“Quem não é capaz de sonhar com a história diante dos documentos não é historiador.” F. Braudel

“Quem não é capaz de sonhar com a história diante dos documentos não é historiador.” F. Braudel
Villa Borghese, Roma, Itália.

O Misticismo Islâmico: as Tariqas

domingo, 31 de dezembro de 2023

Frithjof Schuon (1907-1998), fundador da tariqa sufi Maryamiyya ("Mariana", em árabe).

No fim do século X e no século XI começou a ocorrer outro fato. Os que seguiam o mesmo mestre passaram a identificar-se como uma única família espiritual, seguindo o mesmo caminho (tariqa). Algumas dessas famílias continuaram por um longo período, e reivindicavam uma linhagem que remontava a algum grande mestre da vida espiritual, da qual a tariqa recebia o nome, e por intermédio dele ao Profeta, por meio de 'Ali ou Abu Bakr. Alguns desses "caminhos" ou "ordens" estendiam-se por uma vasta área no mundo islâmico, levados por discípulos de um mestre podiam fundar suas próprias ordens, mas em geral reconheciam uma afinidade com o mestre que lhes havia ensinado o caminho. Entre as ordens mais disseminadas e duradouras, algumas tiveram início no Iraque; eram a Rifa'iyya, que remontava ao século XII, a Suhrawardiyya no século XIII, e - a maior de todas - a Qadiriyya, batizada segundo o nome de um santo de Bagdá, Abd al-Qadir al-Jilani (1077/8-1166), mas que só emergiu nitidamente no século XV. Das ordens que surgiram no Egito, a Shadhiliyya iria tornar-se a mais importante, sobretudo no Magreb, onde foi organizada por al-Jazuli (m. c. 1465). Em outras parte dos mundo muçulmano, outras ordens ou grupos de ordens se destacaram: por exemplo, a Mawlawiyya na Anatólia, e a Naqshbandiyya na Ásia Central. Algumas delas iriam difundir-se também para os países de língua árabe.

Só uma minoria de adeptos de tais ordens dedicava toda a vida ao caminho, vivendo em conventos (zawiya, khanqa); alguns destes, sobretudo nas cidades, eram pequenos prédios, mas outros eram maiores, incluindo uma mesquita, um lugar para exercícios espirituais, escolas, hospedarias para visitantes, tudo agrupado em torno do túmulo do mestre cujo nome recebiam. Contudo, a maioria dos membros da ordem vivia no mundo; incluía tanto homens quanto mulheres. Para alguns deles, a filiação a uma ordem era pouco mais que nominal, mas para outros implicava alguma iniciação em doutrinas e práticas que poderiam ajudá-los a avançar no caminho para o êxtase da união.

As ordens diferiam em sua visão do relacionamento entre os dois caminhos do Islã: o da charia, obediência à lei oriunda dos mandamento de Deus no Corão, e o da tariqa, a busca da experiência de conhecimento direto d'Ele. De um lado, ficavam as ordens "sóbrias", que ensinavam que, após o autoaniquilamento e embriaguez da visão mística, o fiel devia retornar ao mundo das atividades diárias da vida e viver dentro dos limites da charia, cumprindo suas obrigações com Deus e seus irmãos humanos, mas dando-lhes novo significado. Do outro lado, ficavam aqueles aos quais a experiência de união com Deus deixava embriagados com um senso da presença divina, de tal modo que sua vida real daí em diante era vivida na solidão; não se importavam se incorriam na censura de esquecer as obrigações determinadas pela charia, e podiam até acolher de bom grado tal censura, como um meio de dar as costas ao mundo (Malamatis). A primeira tendência era associada aos que diziam descender de Junayd, a segunda aos que viam Abu Yazid al-Bistami como seu mestre.  

HOURANI, Albert. Uma História dos Povos Árabes. Tradução de Marcos Santarrita. 2ª reimpressão. São Paulo: Companhia das Letras, 1994, p. 166.

Ulemás e Mercadores

terça-feira, 26 de dezembro de 2023


Os que ensinavam, interpretavam e ministravam a lei, juntamente com os que exerciam certas outras funções religiosas - que puxavam as preces nas mesquitas ou faziam o sermão de sexta-feira - passaram a formar uma camada na sociedade urbana: os ulemás, homens de saber religioso, guardiães do sistema de crenças, valores e práticas comuns. Eles não podem ser encarados como uma classe única, pois espalhavam-se por toda a sociedade, exercendo diferentes funções e merecendo variados graus de respeito público. No alto deles, porém, ficava um grupo que fazia parte integral da elite urbana, os ulemás superiores: juízes dos principais tribunais, professores nas grandes escolas, pregadores nas principais mesquitas, guardiães de santuários, quando eram também conhecidos por seu saber e religiosidade. Alguns desses diziam descender do Profeta, através da filha Fátima e do marido dela, 'Abi ibn Abi Talib. A essa altura os descendentes do Profeta, os sayyids ou xarifes, eram vistos com respeito especial, e em alguns lugares podiam exercer a chefia; no Marrocos, as duas dinastias que governaram do século XVI em diante baseavam sua pretensão à legitimidade em seu status de xarifes.

Os ulemás superiores eram estreitamente ligados aos outros elementos da elite urbana, os mercadores e mestres de ofícios respeitados. Possuíam uma cultura comum; os mercadores mandavam os filhos para ser educados por sábios religiosos nas escolas, para adquirir conhecimento do árabe e do Corão, e talvez da lei. Não era incomum um homem trabalhar tanto como professor e erudito quanto no comércio. Os mercadores precisavam dos ulemás como especialistas legais, para escrever documentos legais em linguagem precisa, acertar disputas sobre propriedade e supervisar a divisão de sua propriedade após a morte. Mercadores de peso e respeitados podiam atuar como 'udul, homens de boa reputação cujo testemunho era aceitável por um cádi.

