“Quem não é capaz de sonhar com a história diante dos documentos não é historiador.” F. Braudel

“Quem não é capaz de sonhar com a história diante dos documentos não é historiador.” F. Braudel
Villa Borghese, Roma, Itália.

Cuba Policialesca

terça-feira, 17 de março de 2020

Opositores da ditadura castrista são presos pela polícia em Santa Clara, Cuba, no dia 28 de janeiro de 2011. 
Créditos: CNN

Nas ruas das grandes cidades, e especialmente em Havana, a polícia tornou-se onipresente e procede a controles de identidade sistemáticos. Estes não escapam, aliás, à síndrome do delito de má aparência, que faz dos negros os alvos preferenciais das batidas. Essa mácula pública ao dogma oficial da igualdade racial não surpreende ninguém.

A população sente o incômodo. Casais cuja única distração é o passeio vespertino não suportam mais as abordagens constantes da polícia. As prostitutas da Quinta Avenida refugiam-se nas avenidas paralelas, menos chamativas e nas quais jamais passa o comboio de limusines da elite do regime.

O que é mais grave: pequenos expedientes de sobrevivência são agora ameaçados pelo endurecimento policial. O vendedor de ovos desviados, o encanador, o entregador de leite clandestino, o comerciante de carne contrabandeada, o traficante de charutos roubados... as mil e uma ocupações da malandragem, os sobreviventes da miséria, os ases da penúria, os que descobrem uma utilidade para quase tudo, os que revendem o que cai do caminhão, todos devem se enfiar na toca e ficar privados de seu ganha-pão, do acesso ao mercado clandestino e seus clientes terão de apertar os cintos.

Mal remunerado, mal-amado, caçoado, o policial cubano não é bem-visto na capital. O regime precisou recorrer às províncias mais fidelistas e mais deserdadas para reforçar as fileiras de sua polícia. À guisa de vingança popular, as piadas multiplicam-se: a cor dos uniformes dos policiais sugere a "loucura azul", título de um filme cubano de grande sucesso. Uma charada também: 

Por que os policiais andam sempre em dois? Porque Fidel disse que eles devem ter pelo menos doze anos de escolaridade. Os coitados precisam andar em dupla para cumprir a ordem.

O regime foi logo obrigado a afrouxar o controle sobre o mercado informal, mas a pressão sobre a dissidência continuou. As celas da Segurança do Estado em Villa Marista, por exemplo, não conseguem conter o afluxo de opositores detidos. Cada vez em maior número, são levados, em detenção provisória, aos cárceres da polícia criminal, na esquina das ruas 100 e Aldabo, no bairro de Boyeros.

No ano 2000, estavam aprisionados cerca de 350 prisioneiros políticos. Os jornalistas independentes estão especialmente na mira do poder.   

Adaptado de: CUMERLATO, Corinne & ROUSSEAU, Dennis. A ilha do Doutor Castro: a transição confiscada. Tradução de Paulo Neves. São Paulo: Peixoto Neto, 2001, p. 180-183.

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