“Quem não é capaz de sonhar com a história diante dos documentos não é historiador.” F. Braudel

“Quem não é capaz de sonhar com a história diante dos documentos não é historiador.” F. Braudel
Villa Borghese, Roma, Itália.

Da Vinci x Lutero

terça-feira, 23 de maio de 2017

Homem Vitruviano, desenho de Leonardo da Vinci (c. 1490).

"(...) A figura tão citada hoje em dia como homem do Renascimento, Leonardo da Vinci, não merece esse título. Foi obviamente escolhido para lisonjear os nossos interesses dominantes: a arte e a ciência. Excelente como pintor, preocupava-se também com a engenharia civil, a aviação e a observação científica em geral. As suas máquinas não funcionavam, mas os seus desenhos e cálculos para a construção das mesmas são notáveis. A sua combinação das 'duas culturas' é para nós surpreendente, tal como o é a sua porfiada 'investigação'. Contudo, de todos os homens da sua época, ele é o caso marcante do génio que não era um homem do Renascimento no sentido pretendido: faltavam-lhe as belas letras. Ele próprio fala dessa limitação. Não se importava com o latim ou o grego. Jamais escreveu poemas ou discursos. Tinha pouco a dizer sobre filosofia ou teologia. Não tinha interesse pela história; para pintar um mural no Palácio do Governador em Florença, teve de pedir emprestadas as notas de Maquiavel sobre uma batalha famosa. Tão-pouco era arquitecto ou escultor. Pior de tudo, não tinha gosto para a música, que (dizia ele) tinha dois defeitos graves - um era ser mortal, na medida em que a música deixava de existir logo que a peça terminava; e outro a que ele chamava 'desperdício': a sua contínua repetição, que a tornava 'desprezível'. 

Uma hierarquização cuidadosa dos candidatos colocaria Lutero mais alto do que Leonardo, pois Lutero era um grande escritor e orador (embora não fosse um grande classicista), músico, teólogo, um observador experimentado da natureza e (como vimos) um participante prazenteiro da vida dos sentidos."  

BARZUN, Jacques. Da Alvorada à Decadência - 500 anos de vida cultural no Ocidente (de 1500 à actualidade). Tradução de António Pires Cabral e Rui Pires Cabral. Lisboa: Gradiva, 2003, p. 95.

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