HOURANI, Albert. Uma História dos Povos Árabes. Tradução de Marcos Santarrita. 2ª reimpressão. São Paulo: Companhia das Letras, 1994, p. 129-130.

Casa de Catal Hüyük, Turquia

domingo, 24 de dezembro de 2023

 

O Discurso Instrutivo: expor e dissertar

domingo, 17 de dezembro de 2023

 

Por uma questão de concisão, listarei, sem longo comentário, uma série de recomendações que, caso seguidas, devem aumentar a efetividade da instrução didática em sua forma oral.

1. Para estimular a escuta ativa, a apresentação deve atrair e prender a atenção. Ela só será bem-sucedida se os estudantes esperarem ser questionados pelo professor tanto durante a aula como posteriormente. O conteúdo nunca está "acabado".

No período de aula, nunca se deve dedicar mais da metade do tempo à exposição, permitindo, assim, que a outra metade seja reservada a perguntas. Desse modo, nenhuma aula se tornará uma sessão de escuta passiva e sonolenta, ou uma em que os alunos tomam notas a fim de memorizar o que esperam que se repita nas provas.

2. O discursivo instrutivo deve ter uma dimensão tanto retórica como lógica. Apenas a organização e o rigor não bastaram para que a instrução didática seja efetiva. Para que os professores sejam eficazes retoricamente, devem mostrar que possuem um interesse vívido no assunto como um todo e "reencenar" o tópico específico que estão abordando. O entusiasmo e o discurso imaginativo são contagiantes, por meio deles se prende a atenção dos ouvintes que precisam ser estimulados. Quando os professores apenas contam o que sabem e mostram-se entediados pelo que dizem, esse tédio também é contagioso.

3. O interesse enérgico, a mente ativa e a atenção fixa são causados, seja nos professores, seja nos alunos, pelas emoções do fascínio e da descoberta. Os professores devem tentar incluir, no começo das suas aulas, um certo elemento de fascinação e, então, incitar nos alunos o sentimento de excitação causado pela descoberta, que, por sua vez, requer o fascínio. Este pode ser gerado ao se apresentar a lição como uma espécie de quebra-cabeça; desse modo, o prazer da descoberta será a resposta do enigma.

4. Professores que já sabem aquilo que os estudantes devem aprender inevitavelmente colocam-se a uma certa distância dos seus alunos. Se, durante a exposição instrutiva, eles permanecerem nessa posição distante, não serão capazes de alcançar os alunos. Se tentarem eliminar essa distância supondo que o desconhecimento dos alunos é o mesmo da média da população, acabarão avançando muito pouco. Em vez disso, devem encontrar um ponto intermediário entre o seu conhecimento e a ignorância dos alunos.

Em outros termos, os professores devem evitar estes dois extremos: não devem falar muito acima do nível dos alunos, ou seja, além da capacidade deles de entender o que se diz, e também não devem simplificar demais a exposição e, assim, perder a atenção da classe ao serem óbvios, tediosos e terem ares de superioridade. O ponto intermediário está em dizer coisas que os estudantes podem facilmente compreender acompanhadas de coisas que lhes demandam certo esforço par se entender. Este esforço deve, então, ser "reencenado" no período de perguntas depois da exposição.

5. O período de perguntas e respostas que, em todas as aulas, vem depois da exposição instrutiva deve sempre ser uma conversa bilateral. Deve incluir perguntas feitas pelos alunos e respondidas pelo professor e também perguntas do professor aos alunos. O ensino didático, se não acompanhado dessa conversa autêntica, sempre deixa os professores num estado de ignorância sobre o que conseguiram de fato realizar. Se essa falta de contato crescer com o passar do tempo, o ensino será cada vez menos efetivo. A menos que o professor descubra, por meio de perguntas e respostas, o que se passa na mente dos seus ouvintes, ele não tem como direcionar os seus esforços didáticos.

6. Para que se obtenha máxima efetividade, no começo da aula deve-se dizer aos alunos o que se espera que aprendam e por que eles devem prestar atenção nisso. Esses comentários iniciais devem ser ditos clara e enfaticamente. Depois, o conteúdo principal da exposição segue as linhas gerais dadas no início, de modo que os ouvintes percebam como um ponto leva a outro. Se uma aula tem três pontos principais, cada um pode ser brevemente resumido depois de exposto. Talvez o professor precise repetir algumas coisas. A apresentação deve terminar com um resumo claro e breve que conduza à sessão de perguntas e respostas.

Ao longo de toda a apresentação, a linguagem empregada deve ser clara e simples, porém sem ser enfadonha, e também elevada sem ser obscura. Os professores não devem ter medo de ser eloquentes, ou até mesmo dramáticos, e não devem usar gírias ou baixo calão na tentativa de serem populares. Mudanças no ritmo da expressão e no tom de voz podem ser muito úteis para prender a atenção do público e, se puderem, os professores devem acompanhar a sua fala com gestos e outros tipos de linguagem corporal. Os melhores professores não têm medo de se verem como atores num teatro.

7. Por último, e mais importante, vem o conselho de que menos é mais. Em qualquer aula dedicada à exposição didática, o objetivo não é apresentar certo conteúdo pré-definido, mesmo se essa "apresentação" deixar os estudantes confusos. O objetivo sensato é apresentar tanto conteúdo quanto os alunos sejam capazes de absorver, o que pode ser medido por meio da conversa bilateral depois da "mini-palestra". Pode ser que se apresente menos conteúdo do que se esperava, mas, assim, os alunos aprenderão mais.

