegas). 

Da Vinci x Lutero

terça-feira, 23 de maio de 2017

Homem Vitruviano, desenho de Leonardo da Vinci (c. 1490).

"(...) A figura tão citada hoje em dia como homem do Renascimento, Leonardo da Vinci, não merece esse título. Foi obviamente escolhido para lisonjear os nossos interesses dominantes: a arte e a ciência. Excelente como pintor, preocupava-se também com a engenharia civil, a aviação e a observação científica em geral. As suas máquinas não funcionavam, mas os seus desenhos e cálculos para a construção das mesmas são notáveis. A sua combinação das 'duas culturas' é para nós surpreendente, tal como o é a sua porfiada 'investigação'. Contudo, de todos os homens da sua época, ele é o caso marcante do génio que não era um homem do Renascimento no sentido pretendido: faltavam-lhe as belas letras. Ele próprio fala dessa limitação. Não se importava com o latim ou o grego. Jamais escreveu poemas ou discursos. Tinha pouco a dizer sobre filosofia ou teologia. Não tinha interesse pela história; para pintar um mural no Palácio do Governador em Florença, teve de pedir emprestadas as notas de Maquiavel sobre uma batalha famosa. Tão-pouco era arquitecto ou escultor. Pior de tudo, não tinha gosto para a música, que (dizia ele) tinha dois defeitos graves - um era ser mortal, na medida em que a música deixava de existir logo que a peça terminava; e outro a que ele chamava 'desperdício': a sua contínua repetição, que a tornava 'desprezível'. 

Uma hierarquização cuidadosa dos candidatos colocaria Lutero mais alto do que Leonardo, pois Lutero era um grande escritor e orador (embora não fosse um grande classicista), músico, teólogo, um observador experimentado da natureza e (como vimos) um participante prazenteiro da vida dos sentidos."  

BARZUN, Jacques. Da Alvorada à Decadência - 500 anos de vida cultural no Ocidente (de 1500 à actualidade). Tradução de António Pires Cabral e Rui Pires Cabral. Lisboa: Gradiva, 2003, p. 95.

O Prolífico Lutero

segunda-feira, 22 de maio de 2017

Lutero com o alaúde. 
Créditos: Fondo Antiguo de la Biblioteca de la Universidad de Sevilla.

"No fim das contas, Lutero era o chefe de um partido poderoso. Alguns chamavam-lhe o Papa Protestante, cuja orientação devia ser procurada em todas as questões. Lutero abominava estes encargos. (...) Durante 28 anos, Lutero pregou três ou quatro sermões, todos os domingos, além de escrever os inumeráveis folhetos, comentários à Bíblia, traduções e cartas já mencionadas. A sua obra perfaz 55 volumes na edição inglesa corrente. Não admira que deixasse para Kathie as questões de dinheiro e outros assuntos domésticos. 

Para alívio do seu heróico trabalho de secretária, recorria às vistas da natureza. Tinha um amor intenso pelas coisas vivas e tornou-se quase um naturalista. Tocava flauta e guitarra, compondo e adaptando músicas às suas próprias letras. São-lhe atribuídos cerca de 40 hinos, incluindo o soberbo Ein feste Burg ist unser Gott. Os contemporâneos consideravam que estes hinos faziam tanto pela causa como os seus livros. Na verdade, para Lutero a música ocupava o mesmo plano que a teologia."  

BARZUN, Jacques. Da Alvorada à Decadência - 500 anos de vida cultural no Ocidente (de 1500 à actualidade). Tradução de António Pires Cabral e Rui Pires Cabral. Lisboa: Gradiva, 2003, p. 37.

A Loucura expõe o Clero

domingo, 21 de maio de 2017

Um monge medieval se embriagando.

Declamação: a Loucura fala

"Chegam muito perto da felicidade dos teólogos aqueles que vulgarmente se chamam 'religiosos' e 'monges', com duas denominações sumamente falsas, uma vez que boa parte deles está muito longe da religião e que ninguém é mais visível em todos os lugares. 

