“Quem não é capaz de sonhar com a história diante dos documentos não é historiador.” F. Braudel

“Quem não é capaz de sonhar com a história diante dos documentos não é historiador.” F. Braudel
Villa Borghese, Roma, Itália.

Leonor de Aquitânia (1124-1204)

sexta-feira, 15 de novembro de 2019

 Leonor de Aquitânia em seu casamento com Luís VII. 
Fonte: Grandes Chroniques de France, MS. Douce 217 (fins do séc. XIV), fol. 192r. 

Ninguém fica indiferente a Leonor de Aquitânia. Ela é a mais conhecida, a mais amada ou a mais detestada das rainhas medievais. Mesmo no século XX, medievalistas sérios a rotularam como "verdadeira piranha, preocupada unicamente com o poder e com o sexo". Como certos homens detestam que mulheres ocupem o poder, esses insultos tardios provam ao menos que Leonor soube dar provas de autoridade e intervir nas lutas de seu tempo. 

Em 1137, aos treze anos de idade, Leonor perdeu seu pai, Guilherme X, duque da Aquitânia (que englobava Poitou, Gasconha, Limousin, Bas-Berry e Auvérnia). Assim, ela se tornou a herdeira mais cobiçada do Ocidente. Graças ao abade Suger, Leonor casou-se imediatamente com o futuro rei Luís VII. Após a sua coroação, Leonor marcou a política de seu marido. Por um lado, ela o engajou num combate contra Toulouse (1141), local de expansão tradicional da Aquitânia. Por outro, ela casou a sua irmã caçula, Petronille, com Raoul de Vermandois, oficial real da França. Isso visava impedi-la de vir a reclamar sua herança da Aquitânia. Contudo, tais núpcias levaram Raoul antes a repudiar sua mulher, parente do conde de Blois e da Champagne. Assim, este nobre imediatamente declarou guerra ao rei Luís VII. Provocado pela tropa real, o incêndio da igreja de Vitry pôs fim a essas operações.

Luís VII buscou expiar seus maus atos integrando, em 1147, a segunda cruzada; ele levou consigo Leonor, por quem os cronistas afirmam ser ele "perdidamente apaixonado, de modo pueril". Para esses clérigos, uma paixão assim nada poderia trazer de bom. Ela de fato azedou na Terra Santa, no decorrer de uma batalha desastrosa. Leonor ficou ao lado de seu tio Raimundo, príncipe de Antioquia, defensor da tomada de Alepo, opondo-se a Luís VII, que queria cercar Damasco, cidade até então amiga dos latinos. Essa disputa traduziu o desejo da rainha de pesar sobre as decisões militares, porém as más línguas da corte recusaram sua intervenção num campo reservado aos homens e lhe atribuíra uma ligação incestuosa com o tio. No retorno à França, foi acusada de adulterar com Godofredo, o Belo, conde de Anjou - mais tarde ela desposaria o filho dele, Henrique II Plantageneta. Sem fundamentos, esses mexericos buscavam de fato vingar-se de uma mulher que se apoderara do campo político. 

De resto, também prejudicou a reputação da rainha o fato de ser originária da longínqua e meridional Aquitânia, cujos modos eram tidos como dissolutos, e ela era neta de Guilherme IX, bígamo notório e primeiro trovador conhecido, cujas canções possuíam tons de erotismo. Leonor, cantada por Bernard de Ventadour, guardará dele o gosto pelas letras. 

Leonor só deu a Luís VII duas filhas, colocando a sucessão em perigo. Assim, o rei obteve o direito de repudiá-la, sob o pretexto de consanguinidade, no Concílio de Beaugency (1152). Quase em seguida, Leonor casou-se novamente, desta vez com Henrique II, conde de Anjou e duque da Aquitânia. Em 1154, ele foi coroado rei da Inglaterra. Leonor então pode desmentir sua pretensa esterilidade, dando à luz seis meninos e três meninas. Tantas concepções limitaram seu papel no governo real. Em 1167, o nascimento de João Sem-Terra, seu último filho, mudou a situação. 

A partir de então, Leonor buscou controlar diretamente a Aquitânia, com Ricardo Coração de Leão, seu filho predileto, em detrimento da administração autoritária de seu marido. Seus dois outros filhos, Henrique, o Jovem, e Godofredo da Bretanha, também reclamaram mais poder e riquezas. 

Em 1173, Leonor atiçou uma revolta contra Henrique II. Ela "alienou" seus filhos do rei, mas a revolta fracassou. Ela foi então presa, mantendo-se cativa até sua viuvez, ocorrida em 1189. Daí para a frente, Leonor passou a desfrutar de um poder sem precedentes. Para Ricardo Coração de Leão, que se tornou rei, ela obteve a mão de Bérengère de Navarra, filha de Sancho VI. Desta forma, as sucessivas revoltas da aristocracia gascã foram domadas. 

Na ausência de Ricardo, que havia partido numa cruzada e se tornado prisioneiro do imperador, Leonor se opôs a João Sem-Terra. Este pactuou com o inimigo Felipe Augusto, rei da França. Ela então pagou o resgate para libertar Ricardo. Com a morte deste, contudo, Leonor lutou contra seu neto Arthur da Bretanha para que João Sem-Terra subisse ao trono. Ela venceu, defendendo pessoalmente, em 1202, a cidade de Mirebeau, no Poitou. 

Em 1204, aos oitenta anos de idade, Leonor faleceu e foi enterrada na abadia de Fontevraud. Seu desaparecimento se deu quando Felipe Augusto conquistava a Normandia e o Anjou, o que coincidiu com o desmoronamento do império Plantageneta que ela havia lutado tanto para erguer.         

Bibliografia consultada: LE GOFF, Jacques (org.) Homens e Mulheres da Idade Média. Tradução de Nícia Adan Bonatti. São Paulo: Estação Liberdade, 2013, p. 179-182.

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