“Quem não é capaz de sonhar com a história diante dos documentos não é historiador.” F. Braudel

“Quem não é capaz de sonhar com a história diante dos documentos não é historiador.” F. Braudel
Villa Borghese, Roma, Itália.

A Disputa de Tortosa

segunda-feira, 13 de junho de 2022

 

No início de 1412, em Castela, São Vicente Ferrer conseguiu impor um novo estatuto dos judeus, o estatuto de Valladolid. Entre outras coisas, eles foram proibidos de vender ou oferecer produtos alimentícios aos cristãos, fazer com que estes lavrassem para eles os campos ou mudar de domicílio. Quanto a suas roupas, seu feitio deveria ser humilde, de tecido grosseiro e comportar naturalmente um signo distintivo bem visível. Daí para a frente, em todos esses pontos, Castela passaria a seguir a tendência antijudaica do resto da Europa.

Nessa época, o papa Benedito XIII, de quem Vicente Ferrer era confessor, encontrava-se numa situação difícil devido ao Grande Cisma. Em 1412, tomou a decisão de converter todos os judeus em bloco. A demonstração que ele preparou ficou na história como a Disputa de Tortosa.

A demonstração durou perto de dois anos, e o campeão do cristianismo foi o erudito Josué de Lorca. Ele foi enfrentado por catorze rabinos. Muita sutileza foi gasta de ambos os aldos, mas o verdadeiro espetáculo estava no auditório. Entre mil e dois mil espectadores assistiam a cada sessão, sendo uma parte deles judeus que, seguindo um combinado prévio, se levantavam ao fim de cada colóquio para declarar que haviam se convencido dos argumentos de Lorca. Então, pediam para ser batizados ali mesmo. Três mil judeus passaram pelos batistérios de Tortosa entre janeiro de 1413 e novembro de 1414.

Atormentados e ameaçados, a maioria dos rabinos desistiram e suplicaram que se lhes permitissem voltar para casa no verão de 1414. Apenas dois rabinos seguiram até o fim na disputa.

Pouco depois, Benedito XIII foi condenado pela Cristandade no Concílio de Constança. Porém, ele podia se gabar de que, de Perpignan a Cádiz, os judeus novamente se convertiam em massa. Nas crônicas judaicas, 1391 ficou como "o ano das perseguições e da opressão", ao passo que 1413-14 é "o ano da apostasia".     

Adaptado de POLIAKOV, Léon. De Maomé aos Marranos. Tradução de Ana M. Goldberger Coelho e J. Guinsburg. São Paulo: Perspectiva, 1984, p. 140-142.

0 comentários:

Enviar um comentário