As sete recomendações oferecidas acima aplicam-se principalmente à exposição instrutiva acerca de assuntos não explicados nas leituras obrigatórias. Quando houver leituras obrigatórias, a exposição na sala de aula deve consistir num resumo breve (quinze minutos, por exemplo), porém claramente organizado, em que se detalha o que os alunos deveriam ter aprendido com o livro e, a seguir, deve vir uma sessão de perguntas e respostas mais longa que de costume.

MORTIMER, Adler J. A Proposta Paidéia. Tradução de Paulo Bonafina. Campinas, SP: CEDET, 2021, p. 242-245.

Odisseia, imitação irônica da Ilíada

segunda-feira, 4 de dezembro de 2023

 

Pois se a Ilíada é um livro de origem, com a Odisséia é a literatura que começa, com tudo o que isso supõe de imitação - em grego, mímesis. Simone Weil tinha, de fato, razão ao escrever que a Odisséia é uma imitação da Ilíada. Uma imitação irônica, diria eu. Quando Aquiles explica a Ulisses que preferia "ser um tete a serviço de um camponês" a reinar sobre o império dos mortos, ele põe em dúvida o ideal da morte heróica, que é precisamente o ideal da Ilíada. A bela morte é o valor exemplar da Ilíada. A Odisséia nos ensina, magnificamente, a arte da sobrevivência. A morte, não custa lembrar, será doce para Ulisses, e é isso que ele fica sabendo no reino de Hades, no canto XI. A Ilíada, na Odisséia, tornou-se poesia; ela é cantada pelas sereias, por um aedo na terra dos feaces e em Ítaca.

VIDAL-NAQUET, Pierre. O Mundo de Homero. Tradução de Jônatas Batista Neto. São Paulo: Companhia das Letras, 2002, p. 116-117.

Ulisses e Argo

domingo, 3 de dezembro de 2023

Ulisses e Argo, pintura de Briton Rivière (1840-1920).

Quando Ulisses, no canto XVII [da Odisseia], sob a aparência de um ancião, entra em seu palácio, "um cão estendido no chão estica as orelhas". É Argo, o cãozinho que Ulisses alimentara, sem ter podido fazer dele o seu companheiro de caça. Os pretendentes o haviam utilizado para caçar cabras selvagens, lebres e gamos. Agora, o velho cão, cheio de carrapatos, vive perto do lixo, diante da porta do palácio. Ulisses o reconhece e, com emoção, faz algumas perguntas sobre ele ao porqueiro Eumeu, que ainda não identificara o seu senhor. Eumeu explica: Argo era um galgo infalível na caça. Agora seu dono morreu, e ele não passa de um cão escravo.


Os servidores, desde o momento em que não têm mais um senhor,

não querem mais trabalhar como é preciso.

E Zeus, o ensurdecedor, tira a metade do valor

de um homem, a partir do dia em que é entregue à escravidão.


Argo reconhece o seu dono e morre em seguida.


Mas a morte negra se apossou de Argo

Assim que reconheceu o dono, que partira havia vinte anos.  

VIDAL-NAQUET, Pierre. O Mundo de Homero. Tradução de Jônatas Batista Neto. São Paulo: Companhia das Letras, 2002, p. 117-118.

Sobre a Guerra Civil em El Salvador

sexta-feira, 1 de dezembro de 2023

 

Guerrilheiros da Frente Farabundo Martí de Libertação Nacional (FMLN) em Usulután, El Salvador, em 1983.

Anne van der Bijl (1928-2022), internacionalmente conhecido como Irmão André, foi um missionário neerlandês que fundou a Portas Abertas. Seu ministério teve início em 1955, quando ele começou a contrabandear Bíblias para os países da então Cortina de Ferro. Anos depois, o Irmão André e seus apoiadores expandiram as suas atividades para além do Leste Europeu e da União Soviética, alcançando países do então chamado "Terceiro Mundo", na África, Ásia e América Latina. O testemunho abaixo é relativo à Guerra Civil de El Salvador, travada entre 1979 e 1992. O encontro entre o Irmão André e Alberto, um dos líderes guerrilheiros, ocorreu no início dos anos 1980.

***

Um dos meus encontros mais memoráveis foi com Alberto, o comandante de um grupo de rebeldes que havia tomado totalmente determinada cidade. De boa aparência, extremamente carismático, ele usava uma boina preta, camisa cáqui, calça jeans azul enfiada nas botas militares e uma pistola na coxa. Dois guarda-costas não desgrudavam dele, com metralhadoras calibre cinquenta e bandoleiras trançadas no peito.

Também reparei que Alberto usava dois relógios. "Se um para, ainda tenho o outro para saber as horas", disse. Obviamente era uma pessoa bem treinada e disciplinada.

Primeiro ele nos contou seu passado e sua "juventude perdida", e como ele encontrou nova esperança nos ensinamentos marxistas. Depois do treinamento em Cuba, com direito até a um encontro com Fidel Castro, voltou a seu país com verdadeiro senso de propósito, pois, acreditava ele, a revolução traria justiça à vida em El Salvador. Impressionou-me esse jovem inteligente, e achei que seu zelo revolucionário daria um trecho interessante do vídeo.

- Alberto - disse eu -, gostaria de entrevistá-lo diante das câmeras, mas sob uma condição importante: você precisa falar a verdade. Vou lhe fazer uma pergunta, e quero que você me olhe bem nos olhos e me diga a mais absoluta verdade, de homem para homem. Concorda?

Ele refletiu por um momento e olhou em volta.

- Certo, vou lhe dizer a verdade - disse.

Algo em mim dizia que ele estava sendo sincero.

A equipe ligou o equipamento de filmagem. Então, encarando Alberto, fiz minha primeira pergunta.

