“Quem não é capaz de sonhar com a história diante dos documentos não é historiador.” F. Braudel

“Quem não é capaz de sonhar com a história diante dos documentos não é historiador.” F. Braudel
Villa Borghese, Roma, Itália.

Centro de Vitória: Prestígio e Decadência

quinta-feira, 30 de agosto de 2018

Palácio da Cultura Sônia Cabral, na Cidade Alta, Centro de Vitória.

Uma das mais antigas cidades do Brasil, Vitória possui no Centro a expressão de sua história ao longo dos séculos, que vai desde a Capela de Santa Luzia, construção do século XVI e tombada pelo IPHAN, passando por obras ecléticas, como a neogótica Catedral Metropolitana, a moderna Rodoviária do arquiteto Carlos Fayet, até chegar em obras contemporâneas como o Tancredão, centro esportivo cujo projeto arquitetônico foi escolhido em concurso organizado pelo IAB/ES.

Tendo vivido seu auge até a década de 1960, quando as cidades ainda se caracterizavam por serem monocentrais, o Centro assistiu incólume à expansão urbana da cidade e à chegada do modelo policentral, quando polos comerciais e instituições públicas se espalharam ao longo do território urbano; a consequência foi um contínuo processo de esvaziamento. Como ponto de partida desta “decadência” se considera o Novo Arrabalde, plano urbanístico do engenheiro sanitarista Saturnino de Brito que propunha um novo vetor de crescimento projetado para Vitória, onde atualmente é a região da Praia do Canto.

De lá pra cá, famílias, empresas e instituições foram pouco a pouco saindo do Centro, de tal modo que hoje são muitos os imóveis vazios na região, muitos deles com excelente padrão construtivo e até mesmo preço baixo para compra ou locação. Uma das questões que contribuem para tal paradoxo são as vagas de estacionamento, pois são edificações de uma época na qual o automóvel ainda não gozava do prestígio alcançado nas décadas seguintes.

Recentemente o Sebrae inaugurou sua nova sede na Enseada do Suá, contribuindo assim para o esvaziamento do Centro. E em breve serão a Receita Federal e o Ministério Público Federal, além do Fórum e parte do Judiciário que também pretendem fazer o mesmo movimento. Há também casos como a Alfandega, já que o número de funcionários diminuiu e encontra-se com pouca atividade após o fim do Fundap.

Em contrapartida, temos os equipamentos culturais, turísticos e de lazer, tais como o SESC Glória, o Theatro Carlos Gomes e o recém inaugurado Palácio da Cultura Sônia Cabral. A eles, se juntará logo a FAFI, uma vez que suas obras de restauração se encontram em fase final. Há ainda que se considerar o agito noturno dos bares e restaurantes das ruas Sete de Setembro e Gama Rosa, movimento que se soma aos saraus e lançamentos literários promovidos pela Editora Cousa e exposições no Palácio Anchieta e no Arquivo Público.

Sempre se aponta a vocação turística e cultural do Centro como alternativa econômica para seu esvaziamento. Isso seria muito bom se a população gozasse de mais tempo livre e orçamento para gastos com lazer, ou até mesmo interesse pela cultura histórica, o que, como se sabe, não é verdade.

A atividade comercial, de caráter mais popular, ainda vem mantendo certo nível de dinamismo na região, mas é importante ter em mente que cada vez mais o comércio presencial vem perdendo espaço para as compras on line. E a tudo isso se soma o problema da violência urbana, que fez uma loja de departamentos de uma rede nacional ser arrombada diversas vezes em pouco tempo; não será surpresa se ela vier a fechar em breve, e assim eliminando empregos na região.

Trata-se de um quadro geral não muito diferente de outras cidades brasileiras, nas quais suas áreas centrais apresentam tal dicotomia entre prestígio histórico e decadência econômica. Será necessário um esforço institucional coletivo se quisermos preservar parte da memória urbana do Centro, tornando-o economicamente sustentável. 

Tarcisio Bahia. Publicado no Gazeta Online, dia 4 de julho de 2018.

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