“Quem não é capaz de sonhar com a história diante dos documentos não é historiador.” F. Braudel

“Quem não é capaz de sonhar com a história diante dos documentos não é historiador.” F. Braudel
Villa Borghese, Roma, Itália.

Os 500 Anos da Reforma Protestante

terça-feira, 31 de outubro de 2017

"A menos que me convençam, por testemunhos das Escrituras ou por uma evidência da razão (pois não acredito apenas no papa e nos concílios: está provado que por vezes demais erraram e se contradisseram), tenho um compromisso com os textos que produzi; minha consciência é cativa das palavras de Deus. Não posso nem quero revogar o que quer que seja, porque agir contra a própria consciência não é seguro nem honesto. Que Deus me ajude, Amen!"

Essa resposta de Martinho Lutero (1483-1546) aos prelados católicos na Dieta de Worms, em 1521, é uma das mais reveladoras do espírito da Reforma Protestante, iniciada há exatos 500 anos quando o mesmo Lutero afixou na porta da catedral de Wittenberg, na atual Alemanha, suas 95 teses de protesto contra as indulgências.

As condições que facilitaram a Reforma se remontam ao século XIV. A espiritualidade dos europeus foi particularmente abalada pela Peste Negra e pelos cismas da Igreja; Guilherme de Ockham (1285-1347) e Marsílio de Pádua (c. 1275 - c. 1342) foram então os principais nomes da oposição teológica à Igreja Católica. Defendiam o conciliarismo, a ideia de que a Igreja é maior do que o papa.

Por outro lado, na chamada "oposição herética", destacaram-se John Wycliffe (c. 1328-1384), precursor da Reforma na Inglaterra, e Jan Huss (1369-1415), pré-reformador na Europa Central. Wycliffe foi perseguido, mas Huss teve a pior sorte: foi traído e queimado na fogueira em 1415, durante o Concílio de Constança.

Ao longo do século XV, a fim de equilibrarem o orçamento pontifício, os papas venderam cada vez mais dispensas e indulgências. Contra o clero, testemunhos imparciais, muitas vezes extraídos de relatórios de visitas episcopais, revelam uma quantidade assombrosa de casos de simonia, nepotismo, acumulação de cargos, imoralidade e desleixo no cumprimento dos deveres.

A crise da Cristandade ficou ainda mais evidente com a difusão do racionalismo e do individualismo pelos humanistas e artistas do Renascimento. Esse foi o terreno efervescente no qual despontou a Reforma Protestante.

Lutero naturalmente se destaca entre os reformadores. Além de teólogo, esse autêntico homem do Renascimento foi também um grande escritor (sua obra em língua inglesa perfaz 55 volumes), orador, músico e observador experimentado da natureza. Contra a tradição, defendeu as Escrituras como única regra de fé e prática; contra a altivez do clero, sustentou a ideia do sacerdócio universal.

O aspecto menos conhecido sobre Lutero é que, no seu íntimo, ele não procurava conduzir, e sim ser guiado por Deus aonde a Providência quisesse levá-lo. O antigo monge não se preocupava em organizar e legislar, rejeitando firmemente ser elevado ao patamar de "papa protestante".

Assim, coube a João Calvino (1509-1564) fornecer às crenças reformadas uma autoridade precisa, uma direção organizada e uma filosofia lógica. A partir de Genebra, a influência do calvinismo se espalhou pela Europa, e mais tarde chegou à América.

Apesar dos conflitos que acompanharam essa revolução que foi a Reforma Protestante, deve-se apreciar o seu legado. Afinal, o impacto do protestantismo foi muito além da religião, mudando sentimentos de nacionalidade, elevando o status do vernáculo, postulando diversidade de opiniões e alterando atitudes em relação ao trabalho e à arte. 

Publicado hoje no jornal A Tribuna (versão impressa e digital).

A Ascensão da Rússia

segunda-feira, 30 de outubro de 2017

Brasão do Império Russo, adotado em 1882. Note, ao centro, a águia bicéfala.

As fundações da Rússia moderna foram estabelecidas de forma sólida ao longo de um século, ou pouco mais: entre a subida ao trono de Ivan III, em 1462, e a de seu neto, Ivan IV, em 1584. As fronteiras do principado de Moscou foram expandidas a tal ponto que abriu-se o caminho para o desenvolvimento do comércio com a Ásia e a Europa ocidental. Isso foi possível em boa medida pela fixação de uma colônia russa na Sibéria, bem como pelo descobrimento da rota Mar Branco-Duína, em 1553 (essa descoberta, pelos ingleses, estimulou as trocas entre a Rússia e a Inglaterra e os Países Baixos). 