- Esta revolução é de vocês ou importada?

Não creio que ele estivesse preparado para pergunta tão direta. O modo como ele me responderia teria importância crucial, e ele sabia disso. Veio um silêncio constrangedor. Ele olhou em torno, talvez para ver quanta gente podia ouvi-lo.

Continuei a encará-lo, e as câmeras continuaram gravando. O homem que um instante antes transpirava tamanha força e confiança, parecia agora bem vulnerável.

Finalmente ele se voltou e me olhou bem nos olhos, como havia prometido, respondendo:

- É importada.

Que tremenda confissão, especialmente para alguém de posto tão elevado na hierarquia da guerrilha. Por alguma razão, quando ele se viu confrontado com uma espécie de prova dos nove, não pôde mentir. Com essas duas palavras, ele revelara a verdadeira essência da revolução. Era fabricada, e estava sendo imposta às pessoas.     

ANDRÉ, Irmão. O Contrabandista de Deus - desafiando os limites da fé: a missão continua além da cortina de ferro. Tradução de Eduardo Pereira E. Ferreira. São Paulo: Missão Portas Abertas, 2020, p. 174-175.

Dia de Ação de Graças - a verdade

quinta-feira, 23 de novembro de 2023

 O primeiro Dia de Ação de Graças, óleo sobre tela de Jean Leon Gerome Ferris (1863-1930). 

A colheita de 1621 não foi abundante, e os colonos não eram trabalhadores tenazes. O ano de 1621 foi de fome e muitos dos colonos eram ladrões preguiçosos. Nos banquetes das colheitas de 1621 e 1622, "todos tiveram a barriga saciada", mas apenas brevemente. A condição prevalecente durante aqueles anos não foi a abundância que a história oficial afirma, mas a fome e a morte. A primeira "Ação de Graças" não foi tanto uma celebração, mas a última refeição dos condenados.

Saiba mais: Mises Brasil.

Descubra seu Perfil Ideológico

terça-feira, 21 de novembro de 2023

 

O jornal Gazeta do Povo elaborou um quiz para facilitar seus leitores a conhecerem seu perfil ideológico. Clique aqui e participe!

Eis os perfis: 

- Conservador tradicional. À moda de Edmund Burke, está mais preocupado com a preservação de uma estrutura social estável do que com o livre mercado ou a liberdade irrestrita de expressão. Sim, ele defende o respeito à propriedade privada, mas não necessariamente acredita que privatizar estatais é uma regra a ser seguida em todos os casos. Para o conservador tradicional, tudo depende da tradição e do bom uso da prudência. Conservador contemporâneo.

- Conservador contemporâneo. À moda de Ronald Reagan, defende mais intensamente o capitalismo, bem como a liberdade individual. No Brasil, muitos conservadores contemporâneos não tratam como prioridade a preservação da cultura tradicional brasileira. Sem rejeitar a importância da tradição, o conservador é mais individualista.

- Liberal clássico. Quer maximizar a liberdade econômica e as liberdades civis, ao mesmo tempo em que vê com certa desconfiança a influência da religião na política. É possível, dentro dessa categoria, defender a legalização das drogas - algo que os conservadores sequer cogitam.

- Libertário. É uma versão mais intensa do liberal clássico. O cidadão pode adquirir armamento pesado para a própria defesa? A imigração deve ser livre? Posso dirigir o carro sem cinto de segurança? Sim, sim e sim. Desde que terceiros não sejam fisicamente agredidos ou ameaçados, vale tudo. Ah, sim: imposto é roubo.

- Social-democrata. É o tipo que se define sobretudo pela defesa de um estado ativo na redistribuição de renda. Essa corrente nasceu de uma tentativa de domesticar o socialismo e torná-lo compatível com regimes democráticos. Os social-democratas não têm exatamente um consenso sobre temas morais, embora, na prática, boa parte deles pareça ter abraçado a agenda LGBT e a defesa do aborto legal. 

- Socialistas (e comunistas). Querem mudar radicalmente a estrutura econômica do país. Com isso, eles esperam também mudar a estrutura política. De forma geral, eles têm aversão ao capitalismo, à moralidade cristã e ao patriotismo. A própria democracia é, para ele, uma ferramenta de dominação que precisa ser substituída por um mundo melhor. Leia-se: precisa ser removida pela força das armas e substituída (temporariamente) pela ditadura do proletariado. Na União Soviética, o "temporariamente" durou 82 anos.

- Nacionalista antiliberal. Quer um Estado forte na economia mas rejeita as soluções dos socialistas e social-democratas para os demais temas. Ele defende veementemente o país e não abraça as bandeiras progressistas quanto às drogas e o aborto, por exemplo. Mas, quando o assunto é a economia, caminha junto com os sindicalistas do PT.

- Centrista. É alguém que não se alinha claramente com qualquer das ideologias acima. Ao combinar elementos de várias correntes, ele não chega a formar um conjunto claramente distinguível do ponto de vista ideológico.

A Educação Profissional no Brasil

segunda-feira, 13 de novembro de 2023

 

            Escola de Aprendizes Artífices em São Paulo. Fonte: CPDOC/FGV.

Os primórdios da educação profissional no Brasil, de um ponto de vista mais formal, se remontam ao início do século XX. Nesse sentido, precisamos considerar o governo Afonso Pena (15/11/1906 a 14/06/1909) como o primeiro a dar uma nova orientação à política educacional no país. Nas mensagens ao Congresso Nacional em 1906 e 1907, o presidente reiterou a intenção do seu governo em apoiar as iniciativas dos poderes locais interessados em criar instituições voltadas ao ensino profissional. O objetivo seria propiciar o desenvolvimento industrial graças à qualificação da mão de obra. Diferentemente dos governos anteriores, Afonso Pena insistiu numa relação entre o oferecimento de ensino técnico e profissional e o progresso econômico da nação.

