“Quem não é capaz de sonhar com a história diante dos documentos não é historiador.” F. Braudel

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Villa Borghese, Roma, Itália.

O Terror (1793-1794)

terça-feira, 26 de dezembro de 2017

Execução de Robespierre e de seus apoiadores no dia 28 de julho de 1794. Autor desconhecido.

O girondino Condorcet identificou Robespierre como o sumo sacerdote da revolução. Ora, esse "sumo sacerdote" lutou pela morte do rei Luís XVI com uma solenidade religiosa. O guilhotinamento do monarca, no dia 21 de janeiro de 1793, espalhou-se como uma mancha pela Europa e, até mesmo na jovem república estadunidense, a reação foi ambivalente. Dez dias depois dessa execução, a Convenção declarou guerra à Inglaterra e à Holanda. 

Com a mente "infestada" de campos de batalha e de relatos da revolta monarquista e católica nas províncias, com mágoas e impressionado com os parisienses famintos, o líder jacobino Danton persuadiu a Convenção a reinstaurar o Tribunal Revolucionário, com poderes extraordinários de condenar as pessoas à morte. Além de apoiar integralmente a solicitação, Robespierre ainda propôs que a pena de morte fosse aplicada a todos os atos contrarrevolucionários dirigidos "contra a segurança do Estado ou contra a liberdade, a igualdade, a unidade e a indivisibilidade da República." No dia 10 de março de 1793, o Tribunal Revolucionário foi reinstaurado. 

Na noite do dia anterior, grupos armados saquearam as ruas de Paris. Enquanto isso, as notícias provenientes da frente de batalha pioravam. Em 18 de março, na batalha de Neerwinden, as tropas francesas sob o comando do general Dumouriez foram derrotadas pelo inimigo e fugiram rapidamente do campo de batalha. Em meio ao pânico em Paris, a Convenção decidiu criar comitês de vigilância em todas as comunas do país para inspecionar as atividades de estrangeiros e suspeitos. 

Após saber que Dumouriez havia desertado para o exército austríaco, Danton impeliu a Convenção a criar o Comitê de Segurança Pública - um governo revolucionário provisório designado para supervisionar a acelerar o exercício do poder ministerial. Em setembro de 1792, a Convenção havia estabelecido o Comitê de Segurança Geral, e agora os dois comitês deveriam trabalhar em parceria, e ambos deveriam responder formalmente à Convenção. Com o tempo, contudo, a relação entre os dois comitês tornou-se extremamente frágil. 

Em meio à crise, a nova república precisava urgentemente de um exército maior para vencer a guerra contra as potências estrangeiras. Para obter recrutas, a Convenção recorreu à conscrição e decretou uma cota para cada um dos 83 departamentos. Na falta de voluntários suficientes, homens deveriam ser sorteados e alistados à força. Com isso, os descontentes da Vendeia - uma região especialmente religiosa - explodiram em uma guerra civil terrível. Nesse período, Robespierre estava mais histérico publicamente do que nunca, convencido de que estava prestes a ser assassinado.

A propriedade privada passava a ser o novo foco de controvérsia na Revolução. Os girondinos queriam uma república que protegesse fortemente a propriedade privada e as diferenças na riqueza pessoal dos cidadãos. Os jacobinos, liderados por Robespierre, propuseram limites à propriedade privada, visando ao interesse do povo. Marat, o mais franco e provocador de todos os jacobinos, passou a ostentar o seguinte lema em seu jornal: "Taxemos os ricos para subsidiar os pobres." Por essa razão, foi indiciado, mas seus colegas jacobinos no Tribunal Revolucionário não só o inocentaram, mas também o coroaram com uma guirlanda cívica. 

O ambiente político entre girondinos e jacobinos se deteriorava rapidamente. Enquanto os primeiros passaram a atacar a Comuna, Robespierre, o grande representante dos segundos, não mais defendia a liberdade de imprensa. Ele perdoou a destruição das gráficas girondinas. Em 11 de maio, as seções de Paris exigiram a expulsão dos deputados girondinos em nova petição à Convenção. No dia 2 de junho, os líderes girondinos que não tinham fugido foram presos temporariamente. No dia 13 de julho, Marat foi assassinado por uma girondina.

Apesar de todas essas tensões, em agosto de 1793, a Convenção elaborou a mais democrática constituição que o mundo moderno já vira. Ela também ampliou o papel do Estado, mas teve que ser suspensa mal havia sido criada. Robespierre, assim como Saint-Just, Danton e Marat, acreditava há tempos que o terror era o único instrumento capaz de salvar a Revolução. 

Tamanho radicalismo cobrou o seu preço. A simpatia pela Revolução estava sendo minada nas províncias. Em Lyon (onde a contrarrevolução triunfou em maio de 1793) e em outros lugares, ocorreram execuções em massa horripilantes, nas quais pessoas eram mortas com tiros de canhões de metralha e grupos eram afogados no rio Vendeia - crimes contra humanidade pelos quais os revolucionários teriam que responder sob a legislação de direitos humanos da qual eles foram os pioneiros. 

Em 2 de setembro, chegou a Paris a notícia de que os rebeldes contrarrevolucionários haviam rendido a grande base naval em Toulon aos ingleses. Parisienses famintos e irados entraram em pânico e a cidade ficou inteiramente fora de controle por vários dias. Assim, no dia 5 de setembro, a Convenção declarou o terror "a ordem do dia". Recursos equivalentes a 100 milhões de livres foram aprovados para fornecer um mosquete a cada homem na França, o Tribunal Revolucionário foi expandido e, no dia 17 de setembro, foi aprovada a Lei dos Suspeitos. Após a declaração do dia 5 de setembro, o Terror permaneceu como o regime oficial da França por nove meses. Nesse período, 16 mil pessoas foram oficialmente condenadas à morte e um número bem maior de vítimas não oficiais morreu na prisão ou foi linchada sem julgamento. 

No dia 9 de junho de 1794 - um dia após o Primeiro festival do Ser Supremo - Robespierre redigiu leis que fortaleceram ainda mais o Tribunal Revolucionário. Além disso, ele inventou uma nova categoria de criminosos: inimigos do povo. Na sequência, sem a discussão prévia habitual no Comitê de Segurança Pública, foram aprovadas pela Convenção as propostas que ficaram conhecidas como a infame Lei de 22 de Prairial (10 de junho). Nos 47 dias seguintes - até o 9 de termidor (27 de julho), quando Robespierre foi preso - o Terror atingiu o seu clímax. Somente na capital francesa, 1.376 foram guilhotinadas nesse período, o que representa um número maior que em todos os meses desde que fora estabelecido por Danton, em março de 1793.  

Bibliografia consultada: 
BLUCHE, Frédéric. et. al. Revolução Francesa. Tradução de Rejane Janowitzer. Porto Alegre, RS: LP&M, 2009.
SCURR, Ruth. Pureza fatal - Robespierre e a Revolução Francesa. Tradução de Marcelo Schild. Rio de Janeiro / São Paulo: Record, 2009, p. 273-308 e p. 349-352.

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