Não vejo o que poderia haver mais lastimável que eles, se eu não viesse em seu socorro de muitas maneiras. O fato é que todos execram tanto essa classe de homens que se acredita que deparar com um, ainda que por acaso, é de mau agouro. E, no entanto, eles têm para consigo mesmos uma magnífica condescendência. 

Em primeiro lugar, consideram a suprema piedade se souberem tão pouco as letras que nem sequer podem ler. (...) 

Entre eles verás alguns tão rigidamente observantes das normas religiosas que, como roupa exterior, não usam senão as de cilício e, como roupa de baixo, finos linhos milésios; outros, em contrapartida, por fora vão de linho e por dentro de lã. De igual modo, há outros que se abstêm horrorizados do contato do dinheiro como de um veneno; mas enquanto isso, não se guardam em absoluto do vinho nem do contato com as mulheres. Enfim, há em todos eles um admirável empenho em distinguir-se no gênero de vida e não se preocupam em ser semelhantes a Cristo, mas sim em ser diferentes entre si. É por isso que grande parte de sua felicidade está em suas denominações. Enquanto uns se comprazem em chamar-se 'cordeleiros', e entre esses há 'coletinos', 'menores', 'mínimos', e 'observantes'; outros preferem ser 'beneditinos' ou 'bernardinos', 'brigidenses' ou 'agostinianos', 'guilhermitas' ou 'jacobitas', como se, em realidade, fosse pouco chamar-se cristãos. 

Uma grande parte destes coloca tanto empenho em suas cerimônias e em tradiçõezinhas humanas que crê que um só céu é prêmio pouco digno para tantos méritos; e não pensam que Cristo, desprezando todas essas minúcias, vai exigir deles só que tenham posto em prática um único preceito, o da caridade."  

ERASMO DE ROTTERDAM. Elogio da Loucura. Tradução de Elaine C. Sartorelli. São Paulo: Hedra, 2013, LIV, p. 135-137.

Lutero em Viagem a Worms

sábado, 20 de maio de 2017

Jan Huss na estaca. Xilogravura colorida de um livro de oração hussita (1563). The Granger Collection, Nova York. 
A lembrança do martírio desse pré-reformador perturbava Lutero, enquanto seguia para a Dieta de Worms.

"Lutero não viajou para Worms como homem respeitoso dos poderes constituídos que, ao receber uma convocação, obedecia sem pensar ou hesitar. Lutero viajou para Worms como quem pisa sobre brasas. Jogando-se de cabeça, sacrificando intimamente sua vida, nutrindo-se, além disso, dessa fé invencível na salvação final que todo homem em perigo vai buscar nas raízes profundas de sua vitalidade e que, em Lutero, era uma fé cega, inquebrantável, em Deus. Lutero viajou para Worms como quem vai para o martírio ou para o triunfo: dois aspectos, afinal, de uma mesma realidade. Triunfo, porém, só se pode entender por Deus e diante de Deus. (...) A lembrança de Jan Huss e sua morte em Constança naturalmente assombrava a mente de Lutero, de todos os seus amigos e, sem dúvida, de todos os seus inimigos... Mas o que fazer? Seu Deus o impelia, seu Deus o arrastava. Deixou de hesitar. Viajou para dar testemunho de sua fé, para afirmar seu Deus."  

FEBVRE, Lucien. Martinho Lutero, Um Destino. Tradução de Dorothée de Bruchard. São Paulo: Três Estrelas, 2012, p. 197-198.

Pérgamo, a Cidade do Trono de Satanás

sexta-feira, 19 de maio de 2017

Detalhe do Altar de Pérgamo. Esse monumento atualmente está no Museu de Pérgamo, em Berlim.

Pérgamo (atual Bergama, na Turquia) era a antiga capital da Mísia, e estava situada no vale do Rio Caicos. Seu período de maior esplendor ocorreu entre os séculos III e II a.C., quando os atálidas governaram um reino que abrangia grande parte da Ásia Menor ocidental. Átalo III deixou o reino como herança aos romanos que, portanto, transformaram a região em província em 133 a.C. O procônsul passou a residir em Pérgamo, a capital provinciana. 

