“Quem não é capaz de sonhar com a história diante dos documentos não é historiador.” F. Braudel

“Quem não é capaz de sonhar com a história diante dos documentos não é historiador.” F. Braudel
Villa Borghese, Roma, Itália.

A ciência histórica é "eurocêntrica"?

quarta-feira, 18 de dezembro de 2013



Acusar a moderna ciência histórica de ser 'eurocêntrica' é tão absurdo quanto acusar uma roda de girar em torno do seu eixo. Não só a Europa foi a força histórica mais ativa nesse período, mas a própria consciência histórica é uma criação dela, praticamente sem paralelo em outras culturas (exceções individuais como Ibn Khaldun não contam). Até  mesmo a possibilidade de narrar a história desde o ponto de vista de outros agentes ou outras culturas é uma criação europeia. Pior: a única cultura que se dedicou a tentar compreender as outras sem projetar sobre elas os seus próprios valores foi a europeia. Imagine, por exemplo, tentar escrever num país islâmico uma história 'neutra' das relações entre cristianismo e Islam. É pena de morte na certa. Quanto menos eurocêntrico você quer ser, mais eurocêntrico se torna, por mais que isto o desagrade.


OLAVO DE CARVALHO
Publicado no Facebook (18/12/2013)

A Arte Clássica Greco-Romana

segunda-feira, 21 de outubro de 2013

Laocoonte e seus filhos, séc. II a.C. Museus Vaticanos.

Muito da arte grega se relacionava, direta ou indiretamente, com a sua religião politeísta. Templos ricamente decorados abrigavam os deuses do Olimpo, representados em estátuas de notável realismo; de fato, "não existe corpo humano que seja tão simétrico, tão bem construído e belo quanto o das estátuas gregas" (Gombrich, 1999: p. 103).

Para não nos alongarmos, nessa introdução à arte clássica greco-romana vamos nos concentrar nas esculturas e na arquitetura. Cumpre-nos lembrar, contudo, que quase todas as estátuas famosas do mundo antigo desapareceram após o triunfo do cristianismo, uma vez que considerava-se piedoso dever destruir estátuas dos deuses pagãos (às vezes, tal vandalismo era até patrocinado por governantes, como Constantino, no séc. IV).

De toda a longa história da arte grega, destacamos o período compreendido entre 520 e 420 a.C. Essa foi a época do grande despertar da arte para a liberdade. Mas é justo reconhecer o brilhantismo de artistas anteriores e posteriores a esse período; assim, temos a lista abaixo:

I. Polímedes de Argos (Os irmãos Cleóbis e Biton, c. 615-590 a.C.)
II. Ictino (O PartenonAcrópole, Atenas, 447-432 a.C.)
III. Fídias (autor de uma imponente estátua de Palas Atena, da qual, infelizmente, contamos apenas com uma cópia romana, do séc. V a.C.; ele também foi o criador da estátua de Zeus em Olímpia, também perdida)
IV. Myron (Discóbolo, c. 450 a.C.)
V. Praxíteles (Hermes com o jovem Dionísio, c. 340 a.C.)
VI. Hagesandro, Atenodoro e Polidoro de Rodes (Laocoonte e seus filhos, c. 175-50 a.C.) [Ver a imagem acima]

Além de Escopas e de Praxíteles, há ainda outro grande nome da escultura pré-helenística: Lísipo, cuja carreira começou por volta de 370 a.C. e se estendeu até o fim do século. As proporções das estátuas de Praxíteles devem mais a Lísipo que a Policleto e Lísipo não foi certamente o único artista do seu tempo a dominar novos aspectos da realidade. Apoxiomenos é a estátua mais insistentemente ligada ao seu nome (Janson, 2001: p. 207). 

No período helenístico, a escultura grega passou a ser produzida num vasto território e a interação de tendências locais e internacionais deve ter formado um esquema complexo, do qual podemos seguir apenas algumas linhas isoladas. Uma das obras mais notáveis dessa época é o altar de Pérgamo, erigido por ordem do filho e sucessor de Átalo I numa colina dominando a cidade para celebrar as vitórias de seu pai (Janson, 2001: p. 209). 