Em 1908, Afonso Pena novamente apelou ao Congresso para agilizar a aprovação de sua pretendida reforma da Instrução Pública. Segundo ele, tal reforma seria fundamental para a modernização de um país que aspirava um lugar entre as nações civilizadas. Efetivamente, em 1906 o Congresso Nacional aprovou a Proposição 195, que autorizava o presidente da República a repassar recursos financeiros do orçamento da União para a implantação de escolas federais de ensino profissional nos estados. Nesse sentido, seu governo disponibilizou o aporte de recursos financeiros para esse projeto educacional que, no entanto, não avançou no Congresso Nacional. Com a sua morte, em 1909, o seu sucessor, Nilo Peçanha, pôde desenvolver a educação profissional no Brasil.

Nilo nasceu em Campos, RJ, sendo filho de um padeiro (Sebastião de Sousa Peçanha) e de Joaquina Anália de Sá Freire Peçanha, uma negra. Por ser mulato, Nilo sofreu com sátiras preconceituosas, principalmente após assumir a presidência do Estado do rio de Janeiro, em 1903, e, mais ainda, quando se tornou presidente da República, em 1909. Até a filiação maçônica de Nilo foi lembrada para apresentá-lo como uma espécie de inimigo da fé católica majoritária da população brasileira.

Em 23 de setembro de 1909, o presidente Nilo Peçanha assinou o Decreto 7.566, criando inicialmente 19 "Escolas de Aprendizes Artífices". As instituições estariam subordinadas ao Ministério dos Negócios da Agricultura, Indústria e Comércio. Esse é considerado o grande marco da origem da educação profissional no Brasil, a qual tem o presidente Nilo Peçanha como o seu patrono.   

CARVALHO, Marcelo Augusto Monteiro de. Nilo Peçanha e o sistema federal de escolas de aprendizes artífices (1909 a 1930). Tese de doutorado. São Paulo, 2017, p. 52 e ss.

As Invasões Bárbaras dos Sécs. IX-X

sexta-feira, 3 de novembro de 2023

Após 896, os ataques navais dos escandinavos e dos muçulmanos ocidentais foram imitados, por terra, pelos magiares com suas incursões de cavalaria. (Os nômades magiares eurasianos, empurrados em direção ao oeste pelos pechenegues, ainda mais ferozes, haviam ocupado, em 896, o vazio criado pelo extermínio dos ávaros no enclave de uma região de estepe no país que é hoje a Hungria.)

As invasões bárbaras dos séculos IX e X foram talvez mais atrozes para a Cristandade Ocidental do que os séculos V e VI. A tentativa de Carlos Magno de reerguer o Império Romano Ocidental parecia ter sido contraproducente. No entanto, mais uma vez uma sociedade europeia ocidental, que parecia rebaixada quando vista de dentro, parecia fascinante aos bárbaros que haviam caído sobre ela. Em 911, Carlos o Simples, o Rei carolíngio da Frância Ocidental, concordou, forçado, com a instalação permanente de um bando de vagabundos do mar escandinavo onde é hoje a Normandia, com a condição de que eles se convertessem ao cristianismo. Tornou-se então evidente que o trabalho cultural de Carlos Magno havia sido mais importante que a construção do seu Império. Os normandos foram cativados pela civilização em cujo domínio haviam forçado a entrada. Adotaram entusiasticamente a língua, as maneiras e os costumes, assim como a religião, do pedaço das terras carolíngias que haviam tornado sua propriedade.  

TOYNBEE, Arnold. A Humanidade e a Mãe-Terra - Uma História Narrativa do Mundo. Tradução de Helena Maria C. M. Pereira e Alzira S. da Rocha. Rio de Janeiro: Guanabara, 1987, p. 496-497.

Carta ao Mitis

quarta-feira, 1 de novembro de 2023

Querido Mitis,

Não sabemos quando, onde ou como você veio ao mundo. Gostaria de saber como foi o seu nascimento, seus primeiros meses... Seus lindos olhos azuis contemplaram bondade, amor e compaixão?

Certo é que, tão cedo, você muito sofreu. Eles te machucaram, não foi? A agressão covarde pode não ter sido flagrada, mas foi revelada posteriormente por um Raio-X.

A lei não te protegeu, mas - e note bem, quanta ironia - a marquise do Fórum Criminal Desembargador José Mathias de Almeida Neto serviu-lhe de abrigo. Quem te fez mal está impune perante os homens, mas não pode escapar do tribunal do Altíssimo.

Você aqueceu os nossos corações naquela fria noite de 17 de outubro. Nós te resgatamos, mesmo sem saber qual seria a reação do Tito, o nosso outro gato. Você ganhou proteção, carinho e um nome - Mitis (do latim, "manso").

Tal qual Mefibosete, o neto do rei Saul, você mancava. Porém, nunca perdeu a dignidade de um príncipe. Sua agilidade, mesmo contando apenas com os movimentos das patas dianteiras, era admirável e encantadora.

Em nosso reino de amor, você era cuidado diretamente pela rainha do lar. Três vezes ao dia - pelo menos - ela trocava as suas fraldas. Para que você ficasse sempre asseado, ela te limpava, inclusive, em seu horário de almoço; chegou mesmo a abrir mão da própria refeição, em algumas ocasiões, para retornar ao trabalho sem atrasos.

Como estávamos felizes! O Tito te acolheu, e vocês se tornaram bons amigos. Na esperança de poder vê-lo andar sem se arrastar, decidimos levá-lo a um veterinário ortopedista. Após solicitar alguns exames, ele constatou que você poderia ser operado. Hoje, em plena cirurgia de sua coluna vertebral, você sucumbiu a uma parada cardíaca.

