“Quem não é capaz de sonhar com a história diante dos documentos não é historiador.” F. Braudel

“Quem não é capaz de sonhar com a história diante dos documentos não é historiador.” F. Braudel
Villa Borghese, Roma, Itália.

#15Fatos Paradoxos do Cristianinsmo

terça-feira, 4 de dezembro de 2018

1. O verdadeiro problema com este nosso mundo não é que se trata de um mundo sem razão, nem tampouco de um mundo razoável. O tipo mais comum de problema é que se trata de um mundo quase razoável, mas não totalmente. Nesse sentido, o cristianismo não simplesmente deduz verdades lógicas mas, quando se torna ilógico, ele encontra, por assim dizer, uma verdade ilógica.   

2. A fé tem aquela elaboração de doutrinas e detalhes que tanto incomoda os que admiram o cristianismo sem acreditar nele. Quando alguém abraça uma crença, essa pessoa se sente orgulhosa de sua complexidade, e se a crença está certa, é um elogio dizer que ela é elaborada. Por outro lado, é muito difícil defender alguma coisa da qual se está inteiramente convencido. Assim, toda convicção completa está envolvida numa espécie de desamparo.  

3. Eu era um pagão aos 12 anos, e um "perfeito agnóstico" aos 16; tudo o que ouvira da teologia cristã me alienara dela. Ele li a literatura científica e cética do meu tempo, até que Huxley, Herbert Spencer e Bradlaugh me trouxeram de volta à teologia ortodoxa. O racionalista me fez pensar se a razão tinha alguma utilidade qualquer, e Spencer me fez duvidar se a evolução havia sequer acontecido.  

4. O cristianismo era atacado de todos os lados e por todas as razões contraditórias. Mal um racionalista acabara de demonstrar que ele pendia demais para o oriente, outro demonstrava com igual clareza que ele pendia demais para o ocidente. Os críticos do cristianismo provavam que ele era puramente pessimista para, logo a seguir, provar que ele era, em grande parte, otimista demais. Na história descobri que o cristianismo não fez parte da Idade das Trevas; muito pelo contrário, ela foi, através desse período, a única trilha que não era de trevas. Foi uma ponte luminosa ligando duas luminosas civilizações.   

5. O cristianismo não poderia ser, ao mesmo tempo, a máscara negra de um mundo branco, e também a máscara branca de um mundo negro. Swinburne, que acusava o cristianismo de pessimismo, era ele também um pessimista. Argumenta-se que o cristianismo comporta algo de tímido, monástico e pouco viril, especialmente em sua atitude perante a resistência e a luta. No entanto, o cristianismo também é acusado por sua luta excessiva - ele parecia ser a matriz de todas as guerras. Ele inundara o mundo de sangue.  

6. A única objeção real à religião cristã é simplesmente que ela é uma única religião. Os credos, diziam, dividem os homens; mas pelo menos as doutrinas morais os uniram. Eu acreditava nessa doutrina da fraternidade de todos os homens na posse do senso moral, mas as mesmas pessoas que diziam que a humanidade era uma única igreja ao longo dos séculos diziam que a moralidade havia mudado totalmente, e o que era certo numa época era errado em outra.    

7. Alguns céticos escreveram que o grande crime do cristianismo fora seu ataque contra a família; ele arrastara as mulheres à solidão e contemplação do do claustro, longe de sua casa e filhos. Mas, em contrapartida, outros céticos disseram que o grande crime do cristianismo foi obrigar-nos ao casamento e à constituição de uma família. Segundo os anticristãos, certos versículos das epístolas ou o ritual do casamento mostravam desprezo pela mulher. Porém, os próprios anticristãos nutriam desprezo pelo intelecto feminino - sua grande chacota contra a igreja na Europa era que "apenas mulheres" a frequentavam.    
8. Ou então, o cristianismo era censurado por seus hábitos despojados e estéreis; no momento seguinte, todavia, era censurado por sua pompa e ritualismo. Era ofendido por ser simples demais e por ser demasiado colorido. De novo, o cristianismo sempre fora acusado de limitar em excesso a sexualidade, até que o malthusiano Bradlaugh descobriu que ele a limitava pouco demais. 

9. Num mesmo panfleto, um ateu censurava a fé por sua desunião ("um pensa uma coisa, outro pensa outra") e a censurava por sua união ("é a diferença de opinião que preserva o mundo de sucumbir"). Um livre-pensador, numa mesma conversa, censurava o cristianismo por desprezar os judeus, e depois ele mesmo o desprezava por ser judaico. 

10. Era certamente estranho que o mundo moderno acusasse o cristianismo simultaneamente de austeridade física e de pompa artística. Mas era também estranho, muito estranho, que o próprio mundo moderno combinasse um luxo físico extremo com uma extrema ausência de pompa artística. 

11. O paganismo declarou que a virtude estava em equilíbrio; o cristianismo declarou que ela estava em conflito: a colisão das duas paixões aparentemente opostas. O cristianismo é um paradoxo sobre-humano segundo o qual duas paixões opostas podem arder lado a lado. 

12. No cristianismo, num sentido, o homem devia sentir-se mais orgulhoso do que nunca; noutro ele devia ser mais humilde do que jamais fora. Na medida em que sou homem, sou a principal das criaturas. Na medida em que sou um homem, sou o principal dos pecadores. Assim, o cristianismo alimentou um pensamento de dignidade do homem; no entanto, ele podia ao mesmo tempo alimentar um pensamento sobre a abjeta pequenez do homem que só poderia ser expresso em jejuns e fanática submissão. 

13. A caridade é um paradoxo, como a modéstia e a coragem. Mal formulada, a caridade com certeza significa duas coisas: perdoar atos imperdoáveis ou amar pessoas não amáveis. Ao entrar em cena na Antiguidade pagã, o cristianismo separou o crime do criminoso. Ao criminoso devíamos perdoar até setenta vezes sete. Ao crime não devíamos perdoar de modo algum.   

14. A doutrina cristã detectou as esquisitices da vida. Ela não apenas descobriu a lei, mas previu as exceções. Subestimam o cristianismo os que dizem que ele descobriu a misericórdia; qualquer um poderia descobri-la. De fato todos o fizeram. Mas descobrir o plano para ser misericordioso e também severo - isso foi antecipar uma estranha necessidade da natureza humana.

15. Sob o cristianismo, a Europa (embora continue sendo uma unidade) dividiu-se em diversas nações. O instinto do império pagão teria dito: "Vocês serão todos cidadãos romanos e se tornarão semelhantes entre si." Mas o instinto da Europa cristã diz: "Que os alemães permaneçam lentos e reverentes, para que os franceses possam, em maior segurança, ser rápidos e experimentais. Vamos criar um equilíbrio a partir desses excessos."  

Bibliografia consultada: CHESTERTON, Gilbert Keith. Ortodoxia. Tradução de Almiro Pisetta. 2. ed. São Paulo: Mundo Cristão, 2017, p. 106-130 e 190.

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