Nessa época, a Rússia estava a ficar mais claramente envolvida com a política europeia. Além disso, existia, pelo menos de forma superficial, uma certa semelhança entre a evolução política que estava a ocorrer nos países da Europa ocidental e aquela que transcorria na Rússia. Ali, o poder autocrático do czar - título assumido de forma oficial pela primeira vez em 1547 por Ivan IV - aumentava consideravelmente à custa dos boiardos, a aristocracia hereditária detentora de terras. Concorreu para esse fortalecimento do poder imperial também o apoio de uma nova nobreza, uma classe militar profissional e um funcionalismo civil ligados ao czar pelos favores que este lhes concedia, e da Igreja Ortodoxa. Esta já começava a explorar a herança bizantina, falando de Ivan como o "segundo Constantino" e de Moscou como a "terceira Roma". Assim, a águia bicéfala, versão bizantina do símbolo das legiões romanas, logo apareceu no selo oficial do estado. Contudo, a Rússia parecia bastante com uma "terra de ninguém", e uma viajante ocidental iria encontrar em sua vasta extensão muita coisa bárbara e distante de sua cultura.     

Bibliografia consultada: GREEN, V. H. H. Renascimento e Reforma - a Europa entre 1450 e 1660. Tradução de Cardigos dos Reis. Lisboa: Dom Quixote, 1991, p. 420-421. 

O Império Britânico na História

domingo, 29 de outubro de 2017

Contra a Família

sexta-feira, 27 de outubro de 2017

Cena de família de Adolpho Augusto Pinto (1891); Óleo sobre tela de Almeida Júnior (1850-1899). 
Localização: Pinacoteca do Estado de São Paulo. 

"O casamento burguês é, na realidade, um sistema de esposas em comum e assim, no máximo, a razão pela qual os comunistas podem ser condenados é que eles desejam introduzir, em substituição a algo hipocritamente oculto, uma comunidade de mulheres aberta e legal." ENGELS, Friedrich & MARX, Karl. O Manifesto Comunista. São Paulo: Paz & Terra, 1998, p. 38. 

Na sociedade burguesa do século XIX, o homem era o provedor da família. A mulher, por sua vez, seria a "rainha" do lar. Os marxistas pretendiam abolir o lucro privado, o fundamento desse tipo de família. Desta forma, aniquilariam a própria família burguesa. Na prática, substituiriam a serenidade e a classe da família de Adolpho Augusto Pinto, retratada acima, por ajuntamentos humanos formados pela "comunidade de mulheres aberta e legal". Consegue imaginar quão devastador é o projeto dos comunistas para a sociedade? Não é de se admirar que mesmo Stalin, tirano da União Soviética de 1924 a 1953, não tenha permitido que tal projeto fosse implementado em seu próprio país, embora percebesse quão importante seria para a subversão do Ocidente.   

Como a desintegração da União Soviética e do Socialismo Real no Leste Europeu, as ameaças do comunismo não desapareceram. O marxismo cultural, através da suas várias vertentes (o feminismo, o movimento gay, o lobby pró-aborto e a ideologia de gênero) "bebe" diretamente na fonte: os escritos de Marx e Engels. Sua luta é contra todas as bases da civilização judaico-cristã ocidental - a propriedade privada, a família, o Estado-Nação e a religião. E eles não vão desistir até que alcancem os seus objetivos.

A Loucura e os Cristãos

quinta-feira, 26 de outubro de 2017

Louco olhando através de seus dedos, c. 1500. Jacob Cornelisz van Oostsanen (1470-1533). 
Localização: Davis Museum, Massachusetts, EUA.

"Mas, enfim, que pedem os homens a estes santos, a não ser coisas relacionadas à loucura? (...)

A vida inteira de todos os cristãos transborda de delírios desse tipo a tal ponto que os sacerdotes admitem isso sem grande dificuldade e ainda o alimentam, uma vez que não ignoram quantos lucros costumam advir disso. Se nestas circunstâncias surgisse um odioso sábio e começasse com suas ladainhas de que o certo é que 'não morrerás mal se tiveres vivido bem; redimirás teus pecados, se a uma pequena esmola acrescentares a repulsa pelas más ações, assim como lágrimas, vigílias, preces, jejuns e se mudares todo o teu modo de vida; que tal Santo te ajudará se tentares imitar a vida dele', etc. Se este sábio, digo, se matar de esgoelar estas coisas, e outras do mesmo tipo, olha de quanta felicidade privaria de repente as almas dos mortais e a que confusão os induziria!"

ERASMO DE ROTTERDAM. Elogio da Loucura. Tradução de Elaine C. Sartorelli. São Paulo: Hedra, 2013, XLI, p. 102-103.