A arte grega e a arte romana são muito semelhantes, sendo que os romanos copiaram muito da arte grega. A maioria dos artistas que atuavam em Roma era de origem helênica, e a maioria dos colecionadores romanos adquiria obras dos grandes mestres gregos ou cópias dessas obras. Não temos conhecimento de artistas romanos que tenham alcançado a fama, embora os grande nomes da arte grega - Policleto, Fídias, Praxíteles, Lísipo e outros - fossem exaltados com o mesmo fervor de sempre (Janson, 2001: p. 233). Tendo em vista as características próprias do imperialismo romano, é importante destacar sobre sua civilização e arte que, além da predominante herança grega, foram influenciadas em menor grau pelos etruscos, egípcios e povos do Oriente Próximo (idem, p. 234).

A mais admirável realização dos romanos ocorreu, provavelmente, na área da engenharia civil. O mais famoso de seus edifícios é, talvez, a arena conhecida como o Coliseu, no coração de RomaConcluído em 80 d.C., é um dos maiores edifícios do mundo, capaz de abrigar mais de 50 mil espectadores. "A estrutura de concreto, com os seus quilômetros de escadarias e corredores abobadados, é uma obra-prima de engenharia pela eficiência no escoamento da enorme corrente humana que afluía aos espetáculos" (ibidem, p. 240).

Os romanos aproveitavam da arquitetura grega tudo o que apreciavam, aplicando esses empréstimos às suas próprias necessidades. Mas, em alguns aspectos, os romanos foram bem originais. A mais importante característica da arquitetura romana são os arcos. Essa invenção teve importância reduzida ou nula nas edificações gregas, embora possivelmente não fosse desconhecida dos arquitetos gregos. Construir um arco com pedras separadas em forma de cunha é uma dificílima façanha de engenharia. Após essa arte ter sido dominada, os construtores passaram a utilizá-la para projetos cada vez mais ambiciosos. Os romanos tornaram-se grandes especialistas na arte da construção de abóbadas, graças a diversos expedientes de natureza técnica. O mais sublime de seus edifícios é o Panteão, um templo dedicado a todos os deuses (ou, mais exatamente, às sete divindades planetárias - daí os sete nichos). Saiba mais sobre ele e outras maravilhas da Roma antiga AQUI. 


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Bibliografia consultada: 
GOMBRICH, E. H. A história da arte. Tradução de Álvaro Cabral. Rio de Janeiro: LTC, 1999, capítulos 3, 4 e 5.
JANSON, H. W. História Geral da Arte - O Mundo Antigo e a Idade Média. Adaptação e preparação do texto para a edição brasileira de Maurício Balthazar. 2ª ed. São Paulo: Martins Fontes, 2001.

Acervo Anticomunista

domingo, 22 de setembro de 2013

"Os marxistas inteligentes são patifes; os marxistas honestos são burros; e os inteligentes e honestos nunca são marxistas." 
José O. de Meira Penna (1917-2017) 

Não, a citação acima não é uma ofensa. É, sim, um vívido alerta, amparado numa vasta documentação e bibliografia sobre as mazelas do comunismo. Parte dessa bibliografia, inclusive, encontra-se disponível em português. Assim, parto do princípio que você, leitor, é inteligente e honesto, e por isso disponibilizo aqui uma lista de vídeos que reforçará a sua convicção de que o marxismo é o "ópio dos intelectuais", segundo a definição de Raymond Aron. 

O material abaixo, portanto, não constitui peça barata de propaganda anticomunista. Todos esses filmes, documentários, entrevistas e palestras constituem um tesouro de informações sobre as atrocidades do "Socialismo Real" e do marxismo cultural. Esse contundente testemunho não deixa "pedra sobre pedra" sobre a ideologia marxista e as nefastas experiências políticas dela derivadas. Alerto, para as almas mais sensíveis, que algumas imagens e relatos poderão chocar. 

A História Soviética

Trata-se de um excelente documentário, em três partes, sobre a implantação, a consolidação e a queda do comunismo na antiga União Soviética. Exibido pela RTP2, de Portugal.

Este documentário detalha as atrocidades do comunismo soviético, bem como as suas ligações com o nazismo. Desta forma, vai na linha do livro O Passado de Uma Ilusão, de François Furet (Siciliano, 1995).

Filme de 1992, dirigido por Ivan Passer. Trata-se de um relato da trajetória política e pessoal do tirano soviético Joseph Stalin, produzido a partir a partir dos relatos de sua filha. P.s. Há uma opção de assistir ao filme inteiro, sem a necessidade de acessar outros links. No entanto, parece que a qualidade da imagem é um pouco inferior. Veja aqui.