A acrópole foi construída no cume e nas encostas de uma colina que sobe por cerca de 300 m acima da planície. A maioria dos prédios públicos importantes estavam ali, incluindo um gigantesco altar a Zeus, com 39 m de comprimento, 36,5 m de largura e 12 m de altura (ver acima). A escultura das laterais do altar retrata uma guerra entre deuses e gigantes, refletindo as vitórias dos habitantes de Pérgamo sobre os gauleses, a quem eles empurraram para o centro da Ásia Menor (mais tarde, eles se transformaram nos gálatas do Novo Testamento). Acredita-se que, por abrigar esse altar, Pérgamo foi conhecida por abrigar o "trono de Satanás" (Apocalipse 2:13). 

Além do altar a Zeus, Pérgamo tornou-se famosa pelo Asclepion - o complexo de Asclépio ou Esculápio, o deus da cura - no qual existia uma grande escola de medicina (onde teria estudado o renomado médico Galeno), um hospital que se assemelhava a um spa, um teatro e um santuário dedicado a Asclépio. 

O nome de Pérgamo foi perpetuado na palavra pergaminho, que foi inventado ou desenvolvido ali quando Ptolomeu V (203-181 a.C.) proibiu a exportação de rolos de papiro, temendo que o acervo da grande biblioteca de Pérgamo logo superasse o da biblioteca de Alexandria. 

Havia uma igreja cristã em Pérgamo no fim do século I. Essa cidade foi a destinatária de uma carta do apóstolo João, escrita quando o apóstolo estava exilado na ilha de Patmos (Apocalipse 2:12-17).  

Bibliografia consultada: Dicionário Bíblico Adventista do Sétimo Dia. Tatuí, SP: Casa Publicadora Brasileira, 2016, p. 1062. 

Era Uma Vez Uma História

quinta-feira, 18 de maio de 2017

Uma das mais brilhantes iniciativas culturais da Tv aberta brasileira dos últimos tempos é a série Era Uma Vez Uma História. Lançada pela Bandeirantes no mês passado, é apresentada por Dan Stulbach e pela historiadora Lilia Schwarcz. O primeiro episódio trata da transferência da Corte Real portuguesa para o Brasil, e eu o recomendo especialmente para o oitavo ano do Ensino Fundamental e para o segundo ano do Ensino Médio:



A parte 2 desse primeiro episódio pode ser vista aqui. Os demais episódios entram na reprodução automática ou podem ser encontrados no canal do Grupo Bandeirantes. A exibição do episódio final ocorrerá hoje, na Band. 

Debates sobre a Ocupação da América

quarta-feira, 17 de maio de 2017

Segundo uma teoria tradicional, grupos de homens modernos (Homo sapiens) teriam atravessado o Estreito de Bering há cerca de 15 mil anos, ocupando a partir daí o continente americano. No entanto, um estudo publicado recentemente na revista Nature afirma que ossos de um mastodonte (um parente extinto dos elefantes) encontrados em San Diego (EUA), e datados de 130 mil anos, apresentam sinais de terem sido quebrados com ferramentas de pedra. Isso seria uma indicação de que hominídeos chegaram ao continente muito antes do que se pensava. 

Assim, a descoberta atiça ainda mais a controvérsia sobre a cronologia da ocupação humana nas Américas, alimentado por outros achados, como os do sítio de Pedra Furada, no Parque Nacional da Capivara, Piauí (Brasil), cuja datação sugere que grupos de Homo sapiens já habitavam a região entre 20 mil e 50 mil anos atrás. 

Fonte: O Globo  

A Contrarreforma

terça-feira, 16 de maio de 2017

Livro contendo o Index Librorum Prohibitorum (Veneza, 1564).

Dois monges camáldulas, Paolo Giustiniani e P. Quirino, analisaram de forma contundente os males da Igreja no Libellus ad Leonem (1513). No século anterior (o XV), a duras penas a Igreja havia conseguido superar o cisma do Ocidente e as teorias conciliares pelas quais o concílio geral dos bispos se sobrepunha ao poder papal. Contudo, não realizara uma autêntica reforma interna, cuja necessidade era muito sentida nos meios católicos. 