Lutamos por ti, e você também batalhou pela vida, mas o seu descanso chegou. Ah, se pudesse sussurrar aos seus ouvidos algumas palavras antes da sua partida... pediria para perdoar os seus algozes e, finalmente, declararia que o amamos do fundo de nossos corações.

Saudades eternas, querido Mitis. Os mansos herdarão a Terra, e a sua memória seguirá viva entre nós.

Com amor,

Gi, Rapha e Tito.    

A Tradição na Igreja Primitiva

sexta-feira, 27 de outubro de 2023

 

A palavra "tradição" (do grego, paradosis) não traz, em si, uma conotação negativa. Paradosis significa "aquilo que é legado". Paulo admoestou os tessalonicenses a guardar "as tradições que vos foram ensinadas" (2Ts 2:15) e os advertiu a não ter comunhão com quem não andasse segundo a tradição apostólica (3:6). As "tradições" que Paulo recomendava eram os seus próprios ensinos verbais, mediante os quais os tessalonicenses deviam testar qualquer mensagem que supostamente viesse dele, usando também as cartas que, de fato, eram de sua autoria. Entretanto, há diversos alertas contra as tradições nos escritos de Paulo (Cl 2:8), Pedro (1 Pe 1:18) e, principalmente, por Jesus de Nazaré (Mt 15:2 e 13; Jo 5:39). Paulo entendia que as Escrituras eram suficientes para a salvação e para a edificação do cristão (2Tm 3:15-17). João fez uma forte advertência a qualquer um que eliminasse ou acrescentasse qualquer coisa ao livro do Apocalipse (Ap 22:18, 19).

O uso que os judeus fizeram da Bíblia ao se oporem ao cristianismo, bem como aqueles considerados falsos profetas, hereges e gnósticos, enfraqueceu um pouco a fé dos cristãos na autoridade das Escrituras. Já no início do séc. III, Tertuliano sustentou que as Escrituras não são suficientes para enfrentar os ataques dos hereges (Prescrição contra os hereges, 14, 19). Irineu, bispo da Gália por volta de 185 d.C., já havia lidado com o mesmo dilema que Tertuliano enfrentaria mais tarde. Irineu registrou a proposição de que a verdade do cristianismo deve ser encontrada nas igrejas fundadas pelos apóstolos, que legaram a verdade aos bispos, os quais Irineu crê que sucederam os apóstolos. Ele defendia que essa verdade "legada" era a tradição, e insistia que ela devia ser uma norma da verdade, já que os hereges estavam usando a Bíblia (Contra Heresias, iii.1-4). Porém, a mais direta reivindicação sobre a autoridade da tradição foi feita por Tertuliano, em seu ensaio De Corona (3,4).

Assim, no início do séc. III, afirma-se que a tradição deve ser aceita como autoridade para certas práticas seguidas na igreja e, para as quais, não há autoridade bíblica. Então, dizia-se que tais práticas eram corretas porque a igreja as estava seguindo. Depois se defende a autoridade da tradição porque é por essa autoridade que a igreja as está seguindo. Consequentemente, nos séculos seguintes, uma profusão de ritos, práticas e crenças sem qualquer fundamento escriturístico foi incorporado à Cristandade, muitos deles de origem claramente pagã.    

Bibliografia consultada: Comentário Bíblico Adventista do Sétimo Dia. Tradução de Cynthia Cortes [et. al.]. Rio de Janeiro: Record, 2011, vol. 6, p. 50-53. 

Onésimo, escravo nos tempos de Roma

segunda-feira, 23 de outubro de 2023

 

Pros Philêmona ("Para Filemon") foi escrita pelo apóstolo Paulo (v. 1), e quanto a isso praticamente não há discussão entre os eruditos. A epístola é uma carta pessoal de Paulo, escrita enquanto estava preso em Roma. O destinatário é um cristão chamado Filemon, habitante de Colossos. A mensagem foi enviada pelo amigo de Paulo, Tíquico, e foi motivada por uma crise na vida de um dos conversos de Paulo. Onésimo, escravo de Filemon, havia fugido, levando consigo um pouco de dinheiro ou bens de seu senhor (v. 18). Posteriormente, ele foi para Roma, como faziam muitos escravos, com a expectativa de se ocultar nas vastas multidões daquela cidade. Enquanto estava lá, Onésimo conheceu Paulo. É possível que, enquanto viveu em Roma, ele absorveu o suficiente da doutrina cristã para ter a consciência perturbada. Em busca de orientação espiritual, ele buscou a Paulo; é interessante que, por sua vez, Paulo já havia sido um convidado na casa de Filemon. 

Qualquer que seja a razão, Onésimo encontrou pronta recepção e foi inspirado a servir dedicadamente ao idoso apóstolo. Sua consciência e sua vontade o prepararam para seguir o caminho do dever a fim de se redimir dos erros do passado, voltando mais uma vez a seu antigo senhor. Onésimo não esperou para ver que resposta seu senhor daria à carta de Paulo. Em vez disso, ele partiu com Tíquico, mensageiro de Paulo. Não sabemos qual recepção ele teve, mas é possível supor que Filemon tenha sido tocado pelas ternas palavras do apóstolo Paulo. Onésimo deveria ser recebido como um "irmão amado" (v. 16).

A epístola a Filemon precisa ser compreendida no contexto da escravidão, tal como existia no Império Romano. Os escravos eram parte reconhecida da estrutura social e eram considerados membros da família de seu senhor. Entre 146 a.C. e 235 d.C., diz-se que a proporção de escravos para pessoas livres teria sido de três por um. Plínio diz que, no tempo de Augusto, um liberto chamado Cecílio mantinha 4.116 escravos. Saiba mais no post A Escravidão em Roma.