4. Doc. O Apocalipse de Stalin [P1] [Parte 2] [Parte 3]
Excelente documentário sobre Stalin, produzido pela RTP3, de Portugal.

Filme de 1991, dirigido por Andrei Konchalovsky. Baseado numa história real e com cenas gravadas no Kremlin, mostra a vida de Ivan Sanchin, funcionário da KGB que se tornou operador de projeção de filmes privados de Stalin entre 1939 e 1953.

6. Anne Applebaum fala sobre o Gulag
Nesta entrevista, concedida ao programa Milênio da Globo News, a jornalista Anne Applebaum Elizabeth fala sobre o sistema de campos de trabalhos forçados da União Soviética. Suas pesquisas resultaram no premiado livro Gulag: uma história (Ediouro, 2004).

7. Filme "Caminho da Liberdade" 
Filme britânico de 2010, dirigido por Peter Weir. Ilustra a vida no Gulag, e a fuga de um grupo de prisioneiros. 


8. Ilha dos Canibais
Documentário sobre um campo do Gulag numa ilha da Sibéria onde os prisioneiros, abandonados à própria sorte, entregaram-se ao canibalismo.

9. Khrushchev e a Primavera de Praga
Documentário sobre a Guerra Fria, do período em que Nikita Khrushchev esteve à frente da União Soviética até 1968, quando ocorreu a Primavera de Praga.

10. Entrevista sobre a subversão soviética Palestra sobre a subversão soviética 
No primeiro vídeo, Yuri Bezmenov (Thomas Schuman), desertor da KGB, descreve a estratégia de subversão das sociedades ocidentais pela agência de espionagem soviética. No segundo vídeo, em uma palestra, Bezmenov apresenta outros detalhes da atuação da KGB.

11. Livre para escolher: a falência do socialismo
Excelente documentário apresentado por Milton Friedman, Nobel de Economia de 1976, sobre a transição da economia planificada para a economia de mercado do Leste europeu.

12. Os últimos dias da União Soviética

Documentário exibido pelo canal Futura, sobre o governo de Mikhail Gorbachev (1985-1991) e o colapso da União Soviética e do Socialismo Real.

13. A História do Comunismo e o Mundo Atual
A história do comunismo e das revoluções comunistas e o seu impacto no século XX é explicada pelo historiador Silvio Pons nesta entrevista concedida ao programa Milênio, da Globo News. Pons também concedeu uma entrevista para O Globo e é autor de A Revolução Global - História do Comunismo Internacional (1917-1991). 

O Comunismo além da União Soviética

14. História do Muro de Berlim

Documentário exibido pelo canal History, sobre a história do "Muro da Vergonha".

15. Filme "A vida dos outros" 
Filme alemão de 2006, dirigido por Florian Henckel von Donnersmarck. A película narra a história de um agente da Stasi (a polícia política da República Democrática Alemã). Esse agente é encarregado de coordenar escutas clandestinas no apartamento de um casal da vida cultural de Berlim e, contrariando as expectativas, passa a ter simpatia por eles. Vencedor do Oscar de melhor filme estrangeiro. P.s. O filme foi censurado do YouTube, após anos lá. Assim, indico aqui uma análise do mesmo.

16. Stasi - Polícia secreta da Alemanha Oriental
Reportagem da Globo News sobre a polícia secreta da então República Democrática Alemã. Utiliza imagens do filme A Vida dos Outros.

17. Nadia Comaneci - A Ginasta e o Ditador
Documentário sobre a trajetória de Nadia Comaneci e Nicolae Ceaușescu, o ditador da Romênia, entre 1965 e 1989.

18. Che Guevara: a anatomia de um mito
Documentário que arrasa o mito do "herói" latino-americano, Che Guevara. Produzido a partir de entrevistas com vários ex-revolucionários, muitos deles vítimas diretas ou indiretas do psicopata argentino. Legendado.

19. Os arquivos perdidos de Fidel Castro
Documentário sobre o revolucionário de ditador Fidel Alejandro Castro Ruz (1926-2016). Dublado. 
Reportagem-documentário produzida pela GNT. Explica a Revolução Chinesa de 1949 e, especialmente, a biografia de seu líder, Mao Tsé-Tung. Uma denúncia dos crimes de um dos mais brutais ditadores comunistas de todos os tempos.

