“Quem não é capaz de sonhar com a história diante dos documentos não é historiador.” F. Braudel

“Quem não é capaz de sonhar com a história diante dos documentos não é historiador.” F. Braudel
Villa Borghese, Roma, Itália.

Não Nos Representam

segunda-feira, 30 de novembro de 2020

Se for rompido o vínculo subjetivo entre o que os cidadãos pensam e querem e as ações daqueles a quem elegemos e pagamos, produz-se o que denominamos crise de legitimidade política; a saber, o sentimento majoritário de que os atores do sistema político não nos representam. Em teoria, esse desajuste se autocorrige na democracia liberal com a pluralidade de opções e as eleições periódicas para escolher entre essas opções. Na prática, a escolha se limita àquelas opções que já estão enraizadas nas instituições e nos interesses criados na sociedade, com obstáculos de todo tipo aos que tentam acessar uma corriola bem delimitada. E, pior, os atores políticos fundamentais, ou seja, os partidos, podem diferir em políticas, mas concordam em manter o monopólio do poder dentro de um quadro de possibilidades preestabelecidos por eles mesmos. A política se profissionaliza, e os políticos se tornam um grupo social que defende seus interesses comuns acima dos interesses daqueles que eles dizem representar: forma-se uma classe política, que, com honrosas exceções, transcende ideologias e cuida de seu oligopólio. Além disso, os partidos, como tais, experimentam um processo de burocratização interna, predito por Robert Michels desde a década de 1920, limitando a renovação à competição entre seus líderes e afastando-se do controle e da decisão de seus militantes. E mais, uma vez realizado o ato da eleição, dominado pelo marketing eleitoral e pelas estratégias de comunicação, com escasso debate e pouca participação de militantes e eleitores, o sistema funciona autonomamente em relação aos cidadãos. Tão somente tomando o pulso da opinião, nunca vinculante, através de pesquisas cujo desenho é controlado pelos que as encomendam. Mesmo assim, os cidadãos votam, elegem e até se mobilizam e se entusiasmam por aqueles em que depositam esperanças, mudando volta e meia quando a esperança supera o medo de mudança, que é a tática emocional básica na manutenção do poder político. Mas a recorrente frustração dessas esperanças vai erodindo a legitimidade, ao mesmo tempo que a resignação vai sendo substituída pela indignação quando surge o insuportável.  

CASTELLS, Manuel. Ruptura - a Crise de Democracia Liberal. Tradução de Joana Angélica D'Avila Melo. Rio de Janeiro: Zahar, 2018.

Pérola de Sêneca

sexta-feira, 27 de novembro de 2020

"Pratica moral para poderes ser feliz, e não te importes que fulano ou sicrano te ache estúpido. Deixa que os outros te ofendam e te injuriem; desde que possuas a virtude, em nada serás lesado por isso. Se queres ser feliz, se queres ser um homem de bem e digno de confiança, não te importes que os outros te desprezem."

SÊNECA, Cartas a Lucílio, 71.7.

Ecocídio na União Soviética

terça-feira, 24 de novembro de 2020

 

No dia 26 de abril de 1986, ocorreu a explosão de um reator de Chernobil, na então Ucrânia soviética. Essa fotografia aérea mostra os danos na usina.

Murray Feshbach e Alfred Friendly observam em seu importante livro Ecocide in the USSR que a poluição foi parcialmente responsável pelo aumento da mortalidade infantil na União Soviética até níveis só encontrados em países do Terceiro Mundo e em algumas cidades americanas. Os autores concluíram que "embora os vínculos entre a agressão ambiental e a doença permaneçam inevitavelmente mais presumidas que provadas, existe pouca dúvida a respeito do volume da poluição. Poucas áreas industrializadas da União Soviética estão livres de risco ambiental, e algum tipo grave de condição ecológica prevalece em 16 por cento do território do país, onde vive um quinto da população."

O que Feshbach e Friendly documentam em termos de poluição ambiental foi um legado da atitude bolchevique com relação à natureza. Neste, e em muitos outros aspectos, os bolcheviques seguiram fielmente a Marx. Na melhor das hipóteses, eles viam a natureza como um recurso a ser explorado para os objetivos do homem, e, na pior, como um inimigo a ser conquistado. A atitude ocidental semelhante à de Prometeus diante do mundo natural serviu de base às políticas soviéticas durante a vida do regime. Foi também uma das causas de seu colapso.

A lenta reação da liderança soviética ao desastre de Chernobil foi o gatilho para os primeiros movimentos políticos populares na União Soviética. Esses movimentos ambientalistas mobilizaram amplas coalizões em torno da oposição a grandes projetos de construção de barragens na Sibéria. Junto com os movimentos nacionalistas no "exterior próximo" da União Soviética, foram estes movimentos ecológicos de massa, muito mais que as divergências intelectuais, que se constituíram no catalisador interno para o colapso soviético.   

