“Quem não é capaz de sonhar com a história diante dos documentos não é historiador.” F. Braudel

“Quem não é capaz de sonhar com a história diante dos documentos não é historiador.” F. Braudel
Villa Borghese, Roma, Itália.

Mito sobre as Armas dos Povos do Mar

sexta-feira, 3 de janeiro de 2025

Os estudiosos mais antigos tinham a tendência de atribuir aos Povos do Mar qualquer destruição ocorrida nesse período [por volta de 1177 a.C.]. Algumas vezes também se afirmou, sobretudo antes em livros escolares (e agora na internet) que os Povos do Mar alcançaram tanto êxito porque possuíam armas de ferro - mas isso é incorreto: suas armas eram de bronze, como as armas de toda a gente. De mais a mais, pode ser pretensioso lançar sobre esses povos toda a culpa pelo fim da Idade do Bronze no Egeu e no Mediterrâneo Oriental. É provável que isso lhes dê crédito em excesso, já que não há evidências claras a não ser as que retiramos dos textos e inscrições egípcios, os quais trazem impressões conflitantes. Teriam os Povos do Mar entrado no Mediterrâneo Oriental como um exército relativamente organizado, à semelhança de uma das mais disciplinadas Cruzadas cujo objetivo na Idade Média era capturar a Terra Santa? Ou seriam eles um grupo mais descuidadosamente organizado de saqueadores, como piratas ou Vikings de uma época posterior? Ou seriam refugiados fugindo de um desastre e buscando novas terras, como os refugiados sírios de tempos recentes que escaparam da guerra civil em sua pátria? Até onde sabemos, a verdade pode abarcar uma combinação de todas essas hipóteses ou pode não estar em nenhuma delas.


CLINE, Eric H1177 a.C: o ano em que a civilização entrou em colapso. Tradução de Fábio alberti. São Paulo: Avis Rara, 2023, p. 28.

#HJ37 O judeu precisa de outro Globo

quinta-feira, 2 de janeiro de 2025

Um judeu austríaco, sentindo a iminente ocupação de seu país por Hitler, passa a estudar várias hipóteses de emigração. Vai até um agente de viagens para se aconselhar. O agente pega um enorme globo e começa a relatar as exigências para entrada em vários países. Logo fica claro que muitas das opções são cheias de dificuldades. Um país exige atestado de emprego. Um terceiro país exige dos interessados a posse de alta quantia em dinheiro; enquanto um quarto simplesmente não quer mais saber de imigrantes, especialmente judeus. Finalmente, desesperado, o judeu pergunta:

- O senhor não tem aí um outro globo?

FINZI, Patricia et al. (edição, seleção e textos). Do Éden ao divã - Humor Judaico. São Paulo: Shalom, 1990, p. 176.

#HJ36 Humor Judaico na URSS

quarta-feira, 1 de janeiro de 2025

"Disparar à queima-roupa", cartum de R. Gadimov, relativo ao Conflito Árabe-Israelense, Pravda, 8 de março de 1970.
O cartum fazia parte da propaganda soviética que associava os israelenses ao imperialismo ianque no Oriente Médio.

A relação entre o judaísmo e o socialismo soviético é uma longa história marcada pela incompreensão, pela hostilidade, e finalmente pela tragédia. Quando eclodiu a revolução bolchevique, em 1917, muitos judeus a ela aderiram entusiasticamente, convictos de que através de um regime igualitário teriam fim os sofrimentos do povo judeu. Tal não aconteceu; a emancipação judaica nunca chegou a ocorrer na URSS, e entre os expurgados e eliminados, estava um número suspeitável de judeus.

Ao comprovar sua incapacidade de viver conforme suas tradições, ou de abandonar o país, dois milhões de judeus soviéticos se voltaram precocemente para o humor, como meio de superar as extraordinárias pressões e tensões da existência cotidiana. Neste sentido, bem podem ser considerados precursores da Perestroika.

O humor judaico, por ser essencialmente antiautoritário, se desenvolve mais onde a censura é maior; vai de boca em boca à velocidade da luz e não pode ser detido por nenhuma KGB. Talvez os judeus não sejam livres, mas a piada judaica certamente o é. 

No transcurso de todo o humor posterior a 1917, o herói central da piada judia - o pobre Abraham Rabinovich - se ajeita para enfrentar a vida com infinita reserva de bom-senso e otimismo, configurando, talvez, a mais rica tradição oral da URSS. Este mítico e satírico personagem, que enlouquece as autoridades com sua lógica e ironia, é sem nenhuma dúvida uma das figuras que definem o campo de humor judaico na União Soviética.

***

Abraham Rabinovich, em Moscou, é acordado no meio da noite com fortes batidas na porta.

- Quem está aí? - pergunta.

- O carteiro - respondem.

O homem levanta da cama, abre a porta e encontra dois agentes da KGB.

- Você é Rabinovich? - pergunta um dos agentes.

- Sim - responde Rabinovich.

- E fez um pedido para ir a Israel?

- Correto.

- Tem comida suficiente aqui?

- Sim, tenho.

- Seus filhos não recebem uma boa educação comunista?

- Sim, é verdade.

- Então por que você quer abandonar a Rússia?

- Porque - responde Rabinovich - não gosto de viver em um país onde entregam a correspondência às três da manhã!

FINZI, Patricia et al. (edição, seleção e textos). Do Éden ao divã - Humor Judaico. São Paulo: Shalom, 1990, p. 181 e 183.