21. A Grande Fome de Mao 
Documentário sobre as consequências do processo de coletivização implementado por Mao Tsé-Tung na China.
Rara e excelente reportagem-documentário sobre o genocídio cometido pelo Khmer Vermelho, de Pol Pot, no Camboja. ATENÇÃO: Caso o vídeo seja mais uma vez censurado do YouTube, baixe-o aqui (sem legendas; as mesmas poderão ser obtidas na internet).

23. Guerras da Iugoslávia
Compêndio de reportagens da Globo, sobre a sangrenta dissolução da Iugoslávia. Trata-se de um verdadeiro dossiê desses turbulentos anos da Península Balcânica.

24. Coreia do Norte: liberdade ou morte 
Uma das melhores reportagens já feitas sobre o drama dos fugitivos da tirania norte-coreana. Foi exibido em Portugal, pela SIC. Imperdível.

25. Raptados pela Coreia do Norte
Reportagem exibida em Portugal, pela SIC. Mostra o esquema de raptos de estrangeiros pela tirania norte-coreana.

26. Shin fala sobre a fuga do Campo 14
Entrevista a Shin Dong-hyuk, o único prisioneiro que sobreviveu a uma fuga do Campo 14, uma prisão de condições abomináveis, trabalhos forçados e segurança máxima da Coreia do Norte (leia mais aqui).

27. Kim Jong-un, uma biografia não autorizada
Produzido pela Globo News, este documentário conta com entrevistas até então inéditas de pessoas que foram próximas ao ditador da Coreia do Norte.

28. Coreia do Norte: armas nucleares, terror e propaganda
Documentário de 2016, produzido por jornalistas franceses. Ative as legendas. 

29. Um Dia na Vida de um Ditador
Documentário inovador, mostra a rotina sanguinária e imoral de três dos piores ditadores do século XX: Joseph Stalin (União Soviética), Idi Amin Dada (Uganda) e Muammar Gaddafi (Líbia). O link acima é de um vídeo editado, que se concentra na vida do tirano de Uganda. Ative as legendas.

30. A Ascensão de Vladimir Putin 
Documentário sobre a ascensão de Vladimir Putin ao governo da Rússia. Como fica claro, para se proteger de inúmeros crimes, Putin tornou-se um prisioneiro do Kremlin - não confia em ninguém para protegê-lo caso deixe o poder.

31. O Mundo Segundo Xi Jinping
Documentário sobre a trajetória do ditador vitalício chinês e seus planos de dominação global.

O Marxismo Cultural

32. O Que é Marxismo Cultural? / História do Politicamente Correto
O primeiro vídeo apresenta uma definição sintética do Marxismo Cultural; o segundo lança luz sobre a fundação, os primeiros tempos e as estratégias da Escola de Frankfurt. Ambos são legendados.

33. O Triunfo do Marxismo Cultural
Entrevista do filósofo Olavo de Carvalho, um dos maiores nomes do pensamento anticomunista brasileiro, a Cliff Kincaid. O programa é apresentado por Jerrey Kenney. Legendado.

Documentário escrito, produzido e dirigido por Curtis Bowers. Denuncia a degradação moral dos Estados Unidos pelos comunistas. Pesquise especialmente sobre os 45 objetivos dos comunistas para minar as bases morais da sociedade americana, conforme expostos no livro The Naked Communist e apresentados no documentário em questão.

35. Agenda 2 - Mestres do Engano

Segunda parte do documentário Agenda, de Curtis Bowers.

36. Lavagem cerebral: O Paradoxo da Igualdade
Documentário norueguês produzido pelo sociólogo Harald Eia, mostra as contradições e falta de base científica da ideologia de gênero. Trata-se do episódio 1 de uma série.

37. A Verdade sobre o Ciclo da Violência
Infelizmente, o canal dos Tradutores de Direita foi censurado. No vídeo em questão, Stefan Molyneux desmascarava o tal "ciclo da violência", tão propalado pela esquerda.

38. Uma conversa sobre racismo
Documentário escrito e produzido por Craig Bodeker. Trata-se de uma denúncia contra o artificial e manufaturado conceito de "racismo" que, na verdade, traz embutido um preconceito anti-branco e é uma das armas do marxismo cultural.