Adaptado de GRAY, John. Falso Amanhecer - os equívocos do capitalismo global. Tradução de Max Altman. Rio de Janeiro / São Paulo: Record, 1999, p. 194-195.

As Incríveis Estradas Romanas

segunda-feira, 23 de novembro de 2020

                                

As escavações arqueológicas revelam que as estradas romanas, construídas dois mil anos atrás, são superiores à maioria das estradas atuais. Cortes transversais, como o revelado acima, mostram que os construtores - soldados, normalmente - abriam valas e, a seguir, as cobriam com sucessivas camadas de cascalho e pedras de diferentes tamanhos. A ilustração abaixo é mais esclarecedora:



Assim é fácil entender o porquê de muitas estradas romanas serem usadas até hoje, enquanto certas rodovias brasileiras praticamente foram consumidas pelos buracos em poucos anos...

A Secularização na Rússia e na Turquia

domingo, 22 de novembro de 2020

 
Uma mulher turca, sem o véu e com roupas ocidentais, logo após as reformas de Kemal Atatürk. Ao fundo, a Hagia Sophia.

"Para muitos reformistas, o rompimento com o modelo tradicional tinha que ser total. Geralmente começava com um ataque ao modo como as pessoas se vestiam e se barbeavam. Pedro, o Grande, obrigou os boyars, ou aristocratas rurais, a raspar a barba e os sacerdotes a proferir sermões sobre as virtudes da razão. Mas isso era pouco quando comparado a Kemal Atatürk, que jurou em 1917 que, se algum dia chegasse ao poder, mudaria de um só golpe a vida social na Turquia. E, em 1923, deu início a seu projeto. A indumentária oriental, geralmente portadora de um significado religioso, foi abolida. As mulheres não mais podiam usar véu e, como os líderes japoneses da Era Meiji, ele incentivou bailes sofisticados e outras formas de entretenimento à moda ocidental. Como os japoneses, acreditava que o estilo ocidental era essencial para se tornar uma nação moderna.

Se roupas e penteados são sinais superficiais de mudança, a demolição dos 'muros monásticos', para usar outra metáfora de Weber, era considerada por muitos, inclusive Karl Marx, como um ingrediente essencial para a modernização. Novamente, Atatürk oferece-nos um bom exemplo. Alegando que 'a ciência é o mais confortável guia da vida', ele implementou um sistema de educação secular e fechou todas as instituições que tinham por base a lei canônica muçulmana. No governo de Atatürk, o secularismo tornou-se uma outra forma de fé dogmática."    

BURUMA, Ian & MARGALIT, Avishai. Ocidentalismo - O Ocidente aos olhos de seus inimigos. Tradução de Sérgio Lopes. Rio de Janeiro: Jorge Zahar Ed., 2006, p. 112-113.

Sobre o Ocidentalismo

sexta-feira, 20 de novembro de 2020

Pintura mural antiamericana em Teerã, capital do Irã.

"O ocidentalismo pode ser visto como a expressão de um amargo ressentimento contra uma agressiva ostentação de superioridade por parte do Ocidente, com base na alegada superioridade da razão. Ainda mais corrosivo que o imperialismo militar é o imperialismo da mente imposto pela difusão da crença ocidental no cientificismo: a fé de que a ciência é o único meio de obtenção do conhecimento.

O fato de o cientificismo ter sido avidamente incorporado por reformadores radicais no mundo não-ocidental apenas aguça a hostilidade dos nativistas. Pois o inimigo imediato dos ocidentalistas, como vimos o exemplo dos islamistas revolucionários, nem sempre é o Ocidente propriamente dito, mas principalmente os ocidentalizados em suas próprias sociedades. Os modernizadores chineses do início do século XX exigiam reformas em nome da ciências e da democracia. Muitos eram iconoclastas extremistas que viam a total ocidentalização como a única solução para a China. Seus adversários intelectuais frequentemente invocavam o espírito chinês como um antídoto contra essa doutrina."    

BURUMA, Ian & MARGALIT, Avishai. Ocidentalismo - O Ocidente aos olhos de seus inimigos. Tradução de Sérgio Lopes. Rio de Janeiro: Jorge Zahar Ed., 2006, p. 95-96.

«Carlos Magno», de Jean Favier

quinta-feira, 19 de novembro de 2020

 

PDF indisponível.

Recomendo: A Corte de Carlos Magno

Um Perfil dos Tokkotai

quarta-feira, 18 de novembro de 2020

"O mais terrível e certamente o mais conhecido símbolo de sacrifício humano nos conflitos armados do século XX é o piloto kamikaze, arremessando-se para a morte a quase mil quilômetros por hora sobre o convés de uma embarcação inimiga. Muitos não atingiram os alvos, e explodiram ou despedaçaram-se no mar. Uma forma alternativa de morte violenta para os kamikazes, ou Tokkotai (Forças Especiais de Ataque), como os japoneses mais usualmente os denominam, era colocar-se num caixão de aço no formato de um charuto e lançar-se de um submarino como um torpedo-humano. (...)