O Protesto (Ainda) Não terminou

quarta-feira, 25 de outubro de 2017


No próximo dia 31, a Reforma Protestante completará 500 anos. Assim, a Igreja Adventista do Sétimo Dia de Canelas, em Portugal, transmitirá uma série de mensagens especiais em seu canal no YouTube. Eis os temas, dias e horários das pregações (seguindo o horário oficial de Brasília): 

Sexta-feira, 27 de outubro, a partir das 17h30: As indulgências e Martinho Lutero 

Sábado, 28 de outubro, a partir das 17h30: Sola Scriptura e a Tradição 

Domingo, 29 de outubro, a partir das 18h30: Sola Scriptura e os livros deuterocanônicos (ou apócrifos) 

Segunda-feira, 30 de outubro, a partir das 18h30: Evolução do Protestantismo desde o Século XVI 

Terça-feira, 31 de outubro, a partir das 18h30: O Protesto continua, mas irá terminar! 

Vale a pena ressaltar que o Pr. Paulo Cordeiro é um ministro preparado e experiente, e a importância dessa série de mensagens certamente extrapola os limites denominacionais e até mesmos religiosos. Todos aqueles que pretendem compreender melhor a importância histórica da Reforma Protestante (e em especial, a luterana), apreciarão bastante essas transmissões.   

Data do Exame do Prêmio Clio

terça-feira, 24 de outubro de 2017

Prezados Finalistas do Prêmio Clio, a data de aplicação do exame de seleção do Prêmio Clio foi confirmada: 13 de novembro de 2017. Conto com o vosso empenho! 

Lembro que os dois vencedores (um do Ensino Fundamental e outro do Ensino Médio) serão premiados e receberão medalhas de honra ao mérito em uma capela especial. 

Para se informar a respeito da bibliografia de cada turma, consulte o Edital.

Realizações dos Mestres da Renascença

segunda-feira, 23 de outubro de 2017

 
A Escola de Atenas, 1506-1510, afresco de 5m x 7m de Rafael Sanzio (1483-1520)
Palácio Apostólico, Estado da Cidade do Vaticano.

"As grandes realizações e invenções dos mestres italianos da Renascença causaram profunda impressão nos povos ao norte dos Alpes. (...) Havia três realizações tangíveis dos mestres italianos para as quais podiam apontar. Uma foi a descoberta da perspectiva científica, a segunda o conhecimento de anatomia - e, simultaneamente, a representação perfeita do belo corpo humano - e, em terceiro lugar, o conhecimento das formas clássicas de construção, que pareciam simbolizar, para as pessoas desse período, tudo o que era digno e belo." 

GOMBRICH, E. H. A História da Arte. Tradução de Álvaro Cabral. 16ª edição. Rio de Janeiro: LTC, s/d, p. 341.  

A Reforma e a Arte: Dürer e Holbein

domingo, 22 de outubro de 2017

Combate de São Miguel com o dragão, 1498. Xilogravura, 39,2 X 28,3 cm de Albrecht Dürer (1471-1528).

No início do século XVI, nos países setentrionais, na atual Alemanha, Holanda e Inglaterra, os artistas enfrentavam uma crise muito mais real do que seus colegas na Península Itálica e na Espanha - se estes tinham apenas que lidar com o desafio de como pintar de uma nova e empolgante maneira, ao norte os artistas se defrontavam com a séria questão se a pintura podia e devia existir. Essa foi a grande crise provocada pela Reforma. Para muitos protestantes, a existência de quadros ou estátuas de santos em igrejas era um sinal de idolatria papista. Os mais rigorosos entre os calvinistas censuravam até as decorações alegres nas casas. Assim, restava aos artistas apenas a ilustração de livros e a pintura de retratos, sendo duvidoso que isso fosse suficiente para uma vida decente. 

Albrecht Dürer (1471-1528), o maior expoente da arte renascentista na Europa setentrional, e Hans Holbein, o Moço (1497-1543), o maior pintor alemão de sua geração, tiveram suas obras impregnadas por essa agitação religiosa derivada da Reforma Protestante. 

Dürer era filho de um ilustre mestre ourives húngaro que se instalou na florescente Nuremberg. Além de obter os conhecimentos técnicos da sua difícil arte, Dürer provou "que era dono daquela intuição e imaginação intensas que são o apanágio do grande artista" (Gombrich, s/d: p. 343). Uma série de xilogravuras para ilustrar o Apocalipse de João esteve entre as suas primeiras grandes obras e foi um sucesso imediato. A imaginação de Dürer e o interesse do público alimentaram-se do descontentamento que, no final da Idade Média, se difundira por toda a atual Alemanha contra as instituições da Igreja. Como se sabe, essa insatisfação acabou por eclodir na Reforma de Lutero.   