39Saul Alinsky e o Comunismo nos EUA
Palestra de Sílvio Medeiros na PUC-SP. Saul Alinsky (1909-1972) foi discípulo de Antônio Gramsci (1891-1937) e mentor político de Barack Obama, presidente americano entre janeiro de 2009 e janeiro de 2017.

40. Palestra da Ana Campagnolo no CPAC
A Prof.ª Ana Caroline Campagnolo é licenciada em história e atualmente exerce o mandato de deputada estadual no estado de Santa Catarina (2019-2022). Ela é autora do livro Feminismo - Perversão e Subversão (Vide Editorial, 2019). 

Historiadores X Jornalistas

terça-feira, 10 de setembro de 2013

 Ontem o Programa Roda Viva (TV Cultura) entrevistou o jornalista metido a historiador Laurentino Gomes (detalhe: na bancada só haviam jornalistas!). A 1ª parte da entrevista pode ser vista AQUI.

Talvez motivado por essa entrevista, alguém me perguntou o que achava sobre o fato de jornalistas escreverem livros supostamente históricos. Resolvi transformar a resposta no meu 40º post.

Há vantagens e desvantagens na publicização do passado levada a cabo pelos jornalistas. É notório que a divulgação dos fatos históricos aguça a curiosidade do grande público e dissipa parte de sua ignorância. Mas jornalistas como Eduardo Bueno e Laurentino Gomes não escrevem História. Eles próprios reconhecem-no. Como afirmou Jacques Le Goff, no prefácio de Apologia da História (de Marc Bloch): "... mesmo os melhores jornalistas permanecem 'colados' ao acontecimento." Note esse "vício" jornalístico em trecho do livro 1822, de Laurentino Gomes:

O destino cruzou o caminho de D. Pedro em situação de desconforto e nenhuma elegância. Ao se aproximar do riacho Ipiranga, às 16h30 de Sete de setembro de 1822, o príncipe regente, futuro imperador do Brasil e rei de Portugal, estava com dor de barriga. A causa dos distúrbios intestinais é desconhecida. Acredita-se que tenha sido algum alimento mal conservado ingerido no dia anterior em Santos, no litoral paulista, ou a água contaminada das bicas e chafarizes que abasteciam as tropas de mula na Serra do Mar. Testemunha dos acontecimentos, o coronel Manuel Marcondes de Oliveira Melo, subcomandante da guarda de honra e futuro Barão de Pindamonhangaba, usou em suas memórias um eufemismo para descrever a situação do príncipe. Segundo ele, a intervalos regulares, D. Pedro se via obrigado a apear do animal que o transportava para 'prover-se' no denso matagal que cobria as margens da estrada.

Outro livro do Laurentino, escrito antes mesmo de 1822, foi 1808.

Seu colega, Eduardo Bueno, certa vez disse descaradamente que o seu trabalho era "encantar o cliente" (note a semelhança com os antigos logógrafos gregos). Já o trabalho do historiador, como estabelecido na Antiguidade, é ser fiel à verdade histórica. O jornalista é um pragmático, "refém do cliente; como precisa de retorno financeiro imediato, seu tom é necessariamente sensacionalista e factual. O historiador é um cientista da História, daí ter que carregar o "peso" da erudição.

Por outro lado, parte do sucesso desses jornalistas "contadores de histórias" deve-se ao vácuo deixado por nós, historiadores. No mesmo livro supracitado, Marc Bloch falou do dever que o historiador tem de "saber falar, no mesmo tom, aos doutos e aos estudantes." Temos que divulgar os nossos conhecimentos! Particularmente, tenho esse projeto, e pretendo levá-lo a cabo não só através da escrita, mas também através do lúdico, razão pela qual formei uma coleção de soldados de chumbo da Antiguidade.

Sócrates estabeleceu o princípio da educação ocidental na fórmula "Só sei que nada sei.' Mas os nossos "jornalistas-cronistas" parecem ignorá-lo (aliás, esse parece ser o "pecado" mais recorrente dos jornalistas em geral - achar que sabem de tudo!). Em entrevista ao Correio Braziliense (28/10/2010), Laurentino Gomes disse que já não precisava de consultoria de historiadores. Genial! Mesmo os historiadores mais renomados, antes de publicarem os seus trabalhos, não dispensam leituras e críticas, das mais diversas origens.

