“Quem não é capaz de sonhar com a história diante dos documentos não é historiador.” F. Braudel

“Quem não é capaz de sonhar com a história diante dos documentos não é historiador.” F. Braudel
Villa Borghese, Roma, Itália.

'Admirável' Promiscuidade

sexta-feira, 20 de janeiro de 2023

 

Admirável Mundo Novo é uma obra classificada como "distopia". O autor, Aldous Huxley (1894-1963), lançou-a em 1932 e, no prefácio de 1946, reconheceu: "... a promiscuidade sexual de Admirável Mundo Novo não parece tão distante. Já existem cidades norte-americanas em que o número de divórcios é igual ao de casamentos. Dentro de poucos anos, sem dúvida, licenças para casamento serão vendidas como as licenças para a posse de cães, válidas por um período de doze meses, sem nenhuma lei que proíba a troca de cães ou a posse de mais de um cão de cada vez. À medida que diminui a liberdade política e econômica, a liberdade sexual tende a aumentar como compensação. E o ditador (a não ser que precise de massa de manobra e de famílias para colonizar territórios despovoados ou conquistados) agirá prudentemente estimulando essa liberdade." (p. 17)

Promiscuidade. Vazio existencial. Controle de massas. Eis o nosso mundo, nu e cru. Nesse sentido, separei um trecho do romance bem revelador da nossa triste realidade distópica. Resta saber se os portadores de boas novas, os únicos que realmente têm algo a oferecer àqueles que sofrem com a falta de sentido na vida, estarão à altura de sua elevada missão. 

*** 

Lenina meneou a cabeça.

- Não sei por que - disse, pensativa -, mas já faz algum tempo que não me sinto muito inclinada à promiscuidade. Há ocasiões em que isso acontece. Você nunca sentiu a mesma coisa, Fanny?

A outra inclinou a cabeça num gesto de simpatia e compreensão.

- Mas é preciso fazer o esforço necessário - disse em tom sentencioso. - É preciso portar-se convenientemente. Afinal, cada um pertence a todos.

- Sim, cada um pertence a todos - Lenina repetiu lentamente a fórmula e, suspirando, calou-se um momento; depois, tomando a mão de Fanny e apertando-a de leve:

- Você tem razão, Fanny. Como sempre. Farei o esforço necessário.

HUXLEY, Aldous. Admirável Mundo Novo. Tradução de Vidal de Oliveira. São Paulo: Globo, 2014, p. 65.

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