Com uma massa escravizada tão numerosa, a elite dominante se via no dever de promulgar leis severas para evitar fuga ou revolta. Muitas vezes, a punição pela fuga era a morte, por vezes, por crucificação, ou por ser atirado às lampreias vorazes em um aquário. Por outro lado, alguns proprietários de escravos eram mais benevolentes do que outros, e a lei previa a alforria ou liberação de várias maneiras. Todavia, a menos que a alforria fosse decretada por lei, e não por um particular, o liberto era obrigado a permanecer servindo ao senhor e a executar as obrigações impostas a ele no momento da alforria. Na sociedade romana, era possível aos libertos ascender de forma constante a posições de influência e, até mesmo, de autoridade cívica.  

Bibliografia consultada:

Comentário Bíblico Adventista do Sétimo Dia. Tatuí, São Paulo: Casa Publicadora Brasileira, 2011, vol. 7, p. 401-402.

A URSS e o Terrorismo Islâmico

segunda-feira, 9 de outubro de 2023

 

Origens do Culto à Deusa-Mãe

sexta-feira, 6 de outubro de 2023

 

Deusa-Mãe, Rajastão, Índia, período Gupta, séculos V-VI.

Dentre essas "imagens primordiais" religiosas comuns, provavelmente a mais antiga e certamente a mais poderosa foi a da Mãe. É ela o tema das mais antigas representações visuais da forma humana; e dado que, nessa imagem, a maternidade não é vista como sendo incompatível com a virgindade, essa imagem materna deve ter tomado forma antes da descoberta da paternidade - isto é, antes de se reconhecer que uma mulher não pode engravidar sem ter tido relações sexuais com um homem. Deve-se ter reconhecido, desde o despertar da percepção consciente, que a maternidade implicava o nascimento de uma criança, mas o reconhecimento de que a Mãe obscurecia o filho, e o pai ou era não-existente ou, no máximo, era uma figura nebulosa. A potência da Mãe é imensa para qualquer homem a ela associado e, consequentemente, alguns deuses masculinos dominadores preferiram permanecer no celibato. Aton, Assur, Javé e Mitras são exemplo disso.   

TOYNBEE, Arnold. A Humanidade e a Mãe-Terra - Uma História Narrativa do Mundo. Tradução de Helena Maria C. M. Pereira e Alzira S. da Rocha. Rio de Janeiro: Guanabara, 1987, p. 364.

Testemunho sobre o horror da Guerra

domingo, 1 de outubro de 2023

 

O Cemitério, Étaples, 1919, obra de John Lavery (1856-1941).

"Dia e noite não fazemos outra coisa que não seja recolher os feridos e os mortos. Quando vemos os mortos, com os membros esmagados e mutilados, não podemos deixar de sentir repulsa pela guerra. É fácil falar de glória e heroísmo quando se está longe dela. Mas, aqui, na presença dos mortos e mutilados e torturados, só podemos sentir o horror e a perversidade da guerra. É de fato uma safra funesta, impregnada de orgulho e arrogância e sede de poder."

Donald Hankey (1884-1916), combatente britânico na Primeira Guerra Mundial   

Citado em: GILBERT, Martin. História do Século XX. Tradução de Francisco Agarez. 3ª edição. Alfragide, Portugal: Dom Quixote, 2014.

Dia Nacional da EPT

sábado, 23 de setembro de 2023

 


A Lei nº 14.139, de 16 de abril de 2021, criou o "Dia Nacional da Educação Profissional e Tecnológica" (EPT), a ser comemorado no dia 23 de setembro. A data escolhida marca a assinatura do Decreto 7.566, de 1909, no governo do presidente Nilo Peçanha, Patrono da Educação Profissional e Tecnológica no Brasil. 

Mito sobre a formação do Estado

quinta-feira, 21 de setembro de 2023

Quando examinadas em detalhe, as datas históricas ou arqueológicas não conseguem sustentar a ideia de que a irrigação foi a força motriz da formação do Estado. Na Mesopotâmia, na China setentrional, no México e em Madagascar, os sistemas de irrigação em pequena escala já existiam antes do surgimento dos Estados. A construção dos grandes sistemas de irrigação não acompanhou o surgimento dos Estados, e só muito mais tarde eles apareceram em cada uma dessas áreas. Na maioria dos Estados formados na região dos maias na Mesoamérica e nos Andes, os sistemas de irrigação sempre foram pequenos, num tamanho que as comunidades locais podiam construir e manter. Assim, mesmo nas áreas onde os sistemas complexos de controle hidráulico surgiram, eles eram uma consequência secundária dos Estados, que devem ter-se formado por outras razões.  

DIAMOND, Jared. Armas, Germes e Aço - os destinos das sociedades humanas. Tradução de Cynthia Cortes [et. al.]. Rio de Janeiro: Record, 2005, p. 283-284.

Pérola de Orson S. Card

segunda-feira, 18 de setembro de 2023

 

Pantheon de Agripa, em Roma

quarta-feira, 13 de setembro de 2023

 

Reconstituição do Panteão de Roma.

O Pantheon de Agripa foi construído em 126 d.C., durante o principado de Adriano. Recebe esse nome porque substitui o Panteão erigido no ano 27 a.C., por Agripa, amigo do imperador Otávio Augusto. Esse primeiro Panteão foi destruído num incêndio, no ano 80 d.C. No início do século VII, o edifício foi entregue ao Papa Bonifácio IV, que o transformou em igreja, razão pela qual, até hoje, o Panteão é considerado a obra arquitetônica mais bem preservada da Roma antiga.  