O processo histórico-religioso conhecido como Contrarreforma teve aspectos positivos e alternativos, que já se prenunciava com a fundação do Oratório do Amor Divino, uma congregação dedicada à caridade e à devoção, surgida em 1517, no mesmo ano em que Lutero lançou as suas 95 Teses. O principal líder dessa contra-ofensiva católica foi o papa Paulo III (1534-1549). 

Sob seu pontificado, foram tomadas algumas medidas importantes: 

- Uma comissão para a reforma da cúria elaborou, em 1537, um informe, o Consilium enmendanda ecclesia. Esse documento assinalava os males da Igreja, mas suas sugestões nunca foram postas em prática, uma vez que seu radicalismo se chocava com a cautela do pontífice.

- Em 1540, Paulo III reconheceu e aprovou a criação da Companhia de Jesus, ordem fundada em 1534 por Santo Inácio de Loiola. A companhia foi organizada de modo rigorosamente hierárquico e militar, e aos votos ordinários somou-se um voto de obediência total ao papa.

- Em 1542, Paulo III reorganizou a Inquisição Romana, que gozou de jurisdição universal e foi confiada a cardeais inquisidores da congregação do Santo Ofício.

- Em 1545, o referido papa convocou o Concílio de Trento. Inicialmente, participaram dele apenas cerca de 30 padres, e desde o princípio fracassou qualquer possibilidade de reconciliação com os luteranos. As sessões realizadas em Trento (cidade italiana encravada nos territórios imperiais) prolongaram-se durante 18 anos, tendo começado já de uma controvérsia: enquanto o imperador pediu que se abordassem logo as questões referentes à reforma disciplinar do clero, o papa considerava oportuno iniciar com as discussões sobre o dogma e a ortodoxia. 

O Concílio de Trento passou por uma longa suspensão durante o papado de Paulo IV (1555-1559). Este acentuou a repressão e fundou, em 1559, a Congregação do Índice, encarregada de examinar todas as obras consideradas perigosas para a fé e para a ortodoxia, proscrever sua leitura e elaborar um índice de livros proibidos, para ordenar sua destruição. 

O Concílio de Trento terminou em 1563, sob o pontificado de Pio IV (1559-1565), graças à decisiva mediação do cardeal Giovanni Morone. A posição da Igreja saiu reforçada, e o caráter divino do sacerdócio foi reafirmado. Além disso, confirmou-se a supremacia do papa, como autêntico representante de Cristo e sucessor de Pedro. Além da decidida defesa da doutrina católica, foram introduzidas algumas inovações no que se refere à reforma moral e disciplinar, a começar pela criação de seminários, escolas de formação dos futuros sacerdotes. Embora o latim se mantivesse na missa, foi criada uma forma de divulgação oral da mensagem evangélica adequada à massa dos fiéis: o Catecismo Romano (1566). Todos os bispos, párocos e abades passaram a ser obrigados a residir em suas respectivas sedes e foi-lhes vetado o acúmulo de benefícios eclesiásticos.  

Bibliografia consultada: ALMARZA, Meritxell & SÁNCHEZ, José Luis (dir.). História das Religiões - Crenças e práticas religiosas do século XII aos nossos diasTradução de Carlos Nougué. Barcelona: Folio, 2008, p. 50-51.

Tons Seculares nos "Sermões em Tinta"

segunda-feira, 15 de maio de 2017

Detalhe da obra Banquete na Casa de Levi (1573), de Paolo Veronese. Por introduzir alguns ébrios e um cão na cena da Última Ceia, Veronese respondeu a um longo interrogatório no qual foi acusado de sacrilégio.

"No Renascimento partia-se do princípio de que as artes gráficas deviam lidar com temas claros - de facto, tinham de 'contar' qualquer coisa, além de agradarem aos olhos e ao sentido de composição e de obedecerem às regras da perspectiva. Naturalmente, a mitologia clássica era muito apelativa, mas os temas cristãos não perderam terreno, especialmente depois da Contra-Reforma, que promoveu a decoração de novas igrejas e a renovação das antigas. A edificação religiosa e moral mudou-se, por assim dizer, das janelas e pórticos das igrejas para as suas paredes interiores, altares e tectos: os 'sermões em pedra' da Idade Média são agora 'sermões em tinta'. 