Holbein era natural de Augsburg, uma próspera cidade mercantil que mantinha estreitas relações de comércio com a Itália; contudo, cedo se transferiu para Basileia, "um famoso centro do Novo Saber" (Gombrich, s/d: p. 374). De uma família de pintores e sendo muito arguto, "o Moço" logo absorveu-se das realizações dos artistas setentrionais e italianos. Assim, o conhecimento pelo qual Dürer lutara com tanto afinco durante toda a vida veio, por assim dizer, de um modo mais natural para Holbein. 

Em 1526, Holbein trocou a Suíça pela Inglaterra, graças à recomendação do grande humanista Erasmo de Rotterdam (1466-1536). Um dos primeiros trabalhos do artista em terras inglesas foi preparar um grande retrato de um outro humanista inglês, sir Thomas More (1478-1535). Se Holbein esperava furtar-se às convulsões provocadas pela Reforma, deve ter-se frustrado com os eventos posteriores. Entretanto, uma vez instalado definitivamente na Inglaterra, Holbein recebeu o título de Pintor da Corte. Ele foi assim agraciado pelo rei Henrique VIII (1509-1547), o mesmo que ordenou o julgamento que condenou à morte por razões de consciência Thomas More, o primeiro benfeitor de Holbein na Inglaterra. 

Como se nota, o contexto do Renascimento e da Reforma foi para lá de complexo. As obras de arte dessa época podem traduzir o espírito de contestação da época, e as biografias dos seus autores revelam o dilema que enfrentaram entre a lealdade à consciência e a necessidade de obter meios para garantir sua sobrevivência. Como o Combate de São Miguel com o dragão, esse período da história da arte permanece ao mesmo tempo rico, efervescente e perturbador. 

Bibliografia consultada: 
CHILVERS, Ian. Dicionário Oxford de Arte. Tradução de Marcelo Brandão Cipolla; revisão técnica de Jorge Lúcio de Campos. São Paulo: Martins Fontes, 1996.
GOMBRICH, E. H. A História da Arte. Tradução de Álvaro Cabral. 16ª edição. Rio de Janeiro: LTC, s/d, p. 342-345 e p. 374-376.    

Os Cuidados das Mulheres Romanas

sábado, 21 de outubro de 2017

Busto de mármore do séc. I de Popeia Sabina. Esposa do imperador Nero, Popeia era famosa em seu tempo por sua grande beleza. 
Museu Nacional de Roma, Palazzo Massimo.  

Os cuidados com a pessoa

"Começo pelos cuidados com a pessoa: são as vinhas cuidadas que dão vinho em abundância; sobre um solo cultivado se anunciam grandes colheitas. A beleza é um presente da divindade; mas quantas podem se orgulhar de sua beleza! A maior parte de vocês não receberam esse presente. Cuidados farão um belo rosto; um belo rosto descuidado se perderá, mesmo sendo parecido com o da deusa Idália. Se as mulheres, outrora, não deram todos os cuidados a seu corpo, é que, antigamente, seus maridos também não tinham todos esses cuidados. Se a túnica que cobria Andrômaca era de pano grosseiro, seria de espantar? Seu esposo era um rude soldado. Vemos a mulher de Ajax se apresentar ricamente vestida a um esposo com escudo feito de sete couros de boi? Outrora reinava uma simplicidade rústica; agora Roma está resplandecente de ouro e possui imensas riquezas do mundo que ela dominou. Vejam o Capitólio de hoje e o de outrora; diríamos que ele era consagrado a um outro Júpiter. (...) Que outros sintam simpatia pelo passado! Eu me felicito por ter vindo ao mundo só agora. Este século me agrada. É porque, hoje em dia, arrancamos da terra o ouro maleável, que trazemos de diversas margens conchas escolhidas, que vemos diminuir as montanhas à força de extrair delas o mármore, e que nossos molhes afastam as vagas azuis? Não, é que nós cuidamos do corpo e nossa época não conhece mais aquela rusticidade que sobreviveu a nossos primeiros antepassados. Mas também não vá carregar nas orelhas essas pedras preciosas, que o negro indiano recolhe na água verde, e não se mostre com vestimentas carregadas de ouro. Este fausto com que você quer me seduzir, muitas vezes nos afugenta." 