A maioria dos voluntários Tokkotai (sob variados níveis de pressão) era formada por estudantes provenientes dos departamentos de humanidades das melhores universidades. Estudantes de ciências eram considerados menos descartáveis. As cartas revelam que todos leram muito, frequentemente em pelo menos três línguas. Na filosofia alemã, os autores favoritos eram Nietzsche, Hegel, Fichte e Kant. Na literatura francesa: Gide, Romain Rolland, Balzac, Maupassant. Na alemã: Thomas Mann, Schiller, Goethe, Hesse. Muitos refletiam sobre o suicídio de Sócrates e sobre os escritos de Kierkegaard acerca do desespero. Poucos eram cristãos praticantes e um número surpreendentemente tinha uma visão marxista da política e da economia."    

BURUMA, Ian & MARGALIT, Avishai. Ocidentalismo - O Ocidente aos olhos de seus inimigos. Tradução de Sérgio Lopes. Rio de Janeiro: Jorge Zahar Ed., 2006, p. 63-64. 

«Jesus - A Biografia»

terça-feira, 17 de novembro de 2020

 

PDF indisponível.

Recomendo: O Estilo de Jesus

Materialismo Ocidental x Alma Asiática

sábado, 14 de novembro de 2020

 

O cartunista francês Orens representou a cabeça do czar Nicolau II espetada na ponta da lança de um japonês, após a queda de Port Arthur. Créditos: Visualizing Cultures

"Jamais uma grande nação empreendera transformação tão radical quanto o Japão entre as décadas de 1850 e 1910. O principal slogan da era Meiji (1868-1912) era Brunmei Kaika, ou Civilização e Iluminismo, isto é, civilização ocidental e iluminismo. Tudo o que vinha do Ocidente, da ciência natural ao realismo literário, foi vorazmente absorvido pelos intelectuais japoneses. O vestuário ocidental, a lei constitucional prussiana, as estratégias navais britânicas, a filosofia alemã, o cinema americano, a arquitetura francesa e muito, muito mais foi incorporado e adaptado.

A transformação rendeu frutos generosos. O Japão permaneceu imune à colonização e tornou-se rapidamente uma grande potência, a qual, em 1905, conseguiu derrotar a Rússia numa guerra integralmente moderna. De fato, Tolstoi descreveu a vitória japonesa como um triunfo do materialismo ocidental sobre a alma asiática da Rússia."    

BURUMA, Ian & MARGALIT, Avishai. Ocidentalismo - O Ocidente aos olhos de seus inimigos. Tradução de Sérgio Lopes. Rio de Janeiro: Jorge Zahar Ed., 2006, p. 9-10. 

«Feminismo - Perversão e Subversão»

sexta-feira, 13 de novembro de 2020


Baixe essa obra gratuitamente aqui.

«Desigualdade», de Anthony Atkinson

terça-feira, 10 de novembro de 2020

 

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«Vida para Consumo»

sexta-feira, 6 de novembro de 2020

 

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«O Poder da Identidade»

quarta-feira, 4 de novembro de 2020

 

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«Maquiavel em 90 Minutos»

segunda-feira, 2 de novembro de 2020

 

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Leituras do 4º Trimestre de 2020

domingo, 1 de novembro de 2020

Neste quarto trimestre, fiz as seguintes leituras (post em construção até o fim do trimestre):

BURUMA, Ian & MARGALIT, Avishai. Ocidentalismo - O Ocidente aos olhos de seus inimigos. Tradução de Sérgio Lopes. Rio de Janeiro: Jorge Zahar Ed., 2006.

FAVIER, Jean. Carlos Magno. Tradução de Luciano Machado. São Paulo: Estação Liberdade, 2004.

HARARI, Yuval Noah. 21 Lições para o Século 21. Tradução de Paulo Geiger. São Paulo: Companhia das Letras, 2018.

JESUS, Tomaz Amaral de. Antes que seja tarde. Linhares, ES: SGuerra Design, 2020.

MORIN, Edgar & VIVERET, Patrick. Como viver em tempo de crise? Tradução de Clóvis Marques. Rio de Janeiro: Bertrand Brasil, 2013.

OZ, Amós. Como Curar um Fanático - Israel e Palestina: entre o certo e o certo. Tradução de Paulo Geiger. São Paulo: Companhia das Letras, 2015.

PIPES, Richard. História Concisa da Revolução Russa. Tradução de T. Reis. Rio de Janeiro: BestBolso, 2018.