«Los olvidados de Roma», de Robert Knapp

quarta-feira, 19 de junho de 2013

KNAPP, Robert. Los olvidados de Roma. Prostitutas, forajidos, esclavos, gladiadores y gente corriente. Barcelona: Ariel, 2011. 416 pp.

Prossegue a nossa campanha de divulgação de bons livros de História Antiga. Sugerimos hoje um livro extremamente oportuno: Los olvidados de Roma (cuja tradução mais fiel seria Romanos invisíveis). Com ele Robert Knapp preenche uma lacuna na historiografia da Roma Antiga. Como poucas vezes se viu, nessa obra a "gente corrente" é a protagonista. Assim, Knapp apresenta-nos um trabalho sério, fruto de intensa e árdua pesquisa. Dentre as mais diversas fontes utilizadas, destaca-se o Novo Testamento, frequentemente ignorado ou mal-interpretado quando o tema diz respeito à história do Mundo Antigo. Portanto, a editora Ariel mais uma vez merece ser aplaudida pela excelente iniciativa de publicar a tradução de uma obra tão importante para a comunidade acadêmica e para o público interessado.

Eu considero Los olvidados de Roma o livro "top" dentre os que eu li em 2013.

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Compre-o no Wook.
Leia o capítulo sobre os "hombres corrientes" e uma resenha completa no Hislibris.

Entrevista - O Integralismo

domingo, 12 de maio de 2013


Aventurei-me por novos mares. Há pouco mais de um mês, aceitei um gentil convite do apresentador Almir Bressan, da TV Ambiental. Qual o tema? O Integralismo brasileiro! 

Confira, abaixo, as três partes da entrevista:








Visitem o site da TV Ambiental.

Protestos do camponês eloquente

quarta-feira, 8 de maio de 2013

Pintura de parede do túmulo de Sennedjem, um construtor de túmulos de Tebas no séc. XIII a.C (Império Novo). Ele e sua esposa Iyneferet são mostrados na vida após a morte. Estão a semear e a arar os campos do Paraíso. Sennedjem usa um chicote para conduzir as duas vacas malhadas que puxam o arado. Plantas de linho altos crescem atrás Iyneferet, que possui uma cesta de sementes, as quais lança no solo recém-arado. Abaixo, estão as palmeiras e outras árvores. 

Desta forma, fica claro que os egípcios mais favorecidos tinham a vida rural como um ideal para o Além. No entanto, a vida dos felás (camponeses) estava longe de ser perfeita. Eles sofriam com a exploração daqueles que só após a morte seriam vistos trabalhando com um arado.

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O Primeiro Período Intermediário do Antigo Egito se iniciou em 2185 a.C. e compreendeu as VI, VII, VIII, IX, X e XI dinastias. Nessa época o poder esteve dividido e o país mergulhou na anarquia e na guerra civil. No entanto, no meio do caos os egípcios desenvolveram um conjunto de valores morais que exaltavam o indivíduo. Isso aparece de forma explícita no famoso papiro Protestos do camponês eloquente, da X dinastia. Trata-se da história de um pobre camponês que, despojado de seus bens por um rico latifundiário, reclama os seus direitos:


Não despojes de seu bem um pobre homem, fraco, como tu sabes. O que ele possui é o [próprio ar que respira] um homem sofredor, e aquele que o rouba corta-lhe a respiração. Tu foste designado para presidir audiências, para decidir entre dois homens e punir o bandido [mas], observa, és o defensor do ladrão que tu gostarias de ser. Confiou-se em ti, embora te tenhas tornado um transgressor. Tu foste designado para ser a barragem do sofredor, protegendo-o para que ele não se afogasse [mas], observa, tu és o lago que o engoliu.

Citado em BAKR, A. A. O Egito Faraônico. In: MOKHTAR, G. (coord.). A África Antiga. Tradução de Carlos H. Davidoff et. al. São Paulo: Ática; (Paris): UNESCO, 1983, p. 84. 


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* Crédito da imagem: Mitchell Teachers
* Os Protestos do camponês eloquente estão disponíveis na coletânea Doze textos egípcios do Império Médio, organizada por Telo Ferreira Canhão (Imprensa da Universidade de Coimbra, 2013). Compre-a AQUI.
* O 1º volume da tese de doutorado do Telo Canhão pode ser lido AQUI, e o 2º (fragmentado), AQUI.