Outros conselhos práticos: 

O penteado - "É a singela elegância que nos agrada. Que seu cabelo não esteja despenteado." 
A roupa - "Quando encontramos tantas cores por um preço menor, seria loucura vestir-se com toda sua fortuna! (...) Escolha-as com cuidado! Nem todas combinam com todas as mulheres. O negro fica bem numa pele resplandecente de brancura; (...) o branco fica bem nas morenas (...)." 
Outros meios de ser bela - "Estava prestes a adverti-las de que o forte odor do bode não deve sair de suas axilas, e de que suas pernas não devem ficar ásperas com os pelos grossos." 

Ovídio. A Arte de Amar. Tradução de Dúnia Marinho da Silva. Porto Alegre, RS: L&PM, 2001, Livro III, p. 80-88.

Lutero e as Escrituras

sexta-feira, 20 de outubro de 2017

"A Bíblia de Lutero": a tradução das Escrituras para o idioma alemão feita por Martinho Lutero. Foi impressa pela primeira vez em 1534.

"Para Lutero, a Palavra de Deus era o começo e o fim da sua fé. Atacou os escolásticos porque eles tinham substituído a Palavra de Deus (Gotteswort) pelo ensinamento dos homens (Menschenlehre). Opôs-se analogamente à autoridade do papa porque ela estava em conflito com a Palavra de Deus. Contudo nem sempre é claro o que ele realmente quer significar com esta expressão. Até 1520 identificou-se quase de certeza com as Escrituras de inspiração divina. 'O Evangelho', escreveu ele no seu Comentário sobre (a Epístola aos) Romanos, 'não só é o que escreveram Mateus, Marcos, Lucas e João. É a Palavra do Filho de Deus que se tornou carne, sofreu e foi glorificado.' Mas depois de 1520 chegou à conclusão de que nem todas as Escrituras tinham validade igual. Somente aquelas que pregavam o Evangelho e Cristo podiam ser consideradas como a Palavra Verdadeira. No seu prefácio à tradução para alemão do Novo Testamento, Lutero declara que o Evangelho de S. João, as Epístolas de S. Paulo, especialmente as endereçadas aos Romanos aos Gálatas e aos Efésios, a primeira Epístola de S. João e a primeira de S. Pedro são os 'mais nobres' dos livros porque conduzem o cristão à salvação." 

GREEN, V. H. H. Renascimento e Reforma - a Europa entre 1450 e 1660. Tradução de Cardigos dos Reis. Lisboa: Dom Quixote, 1991, p. 140.

O Outro Lado do Renascimento

quinta-feira, 19 de outubro de 2017

Ilustração do livro francês conhecido como Danse Macabre, impresso antes de 1501. Mais informações em: Lambeth

"A representação da morte como um esqueleto segurando uma ampulheta não é propriamente medieval. Surgiu no século XV, juntamente com a imagem de cadáveres decompostos assombrando os vivos, e se tornou frequente nas primeiras décadas do século XVI. Ou seja, tais imagens mórbidas se popularizaram na mesma época em que Michelangelo realizou as espetaculares pinturas no teto da Capela Sistina, Rafael recriou a claridade serena da Escola de Atenas e Leonardo da Vinci sonhou com protótipos de máquinas voadoras e submarinas. 

Um dos maiores mitos sobre o Renascimento é o de que foi um período otimista, alegre e solar, em oposição às 'trevas' medievais. Longe disso - a percepção aguda da passagem do tempo herdado da tradição clássica, somada a uma consciência histórica particularmente sensível, povoou a literatura e as artes visuais de imagens tristes, mórbidas ou melancólicas, nas quais a morte e a velhice obscurecem a alegria de uma juventude breve demais." 

BERBARA, Maria. Renascer para a morte. In: Revista de História da Biblioteca Nacional. Disponível em HistóriaNoVest.   

Novos Documentos dos Jesuítas

quarta-feira, 18 de outubro de 2017

Entre os manuscritos, encontra-se esse aí, de uma obra do Pe. António Vieira. Como se vê, esá em excelente estado de conservação.

Em 1759, durante o cerco ao Colégio de Jesus, em Coimbra (Portugal), um padre - António Vasconcelos - escondeu cartas e manuscritos. Nas obras de restauro num alar da Sé Nova de Coimbra, em 2016, foram encontrados os embrulhos com esses documentos. Algumas dessas cartas são de autoria de Inácio de Loyola, Francisco Xavier e de João Polanco e são "dos tempos fundacionais" da Companhia de Jesus os jesuítas. Assim, esses textos ajudarão a revelar mais detalhes sobre a história dos jesuítas em Portugal. 

Fonte: Público 

O Burro na Escola

terça-feira, 17 de outubro de 2017

O Burro na Escola (1556), de Pieter Bruegel (1525?-1569). 
Kupferstichkabinett, Berlim, Alemanha.

