“Quem não é capaz de sonhar com a história diante dos documentos não é historiador.” F. Braudel

“Quem não é capaz de sonhar com a história diante dos documentos não é historiador.” F. Braudel
Villa Borghese, Roma, Itália.

#HJ36 Humor Judaico na URSS

quarta-feira, 1 de janeiro de 2025

"Disparar à queima-roupa", cartum de R. Gadimov, relativo ao Conflito Árabe-Israelense, Pravda, 8 de março de 1970.
O cartum fazia parte da propaganda soviética que associava os israelenses ao imperialismo ianque no Oriente Médio.

A relação entre o judaísmo e o socialismo soviético é uma longa história marcada pela incompreensão, pela hostilidade, e finalmente pela tragédia. Quando eclodiu a revolução bolchevique, em 1917, muitos judeus a ela aderiram entusiasticamente, convictos de que através de um regime igualitário teriam fim os sofrimentos do povo judeu. Tal não aconteceu; a emancipação judaica nunca chegou a ocorrer na URSS, e entre os expurgados e eliminados, estava um número suspeitável de judeus.

Ao comprovar sua incapacidade de viver conforme suas tradições, ou de abandonar o país, dois milhões de judeus soviéticos se voltaram precocemente para o humor, como meio de superar as extraordinárias pressões e tensões da existência cotidiana. Neste sentido, bem podem ser considerados precursores da Perestroika.

O humor judaico, por ser essencialmente antiautoritário, se desenvolve mais onde a censura é maior; vai de boca em boca à velocidade da luz e não pode ser detido por nenhuma KGB. Talvez os judeus não sejam livres, mas a piada judaica certamente o é. 

No transcurso de todo o humor posterior a 1917, o herói central da piada judia - o pobre Abraham Rabinovich - se ajeita para enfrentar a vida com infinita reserva de bom-senso e otimismo, configurando, talvez, a mais rica tradição oral da URSS. Este mítico e satírico personagem, que enlouquece as autoridades com sua lógica e ironia, é sem nenhuma dúvida uma das figuras que definem o campo de humor judaico na União Soviética.

***

Abraham Rabinovich, em Moscou, é acordado no meio da noite com fortes batidas na porta.

- Quem está aí? - pergunta.

- O carteiro - respondem.

O homem levanta da cama, abre a porta e encontra dois agentes da KGB.

- Você é Rabinovich? - pergunta um dos agentes.

- Sim - responde Rabinovich.

- E fez um pedido para ir a Israel?

- Correto.

- Tem comida suficiente aqui?

- Sim, tenho.

- Seus filhos não recebem uma boa educação comunista?

- Sim, é verdade.

- Então por que você quer abandonar a Rússia?

- Porque - responde Rabinovich - não gosto de viver em um país onde entregam a correspondência às três da manhã!

FINZI, Patricia et al. (edição, seleção e textos). Do Éden ao divã - Humor Judaico. São Paulo: Shalom, 1990, p. 181 e 183.  

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