“Quem não é capaz de sonhar com a história diante dos documentos não é historiador.” F. Braudel

“Quem não é capaz de sonhar com a história diante dos documentos não é historiador.” F. Braudel
Villa Borghese, Roma, Itália.

A Invasão romana da Britânia

quinta-feira, 28 de abril de 2022

 

Primavera do ano 43 d.C. As tribos celtas do sul da Britânia entraram em alerta assim que comerciantes gauleses que comercializavam do outro lado do Canal da Mancha alertaram a seus primos britanos de que os romanos estavam reunindo um exército e uma frota no porto de Gesoriacum, atual Bolonha-sobre-o-Mar, França. Em Gesoriacum se dizia que os romanos planejavam invadir a Britânia, e o avistamento nessa mesma primavera de uns barcos de guerra romanos que estavam estudando a costa de Kent (a romana Cantium) dava credibilidade às advertências dos mercadores.

Passando à ação, os chefes tribais passaram a convocar os seus guerreiros. Nenhuma das tribos britânicas mantinham um exército permanente, como faziam os romanos, ainda que seus líderes contassem com tropas permanentes para a sua defesa pessoal, sendo alguns deles mercenários ou recrutas celtas.

Ao saber da próxima invasão romana, dezenas de milhares de guerreiros responderam à convocação, juntando seus equipamentos de guerra e reunindo-se na costa de Kent. Seus chefes esperaram durante semanas, mantendo uma vigilância constante sobre o Canal, enquanto os homens de suas tribos aguardavam impacientes no acampamento. Através de seus primos da Gália, os chefes sabiam que os romanos sempre lançavam suas novas campanhas militares quando começava a primavera. Por fim, quando nenhuma frota invasora deu as caras e parecia que aquilo não passaria de uma repetição da "invasão" britânica do imperador Calígula, de quatro anos antes, os guerreiros britânicos regressaram aos seus lares.

O alerta havia se baseado em dados reais: quatro legiões e dezenas de unidades de cavalaria e infantaria ligeira auxiliar haviam se deslocado até o ponto de reunião em Gesoriacum por ordem do novo imperador, Cláudio, com a intenção de cruzar o Canal da Mancha para invadir a Britânia. Antes dele, Júlio César, nos 55 e 54 a.C., já havia enviado expedições à ilha. Tibério voltou a acalentar a ideia de invasão. Calígula havia jogado com ela. E, agora, Cláudio, o menos militarista dos imperadores, estava levando-a a cabo.

Uma frota de transportes e uma escolta de barcos de guerra tiveram que ser construídos especificamente para trasladar as tropas e seus cavalos à Britânia, e os romanos fizeram com que construtores fossem aos portos do Canal. Centenas de embarcações foram construídas, e elas se tornaram a nova frota britânica da armada romana.

Prestes a iniciar a primavera, em que pese a detalhada logística e o eficiente planejamento, a operação sofreu um atraso devido a uma questão muito humana. Começaram a circular rumores dentre os supersticiosos legionários de que na Britânia, um lugar além dos limites do mundo conhecido, lhes aguardavam horrores inimagináveis. Foi por esse motivo que os guerreiros britânicos não avistaram qualquer frota inimiga em seu litoral nessa primavera.

Cláudio ordenou, então, ao chefe do seu Estado Maior, o liberto Narciso, que viajasse de Roma a Gesoriacum, a fim de convencer os homens a seguirem adiante com a invasão. De algum modo, ele foi bem-sucedido, e quando chegou o verão, as tribos do sul da Britânia estavam de guarda baixa, a atrasada invasão romana finalmente se colocou em marcha.

Logo após o desembarque, uma das quatro legiões, a IX Hispana, foi deixada na praia, junto ao rio Stour, nas proximidades da atual Richborough. Além de proteger a retaguarda, a legião atuaria na qualidade de reserva. Entretanto, logo a seguir, o comandante Pláucio iniciou o deslocamento para o interior com o grosso da sua força.

A partir da cabeça de praia, Pláucio foi guiando sua força invasora até o interior, sem notar indícios da presença de britânicos. Durante todo esse tempo, as tribos estavam reunindo-se. Quando, enfim, se mostraram dispostas a combater, foi sob as ordens de Togodumno e Carataco, filhos do defunto Cunobelinus, rei da poderosa tribo dos catuvelaunos. Após reunir apressadamente o apoio das outras tribos menores, os dois irmãos convergiram com os seus guerreiros contra o avanço romano.

Os britânicos não estavam equipados com armaduras ou capacetes. A maioria dos guerreiros comuns se apresentaram armados com uma simples framea, ou lança, e um escudo de madeira de grande tamanho, retangular e revestido de couro. Em geral, lutavam descalços e parcial ou totalmente nus.

O primeiro contra-ataque foi promovido por Carataco. Apesar do ímpeto, foi repelido bem depressa e de forma sangrenta. Assim, ele retrocedeu até o rio Medway. Enquanto os romanos prosseguiam com o avanço, Togodumno chegou do norte do Tâmisa com seus milhares de guerreiros. Ele também atacou imediatamente os invasores, sem refletir sobre táticas ou estratégias, e seus homens foram aniquilados com a mesma rapidez que os do seu irmão. O próprio Togodumno parece ter sido gravemente ferido nesse combate, pelo que morre poucos dias depois. Os sobreviventes de sua tropa uniram-se às forças de Carataco, junto ao Medway. Ali, o combate ceifou outras tantas vidas britânicas. No Tâmisa, outra derrota britânica.

Assim, Pláucio enviou uma embaixada aos chefes de todas as tribos vizinhas, convidando-os a se renderem. Eles concordaram, e o imperador Cláudio foi então convidado a comparecer à Britânia, para presenciar tal capitulação. Por outro lado, Carataco se retirou a Gales, e as tribos do oeste resistiam obstinadamente a aceitarem a rendição. Contra elas foi enviado Vespasiano - o futuro imperador - que comandava a II Augusta. Vespasiano travou trinta batalhas, e conquistou mais de vinte povos e toda a ilha de Wight, e recebeu a rendição de duas tribos.

A II Augusta seguia avançando ao longo do litoral, através dos atuais Dorset e Somerset, quando o imperador e os membros de sua expedição se uniram a Pláucio no Tâmisa. Em Camulodunum, em meio a um belo desfile militar, Cláudio "aceitou a rendição oficial de onze reis dos britânicos", segundo as palavras da inscrição do Arco de Cláudio de Orange, França.   

Bibliografia consultada: DANDO-COLLINS, Stephen. Legiones de Roma - La Historia definitiva de todas las legiones imperiales romanas. Traducción de Teresa Martín Lorenzo. Madrid: La Esfera de los Libros, 2012, p. 310-321.

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