Pieter Bruegel, o Velho, nasceu provavelmente em Breda, nos Países Baixos. Pouco se sabe sobre a sua vida, exceto que esteve na Itália, como tantos outros artistas nórdicos da sua época. Ele viveu e trabalhou em Antuérpia e Bruxelas, onde pintou a maioria dos seus quadros na década de 1560, a mesma década em que o inflexível duque de Alba chegou aos Países Baixos. 

Seus quadros, que incluem paisagens e cenas camponesas (do trabalho aos festejos), são exuberantes retratos da vida e dos anseios do povo flamengo. Nessas pinturas alegres - mas de maneira nenhuma simples - Bruegel "descobrira um novo reino para a arte que gerações de pintores holandeses depois dele iriam explorar a fundo" (Gombrich, 1999: p 383). Nesse gênero, Bruegel foi o maior dos mestres flamengos. 

Em sua gravura O Burro na Escola, Bruegel brinca com o enorme interesse pelos estudos demonstrado pela população flamenga. A legenda diz: 


Mesmo que um burro vá à escola, não se transforma em cavalo. 

Bibliografia consultada: GOMBRICH, E. H. A História da Arte. Tradução de Álvaro Cabral. 16ª edição. Rio de Janeiro: LTC, s/d, p. 383.

O Que é o Terceiro Estado?

segunda-feira, 16 de outubro de 2017

O Terceiro Estado carregando o Primeiro e o Segundo estados nas costas. Bibliothéque nationale de France. 

Em 1789, o reino da França possuía 28 milhões de habitantes, camponeses em sua maior parte. A França era uma nação "organizada": a sociedade estava dividida em classes. No topo, estavam os privilegiados - Clero e Nobreza - classes isentas de impostos e outros encargos. Na base, o Terceiro Estado (o povo em geral, os não-nobres), sobre o qual recaíam todos os impostos, embora não possuísse direitos políticos. 

A dinastia capetiana dominava o país há oitocentos anos. Apesar das desigualdades e dos obstáculos inerentes a uma estrutura dessas, o reino de Luís XVI, em termos relativos, era rico. A necessidade de reformas, contudo, era percebida por todos. 

Foi nesse contexto que, no início de 1789, quando ocorreram eleições para a Assembleia dos Estados Gerais, que o brilhante abade Sieyès (1748-1836) optou por disputar eleições não como clérigo, mas sim como membro do Terceiro Estado. 

Verdadeiro gênio da teoria política, Sieyès fez da natureza e dos princípios do governo representativo as preocupações de sua vida. Nesse sentido, ele elaborou a declaração mais clara das dificuldades do Terceiro Estado, começando com as três famosas perguntas e respostas:  

"O que é o Terceiro Estado? Tudo. O que tem sido até agora na ordem política? Nada. O que deseja? Vir a ser alguma coisa." 
O que é o Terceiro Estado? (1789). 

Assim, com uma retórica devastadora e uma argumentação lúcida, o abade defendia que o Terceiro Estado eram simplesmente a nação. E como tal, tinha o direito inalienável de oferecer à França um novo sistema de leis e princípios fundamentais mediante os quais a nação seria governada. Sieyès insistia que qualquer um que ficasse à parte do Terceiro Estado era um parasita que deveria ser eliminado. Deste modo, ele forneceu a base teórica para o Terceiro Estado assumir a iniciativa do Clero e da Nobreza e remodelar a nação à sua própria imagem. 

Bibliografia consultada: 
BLUCHE, Frédéric. et. al. Revolução Francesa. Tradução de Rejane Janowitzer. Porto Alegre, RS: LP&M, 2009, p. 7.
SCURR, Ruth. Pureza fatal - Robespierre e a Revolução Francesa. Tradução de Marcelo Schild. Rio de Janeiro / São Paulo: Record, 2009, p. 105.

A Resistência Heroica dos Poloneses

domingo, 15 de outubro de 2017

500 Anos Após a Reforma

sábado, 14 de outubro de 2017

O irmão Filipe Reis, de Portugal, preparou o folheto cuja capa pode ser vista acima. Trata-se de um excelente material de estudos para ser distribuído neste mês em que comemora-se os 500 anos da Reforma Protestante. Num texto ágil e claro, Filipe apresenta as linhas gerais do processo histórico que levou o cristianismo a se afastar da sua pureza doutrinária primitiva, o que foi parcialmente corrigido na Reforma de Lutero, e que depois prosseguiu com a redescoberta das verdades sobre a condição do homem na morte e do verdadeiro dia dia repouso segundo as Escrituras. 

Baixe o livreto AQUI.

A Origem da Sífilis

sexta-feira, 13 de outubro de 2017

Um médico trata as feridas de um doente de sífilis. Para não se contaminar, ele aplica a pomada de mercúrio com uma espátula. Frankfurt, 1562. 