A Bíblia e a vida dos santos continuaram a fornecer figuras e cenas, mas estas secularizaram-se de variadas formas: a Virgem passou a assemelhar-se a uma jovem camponesa, o vestuário é contemporâneo e os cenários locais."  

BARZUN, Jacques. Da Alvorada à Decadência - 500 anos de vida cultural no Ocidente (de 1500 à actualidade). Tradução de António Pires Cabral e Rui Pires Cabral. Lisboa: Gradiva, 2003, p. 87. 

Loucura: a "Fonte da Juventude"

domingo, 14 de maio de 2017

Um bobo da corte se apresentando. 
Créditos: Bibliothèque nationale de France, Département des manuscrits, Latin 771, fol. 81r.

Declamação: a Loucura fala

"Acaso não vedes esses homens tétricos que, entregues quer a seus estudos de filosofia, quer a sérias e árduas ocupações, na maioria das vezes já estão envelhecidos, por mais jovens que sejam? É evidente que pelas preocupações, e por uma agitação contínua e atroz de seus pensamentos, exaurem pouco a pouco seu espírito e sua seiva vital. Em contrapartida, os meus loucos estão gordinhos, reluzentes e com a pele bem tratada, como os porcos de Arcânia, como se costuma dizer; são pessoas destinadas a não experimentar nenhum dos incômodos da velhice, a não ser que, como acontece às vezes, se infeccionem com o contágio dos sábios. A esse ponto a vida humana não comporta o ser feliz em todos os aspectos! 

Acrescente a isso o não pequeno testemunho desse provérbio popular, em que se diz que a LOUCURA é a única coisa que prolonga a juventude, que, de outro modo, é o que há de mais fugaz, e que mantém afastada a ingrata velhice."  

ERASMO DE ROTTERDAM. Elogio da Loucura. Tradução de Elaine C. Sartorelli. São Paulo: Hedra, 2013, XIV, p. 54.  

A Seita dos Fariseus (Final)

sábado, 13 de maio de 2017

Em seu perfil no Twitter, @ofariseu se apresenta como "apenas um humilde fariseu tentando viver sua hipocrisia com sinceridade!" 

No Novo Testamento (NT), o lugar dos fariseus na vida e no pensamento judaicos pode ser melhor compreendido quando contrastado com os saduceus e os essênios, outros dos maiores maiores partidos judaicos. Enquanto os saduceus eram liberais e, encontrando-se "no mundo", estavam dispostos a fazer parte dele, os fariseus eram os "fundamentalistas", e enfatizavam a separação do mundo e de suas contaminações. Os essênios iam ainda além, e levavam uma vida asceta. 

Enquanto os fariseus aguardavam com grande expectativa a vida futura, os saduceus estavam satisfeitos com a vida terrena, uma vez que não esperavam por outra. Assim, os interesses religiosos eram os mais prementes para os primeiros, enquanto os últimos concentravam-se nos interesses seculares. Desta forma, os fariseus (integrantes principalmente da classe média) resistiam passivamente à dominação romana, enquanto os saduceus (pertencentes à aristocracia rica) eram pragmáticos e desejavam cooperar com os romanos e com os herodianos (estes, por sua vez, formavam o terceiro grupo do Sinédrio). A arraia-miúda não pertencia a nenhum dos grupos, mas favorecia os fariseus. 

A letra e o espírito do legalismo que, nos tempos do NT, passou a ser identificada com a religião judaica, refletia precisamente os ensinos dos fariseus. Em seu zelo pelo cumprimento dos preceitos da Torah e da tradição, os fariseus amiúde negligenciavam o fato de que a disposição do coração é mais importante do que o ato exterior. Muitos dos "escribas" ou "mestres da Lei" (Lc 5:17) eram fariseus. 

Os fariseus acreditavam que a providência divina ordenava as questões humanas e salientavam a dependência das pessoas em Deus. Este era concebido como um Pai rígido, pronto a castigar os pecadores. Criam também na existência de espíritos, na imortalidade da alma, bem como na ressurreição literal do corpo e em uma vida futura na qual as pessoas seriam recompensadas ou punidas segundo seus atos nesta vida (durante a qual são dotadas de livre arbítrio). Os saduceus, por sua vez, concebiam um Deus sem muito interesse pela vida humana; caberia ao indivíduo ser o árbitro do próprio destino. 