Bibliografia indicada: QUENEMOEN, Caroline K. & ULRICH, Roger B. (ed.). A Companion to Roman Architecture. Chichester: Blackwell Publishing, 2014.

Origem da Produção de Alimentos

domingo, 10 de setembro de 2023

 

A Tabela 5.1 sintetiza, para essas e outras áreas de domesticação local, alguns dos animais e culturas mais conhecidos e as datas iniciais da domesticação. Entre as nove áreas prováveis de produção independente de alimentos no início da evolução dessa prática, o sudoeste da Ásia tem as datas precisas mais antigas, tanto para a domesticação das plantas (por volta de 8500 a.C.), quanto de animais (por volta de 8000 a.C.); e também tem, de longe, o maior número de datas obtidas por radiocarbono relativas ao início da produção de alimentos. As datas da China são quase tão antigas, enquanto no leste dos Estados Unidos a atividade só apareceu cerca de 6000 anos depois. Nas outras seis áreas, a mais antiga não compete com as do sudoeste da Ásia, mas muito poucos sítios foram datados com precisão nessas seis áreas para que pudéssemos ter certeza de que realmente começaram antes e, neste caso, quanto tempo antes.  

DIAMOND, Jared. Armas, Germes e Aço - os destinos das sociedades humanas. Tradução de Cynthia Cortes [et. al.]. Rio de Janeiro: Record, 2005, p. 97.

O Massacre dos Morioris

sexta-feira, 8 de setembro de 2023

 

           Alguns dos últimos representantes do povo moriori. Foto de 1910.

Nas Ilhas Chatam, 800 quilômetros a leste da Nova Zelândia, séculos de independência resultaram num fim brutal para o povo moriori, em dezembro de 1835. Em 19 de dezembro desse ano, um navio que levava 500 maoris carregados de armas, porretes e machados chegou, seguido por outro, em 5 de dezembro, com mais 400 maoris. Grupos de maoris começaram a percorrer as colônias morioris, anunciando que estes passavam a ser seus escravos e que matariam os que se opusessem. Uma resistência organizada dos morioris poderia então ter derrotado os maoris, pois tinham pelo menos o dobro do número de homens. Entretanto, os morioris tradicionalmente resolviam suas brigas de forma pacífica e decidiram, reunidos em conselho, que não lutariam, preferindo propor paz, amizade e divisão de recursos.  

Antes que os morioris pudessem apresentar essa proposta, os maoris atacaram em massa. Ao longo dos dias seguintes, mataram centenas de morioris, cozinharam e comeram muitos de seus corpos, escravizando os demais, matando a maioria deles nos anos seguintes, de acordo com seu capricho. Um sobrevivente moriori recorda: "[Os maoris] começaram a nos matar como ovelhas... [Nós] ficamos em qualquer outro lugar para escapar do inimigo. Pouco adiantou; fomos descobertos e mortos - homens, mulheres e crianças, indiscriminadamente." Um conquistador maori explicou: "Tomamos posse... de acordo com nosso costume e pegamos todo o mundo. Ninguém escapou. Alguns fugiram e foram mortos, outros foram mortos - mas o que tem isso? Foi tudo de acordo com nossos costumes."

O resultado brutal desse choque entre moriori e maori poderia ser facilmente previsto. Os morioris constituíam um grupo pequeno de caçadores-coletores que viviam isolados, dispondo apenas das mais rudimentares tecnologias e armas, totalmente inexperientes em matéria de guerra e sem qualquer tipo de liderança ou organização. Os invasores maoris (procedentes do norte da ilha de Nova Zelândia) faziam parte de uma população de numerosos agricultores cronicamente envolvidos em guerras ferozes, equipados com tecnologia e armas mais avançadas, e que agiam sob o comando de uma liderança forte. É claro que, quando os dois grupos finalmente entraram em contato, foram os maoris que chacinaram os morioris, e não o contrário.  

DIAMOND, Jared. Armas, Germes e Aço - os destinos das sociedades humanas. Tradução de Cynthia Cortes [et. al.]. Rio de Janeiro: Record, 2005, p. 53-54.

Culto à Personalidade: Hugo Chávez

domingo, 3 de setembro de 2023

 

Marxismo, Doutrina Mística e Dogmática

quarta-feira, 30 de agosto de 2023

 

(...) O marxismo é uma doutrina mística e dogmática. Na prática, apresenta certas características dos dogmas religiosos, principalmente quando se propõe a salvar a humanidade e estabelecer o paraíso na Terra. Diferencia-se em essência das religiões, por negar a existência e a interferência de qualquer "poder divino" na vida pessoal do homem, e na sociedade por ele construída. Na atuação prática, o comportamento do verdadeiro cristão é também antípoda do comportamento marxista. O crente cristão prega e pratica os princípios que se encontram nos Evangelhos - especialmente no Sermão da Montanha - , com ênfase às mensagens de amor: amor a Deus, à humanidade, à família e ao próximo. O crente marxista militante prega a luta de classe, a marginalização e a eliminação sumária daqueles que opõem à implantação do regime comunista materialista e ateu em substituição ao regime social liberal cristão. Ele abomina todas as religiões, por considerá-las "o ópio do povo", usado pela burguesia para dominar e explorar a classe dos trabalhadores. Para atingir seus objetivos, o marxismo procura levar o proletariado - principalmente do Terceiro Mundo - à miséria total (quanto pior melhor), porque somente assim tal miséria coincide com o lado oposto e extremo da contradição capitalista, levando-o à sua destruição final.   

VILLAVERDE, Léo. A Natureza Mística do Marxismo. São Paulo: Paz, 1986, p. 10-11.