Existem debates acalorados sobre a origem da sífilis. Até o momento, pesquisas sobre o material genético da sua bactéria não esclareceram onde ela surgiu. Para alguns especialistas, ela já existia na Europa antes da descoberta do Novo Mundo. Teria sido confundida com a lepra, dentre outras doenças. 

Contudo, se a sífilis já existisse na Europa antes das grandes navegações, não seriam de se esperar epidemias por esse mal na década de 1490, uma vez que ela já seria conhecida no Velho Mundo. O fato é que ela foi descrita na Europa e em epidemias logo após o retorno das embarcações de Cristóvão Colombo. A doença disseminou-se entre os prostíbulos das cidades portuárias espanholas e a partir deles, provavelmente também pelos marinheiros espanhóis, chegou a outros portos da Europa. Chegou a Nápoles e acometeu um exército vitorioso da França, em 1495, quando ele havia derrotado os espanhóis que disputavam com eles a região. Os mercenários franceses levaram a doença consigo e a disseminaram para as suas regiões de origem através de relações sexuais. Nos anos seguintes, a sífilis espalhou-se por toda a parte no continente europeu, permanecendo como um flagelo pelas décadas seguintes. 

Bibliografia consultada: UJVARI, Stefan Cunha. A História da Humanidade contada pelos vírus, bactérias, parasitas e outros microrganismos. 2. ed. São Paulo: Contexto, 2013, p. 85-86.

Dia da Hispanidade

quinta-feira, 12 de outubro de 2017

Primeiro desembarque de Cristóvão Colombo na América (c. 1862). Óleo sobre tela de Dióscoro Puebla (1831-1901). Museo del Prado, Madri, Espanha. 

Segundo o historiador Todorov, o ano de 1492 assinalou o início da era moderna. No dia 12 de outubro desse ano, a nau Santa Maria e as caravelas Niña e Pinta, comandadas pelo genovês Cristóvão Colombo (1452-1516) chegaram às Bahamas, na América Central. Assim, no encontro mais surpreendente da história (entre europeus e ameríndios), "os homens descobriram a totalidade da qual fazem parte". Em comemoração a esse evento ímpar na história da humanidade, a Espanha, a Argentina, o México e diversos outros países celebram hoje o Dia da Hispanidade. 

Na viagem patrocinada pelos reis da Espanha, Isabel de Castela e Fernando de Aragão, Colombo pretendia chegar às Índias a partir de uma rota alternativa, navegando em direção ao Ocidente para chegar ao Oriente. Todos sabiam que a Terra é arredondada e, portanto, em tese tal façanha seria possível. Ocorre que a circunferência do nosso planeta é bem maior do que Colombo havia calculado, e ele e sua tripulação só não morreram por falta de alimentos e de água porque acabaram por chegar a um novo continente. No primeiro momento, Colombo acreditava que havia chegado a ilhas que faziam parte das Índias, razão pela qual chamou os seus habitantes de "índios". Só em 1504, outro navegador italiano, Américo Vespúcio (1454-1512), considerou que as "Índias Ocidentais" na verdade constituíam um novo continente. O fato foi confirmado por Vasco Núñez Balboa (1475-1519) em 1513.    

As Mil e Uma Noites

terça-feira, 10 de outubro de 2017

Xerazade conta as histórias de As Mil e Uma Noites ao rei Xariar. Artista desconhecido.

As Mil e Uma Noites conta a  história de um rei persa, Xariar. Ao descobrir que a sua esposa o traía com um escravo, ele resolveu matá-los. Além disso, decidiu desposar uma mulher a cada noite, matando-a pela manhã como vingança pela traição que sofrera. 

Uma das esposas do rei era Xerazade, que resolveu contar ao rei uma história interessante, mas não a terminaria, deixando o suspense para a noite seguinte. Assim, jamais seria morta. Após mil e uma noites, o rei já estava tão encantado e apaixonado por Xerazade que poupou a sua vida. 

A obra As Mil e Uma Noites teve várias versões, e algumas histórias que não faziam parte da edição inicial foram incluídas com o tempo. Dentre as histórias tradicionais que se tornaram famosas estão Aladim e a lâmpada maravilhosa, Ali Babá e os quarenta ladrões e Simbad, o marujo.

Meio Século Sem Che Guevara

segunda-feira, 9 de outubro de 2017

Che Guevara foi capturado no dia 8 de outubro de 1967, por militares bolivianos treinados pela CIA. Seu assassinato, no dia seguinte à captura, encerrou uma operação guerrilheira desastrosa na Bolívia. 