Para João Batista, tanto os fariseus quanto os saduceus seriam uma "raça de víboras" (Mt 3:7). Jesus, cujos ensinos em muitos aspectos se assemelham mais aos dos fariseus do que aos dos saduceus, rotulou os fariseus de hipócritas (ver Mt 23). Quando Jesus enfatizou que o motivo que leva ao ato é mais importante aos olhos de Deus do que o ato em si, os fariseus tramaram desacreditá-Lo diante do povo e silenciar Sua mensagem. Foram os fariseus que fomentaram a disputa a disputa entre os discípulos de Jesus e os de João (Mt 9:11, 14; cf. Jo 4:1). Além de tentarem criar-Lhe vários outros embaraços, lideraram os acontecimentos que resultaram em Sua prisão, condenação e crucifixão (Mt 27:62; Mc 3:6; Jo 11:47-57; 18:3). Nicodemos era fariseu (Jo 3:1), assim como Paulo e seu mestre Gamaliel (ver At 5:34; 23:6; 26:5-7).  

Bibliografia consultada: Dicionário Bíblico Adventista do Sétimo Dia. Tatuí, SP: Casa Publicadora Brasileira, 2016, p. 494-496. 

A Seita dos Fariseus - Parte I

Jesus censurou os fariseus em diversos momentos, como na parábola do fariseu e do publicano (Lucas 18:9-14).

Do gr. Farisaioi, transliteração do heb. Perushim, "os separados". Seita ou partido religioso conservador do judaísmo no período intertestamentário e do Novo Testamento. 

Supõe-se que os fariseus tenham surgido como grupo distinto na segunda metade do século II a.C. Possivelmente foram sucessores dos Hasidim (Chasidim), "os piedosos", que deram apoio ativo aos primeiros macabeus na luta contra os selêucidas. Por serem estritamente ortodoxos, rejeitavam qualquer tentativa de introdução de práticas helenistas nos círculos judaicos. Foram esses judeus ortodoxos que iniciaram a oposição aos governantes macabeus que começaram a favorecer o helenismo. 

O termo "fariseus" ocorreu pela primeira vez na época de João Hircano (135-105/104 a.C.). Já com contornos de partido religioso e político, fizeram oposição ativa ao governo mundano de João Hircano e mais ainda ao de seu filho, Alexandre Janeu (103-76/75 a.C.). O resultado foi uma violenta perseguição contra esse grupo de zelosos judeus. Contudo, logo ficou claro que os fariseus tornavam-se mais influentes entre o povo, e a viúva e sucessora de Janeu, Salomé, tentou se reconciliar com eles, o que fortaleceu sua influência ainda mais. 

Após a morte de Salomé, estourou uma guerra civil entre os irmãos Hircano II (apoiado pelos fariseus) e Aristóbulo II (apoiado pelos saduceus). Em 63 a.C., a Palestina passou ao controle de Roma e os fariseus mantiveram sua posição como partido de influência política e defensores da ortodoxia. Herodes, o Grande (40-4 a.C.), não os perseguiu, uma vez que sabia que eram populares, embora pouco numerosos (cerca de 6 mil). Na mesma época, viveram Hilles e Shammai, dois dos maiores mestres fariseus de todos os tempos; seus ensinos foram preservados nos escritos rabínicos da Mishná e do Talmude. 

Por vários séculos, foi a seita farisaica que que continuou a formar os maiores líderes religiosos dentre os judeus ortodoxos, exercendo mais influência na vida religiosa da nação do que qualquer outra força dentro do judaísmo.  

Bibliografia consultada: Dicionário Bíblico Adventista do Sétimo Dia. Tatuí, SP: Casa Publicadora Brasileira, 2016, p. 493-494. 

A Ocupação da Amazônia

sexta-feira, 12 de maio de 2017

Forte do Presépio de Santa Maria de Belém, Pará.

