“Quem não é capaz de sonhar com a história diante dos documentos não é historiador.” F. Braudel

“Quem não é capaz de sonhar com a história diante dos documentos não é historiador.” F. Braudel
Villa Borghese, Roma, Itália.

Os 30 Anos da Constituição Cidadã

sexta-feira, 5 de outubro de 2018

Há exatos 30 anos, era promulgada a Constituição mais democrática e mais comprometida com os direitos civis de todas as sete constituições que o Brasil já teve.

O epíteto de "Constituição Cidadã" relaciona-se à incorporação de uma série de direitos - dentre eles, a liberdade de expressão e de reunião, a inviolabilidade do domicílio e a proibição de prisão sem decisão judicial. Ao mesmo tempo, o Congresso Nacional e o Supremo Tribunal Federal recuperaram e ampliaram suas prerrogativas. Foi estabelecida a liberdade sindical, e a tortura e o racismo tornaram-se crimes inafiançáveis.


A promulgação da Constituição encerrou um longo trabalho legislativo, iniciado em 1º de fevereiro de 1987, quando a Assembleia Nacional Constituinte se reuniu. À época, a sociedade brasileira avançava no processo de redemocratização, ao passo que o contexto internacional ainda era marcado pela Guerra Fria, que só terminou em 1991.


Desta forma, como bem definiu Bruno Garschagen, a Constituição de 1988 nasceu "do casamento da ressaca do regime militar com os temores de uma nova ditadura." A mentalidade da elite política que a concebeu, elaborou e promulgou era que cabia ao governo conceder a liberdade e os direitos, e não que a liberdade e os direitos são uma conquista dos indivíduos.


Com 245 artigos e 70 disposições transitórias, a Constituição de 1988 tem caráter enciclopédico, um reflexo das pressões dos diferentes grupos da sociedade, do temor ao retorno do autoritarismo e, ainda, do clima de instabilidade então vivido pelo país. O documento surgiu para durar pouco, na sua forma original, e a República e o sistema presidencialista de governo ficaram sujeitos a um plebiscito marcado para 1993. Previu-se ainda uma revisão constitucional, a ser realizada cinco anos após a promulgação da Constituição.


A Constituição ocupa-se, ainda, com uma série de garantias trabalhistas, há muito requeridas pelos sindicatos. No capítulo mais controvertido, estendeu a licença maternidade para 120 dias e, na tentativa de proteger o empregado, torna as demissões um grande ônus para o empregador ao determinar o pagamento de uma multa de 40% sobre o valor do FGTS por demissões imotivadas. Consequentemente, o trabalho terceirizado e a informalidade se expandiram.


Se foi "progressista" na área social, a Constituição mostrou-se anacrônica na regulação da economia - reforçou e estendeu monopólios estatais e discriminações contrárias ao capital estrangeiro - além de inconsistente do lado fiscal, ao criar despesas sem a necessária contrapartida em fontes de receita. Sob esse aspecto, o maior ônus recaiu sobre a União.


Desde da década de 1990, o Brasil enfrenta o desafio de encontrar meios e modos de compatibilizar as aspirações inscritas na Constituição de 1988 com as exigências da integração do país na economia global. 


Não tem sido fácil. Como se não bastasse o tamanho da própria Constituição, foram editadas mais de cinco mil normas para reger a vida do cidadão brasileiro desde a sua promulgação, incluindo nada menos que 99 emendas constitucionais. Isso nos remete à máxima atribuída a Tácito: "Quanto mais corrupto o Estado, maior o número de leis." 


Embora jovem, a Constituição de 1988 está decrépita e precisa ser substituída por uma Constituição liberal. 


Publicado hoje no jornal
A Tribuna.

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