sexta-feira, 15 de dezembro de 2017
Na parábola do bom samaritano (Lc 10:30-35), um judeu é vítima dos salteadores típicos das perigosas estradas do Mundo Antigo.
1. Apuleio destacou aquilo que considerava as características essenciais da figura do bandido: uma tradição hereditária de fora-da-lei, uma "alteridade" bárbara e a afirmação de sua independência pessoal.
2. A Cilícia era a fortaleza dos piratas durante a República. Eles se colocaram a serviço de Mitrídates durante a sua guerra contra Roma (88-85 a.C.). Durante as guerras civis do século I a.C., eles se aproveitaram da situação e devastaram ilhas e cidades costeiras.
3. O banditismo era uma forma de poder pessoal. Esse poder pessoal, baseado no carisma, na impressão causada pelo aspecto, na força bruta e em laços de tipo pessoal (familiares, de amizade ou clientelares) é provavelmente uma das formas originárias de poder que a humanidade conhece.
4. "Uma vez desaparecida a justiça, o que são os reinos senão grandes quadrilhas de bandidos? E o que são as quadrilhas de bandidos senão pequenos reinos?" (Santo Agostinho, A Cidade de Deus, 4, 4).
5. Teseu, o lendário fundador da Ática, derrotou lestai (bandidos) antes de comandar a grande unificação mítica (synoikismos) da Ática, a fundação do Estado ateniense. No caso de Roma, são Rômulo e Remo que abandonam o seu papel de pastores-bandidos para fundarem a nova cidade.
6. Segundo a moral dominante, quem se dedicava ao banditismo fazia-o contra as suas próprias convicções éticas - se tivesse tido a possibilidade de escolher, o bandido teria preferido adquirir bens licitamente, e não roubando.
7. Na visão dos romanos, ou se era um Estado legítimo e reconhecido, capaz de combater numa guerra regular (bellum) com o Estado romano, ou se era um bandido. Assim, nossas categorias de "bandido" e de "banditismo" não se ajustam a esta sumária definição romana.
8. Existia um tipo de banditismo parasitário de subsistência em que a aquisição de bens e serviços dependia diretamente do uso da violência física e das ameaças. Tanto Platão como Aristóteles reconheciam no banditismo (lesteia) um dos "modos de vida" fundamentais do homem, ao lado da caça, do pastoreio e da agricultura.
9. Segundo as "leis" atribuídas a Sólon (c. 594 a.C.), parece que em Atenas era absolutamente legal constituir "sociedades de piratas" com o objetivo de atacar outras cidades. No século seguinte, Tucídides testemunhou a existência de comunidades gregas para as quais a pirataria era uma ocupação totalmente respeitável, e mesmo honrada.
10. No auge do Império Romano, contudo, as principais correntes ideológicas não admitiam a possibilidade de coexistência do poder dos bandidos com o poder do Estado.
11. Cícero, em De Officiis, 2, 11, 40, fez menção às "leis dos bandidos" (leges latronum), obedecidas e respeitadas pelos foras-da-lei. Por exemplo, se um bandido roubasse algo de um comparsa, seria expulso do bando; o chefe dos piratas, caso não dividisse igualmente a presa, era morto ou abandonado pelos companheiros.
12. A definição de bandido própria do Estado romano teve um sentido de desaprovação e de condenação tão intenso que o termo "bandido" (latro) se aplicava aos inimigos políticos, em especial os inimigos acérrimos em cujos atos se podia detectar um gênero de violência que se podia identificar como ameaça de regresso da sociedade civil ao caos primordial.
13. Nas fontes literárias romanas, os bandidos muitas vezes eram incluídos entre os desastres naturais, tais como a peste e os terremotos. Além disso, um número bastante elevado de epitáfios recordam que o defunto foi "morto por bandidos" (interfectus a latronibus).
14. Mais vastas e ameaçadoras do que qualquer terra pantanosa eram as longas faixas montanhosas que atravessavam os países mediterrânicos: o Atlas, os Pireneus e os Alpes, os Apeninos, o Tauro e o Antitauro, o Líbano. Tais regiões constituíam um "outro mundo", quase impenetrável e desafiadoras para ações de policiamento.
15. Amiano Marcelino descreveu vagas maciças de banditismo na Isáuria (anos 350-70). Ele reportou um verdadeiro fenômeno histórico de longa duração, uma espécie de autonomia regional que denominada latrocinium. Em tais zonas, a violência tinha um caráter endêmico que sempre afligia o Império Romano e, depois, o Bizantino.
Bibliografia consultada: SHAW, Brent D. O Bandido. In: GIARDINA, Andrea (dir.). O Homem Romano. Tradução de Maria Jorge V. de Figueiredo. Lisboa: presença, 1991, p. 247-258.
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