"A ocupação, de fato, da Amazônia inicia-se no período dos Filipes, ante a preocupação fundamentada de uma incursão holandesa contra a região, que poderia, através do rio Amazonas, colocar em risco as minas de prata do Peru. Assim, a fundação, em 1616, do Forte do Presépio de Santa Maria de Belém, foz do Amazonas, atendia às novas necessidades da Coroa Ibérica, evitando pôr em risco o domínio castelhano sobre a região

A constituição de um núcleo urbano deveria funcionar como um marco de posse e defesa da imensa bacia Amazônica contra investidas de holandeses e franceses, que já exploravam centenas de arrobas de peixe, peixe-boi e drogas do sertão. 

A viagem de Pedro Teixeira, em 1637, subindo o Amazonas até o Peru, vinha confirmar a possibilidade de trânsito entre esse vice-reino e o Estado do Maranhão e Grão-Pará, fundado após a expulsão dos franceses de São Luís. 

O novo estado, autônomo em relação ao Estado do Brasil, apresentava vantagens e necessidades de uma segura ocupação seja por suas riquezas, seja por sua navegabilidade. Desde cedo, Belém é apontada como a cabeça de uma ampla rede que se deveria estender para o interior, comandando todo o movimento de entrada e saída de produtos da região." 

SILVA, Francisco Carlos Teixeira da. Conquista e colonização da América Portuguesa - O Brasil Colônia - 1500/1750. In: LINHARES, Maria Yedda (org.). História Geral do Brasil. 9 ed. Rio de Janeiro: Elsevier, 1990, p. 84-85.

A "Terra Arrasada" de Vercingétorix

quinta-feira, 11 de maio de 2017

"Desde o início, Vercingétorix fora cético acerca de suas habilidade para derrotar as legiões em combate, e a velocidade com que os romanos haviam tomado três cidades [Velauduno, Cenabo e Novioduno] apenas confirmou o respeito que tinha por sua capacidade de luta e seus equipamentos de cerco. Então, Vercingétorix planejou seguir o inimigo, emboscando grupos pequenos, sem arriscar um encontro em massa. Ele tencionava privar os romanos de alimentos [...]. Cidades inteiras que não pudessem ser protegidas do inimigo deveriam ser destruídas para impedir que as legiões capturassem os depósitos de alimentos dentro delas. Os bitúriges puseram fogo em 20 de seus principais assentamentos em resposta a essa ordem. Vercingétorix argumentava que, por mais terrível que isso fosse, a alternativa seria a morte para os guerreiros e a escravidão para suas famílias. Sua estratégia era consideravelmente mais sofisticada que a empregada pelos primeiros opositores de César, e Vercingétorix, claramente, deve ter possuído carisma e força de personalidade para persuadir seus seguidores da necessidade de medidas inflexíveis." 

GOLDSWORTHY, Adrian. César - A Vida de um Soberano. Tradução de Ana Maria Mandim. Rio de Janeiro / São Paulo: Record, 2011, p. 423-424. 

Império Romano x Império Parta

quarta-feira, 10 de maio de 2017

Legionários lutando com um persa catafractário no contexto da Guerra Romano-Parta, mais especificamente na guerra de sucessão armeniana de 58-63. O trabalho artístico é de Azat Kuzhin para a Ancient Warfare Magazine, nº 4 (disponível aqui). 

Conheça as minhas coleções de Soldados da Roma Antiga e de Inimigos de Roma.

O Viandante e a Verdade

terça-feira, 9 de maio de 2017

Enquanto caminhava pelo deserto, um homem encontrou uma mulher solitária, parada, de olhos voltados para o chão, e lhe perguntou: "Quem é você?". E ela: "A Verdade." "E por que motivo deixou a cidade e está morando no deserto?", tornou ele. Ela respondeu: "É que, em tempos passados, a mentira era companheira de poucas pessoas, mas hoje, sempre que você quer falar ou ouvir alguma coisa, ela está com todos os homens." 

Moral: [A fábula mostra] Que os homens padecem uma vida péssima e sofrida quando a mentira prevalece sobre a verdade.

ESOPO. Fábulas completas. Tradução de Maria Celeste C. Dezotti e ilustrações de Eduardo Berliner. 3ª reimpressão. São Paulo: Cosac Naify, 2016, p. 518.