Há meio século, morria Ernesto Guevara de la Serna, o "Che" Guevara. Há meio século, Che não queima livros, não fuzila pessoas que pensam diferente dele, não manda homossexuais para campos de concentração. Há 50 anos, o mundo é um lugar melhor.

Para celebrar a data, um pequeno teste de conhecimentos. Quem disse as frases abaixo?

1. "Fuzilamentos? Sim, fuzilamos e continuaremos fuzilando sempre que necessário. Nossa luta é uma luta [dedicada] à morte."

a) Augusto Pinochet
b) Che Guevara

2. "O negro indolente e sonhador gasta seu dinheirinho em qualquer frivolidade ou diversão, ao passo que o europeu tem uma tradição de trabalho e de economia que o persegue até estas paragens da América e o leva a progredir."

a) Donald Trump
b) Che Guevara

3. "Meus amigos só são amigos quando eles pensam ideologicamente como eu."

a) Marco Feliciano
b) Che Guevara

4. "O ódio como fator de luta. O ódio intransigente ao inimigo, que impulsiona além das limitações naturais do ser humano e o converte em uma efetiva, seletiva e fria máquina de matar. Nossos soldados têm que ser assim."

a) Adolf Hitler
b) Che Guevara

5. "Há que levar a guerra até onde o inimigo a leve: à sua casa, aos seus lugares de diversão; fazê-la total. Há que impedir-lhe de ter um minuto de tranquilidade, um minuto de sossego... atacá-lo onde quer que se encontre; fazê-lo se sentir uma fera acossada por cada lugar que transite."

a) Brilhante Ustra
b) Che Guevara

6. "Asseguro a vocês que se [Jesus] Cristo cruzasse meu caminho eu faria o mesmo que Nietzsche: não hesitaria em esmagá-lo como um verme."

a) Osama Bin Laden
b) Che Guevara

7. "Os jovens devem aprender a pensar e agir em massa. É criminoso pensar como indivíduos."

a) Roberto Marinho
b) Che Guevara

8. "Como é que você pode ter o livro dessa bicha na embaixada?"

a) Jair Bolsonaro
b) Che Guevara

Acertou quem respondeu a mesma alternativa para todas as frases: Che Guevara.

Pois é. Se você é desses que o exaltam, talvez tenha chegado a hora de encarar o espelho. Você provavelmente ainda não sabe disso, mas engrandece uma figura que reúne todos os monstros que você jura combater.

FONTES
1) Discurso de Che Guevara na ONU, em 1964;
2) Diario de Motocicleta - Notas de Viaje Por America Latina, Che Guevara
3) Mi hijo el Che, Ernesto Guevara Lynch
4) Mensagem de Che à Organización de Solidariedad con los Pueblos de Asia, Africa y America Latina, abril de 1967
5) Mensagem de Che aos Povos do Mundo através da Tricontinental, 1967
6) Che - el argentino que quiso cambiar el mundo, Pancho O'Donnell
7) Diario de la Sierra Maestra (citação em "Hijos del retrogresismo", Fundación para el Progreso)
8) Mea Cuba, Guilhermo Cabrera Infante.

Calvinismo: a Cristalização da Reforma

domingo, 8 de outubro de 2017

Os síndicos da guilda dos alfaiates (1662). Óleo sobre tela de Rembrandt (1606-1669). Rijksmuseum, Amsterdã, Países Baixos. 
A propósito dessa imagem, leia o artigo Traços puritanos na pintura de Rembrandt.

"O Calvinismo cristalizou a Reforma. Lutero e Zuínglio tinham modificado radicalmente a antiga religião, mas, para além do vigoroso realce dado à Palavra de Deus, as crenças reformadas careciam duma autoridade precisa, duma direcção organizada e duma filosofia lógica. João Calvino deu-lhes tudo isso e mais ainda. Ele foi um daqueles raros caracteres em que o pensamento e a acção se conjugam e que, se chegam a deixar marca, gravam-na profundamente na história. A influência que ele exerceu desde a cidade de Genebra, que praticamente governou a partir de 1541 até à sua morte, em 1564, espalhou-se pela Europa inteira e mais tarde pela América." 

"O Calvinismo foi a base dos movimentos protestantes em França, em Genebra, na Escócia e na Holanda, e uma influência importante na Alemanha e na Inglaterra, e mais especialmente nas colónias que os Puritanos emigrados fundaram na América no século XVII. A força deste movimento nasceu da excelência da sua organização e da imponente majestade da sua teologia. Essa organização, moldada na de Genebra e abrangendo tanto o laicado como o clero, consistia, em resumo, numa série de associações ligadas umas às outras; em França, onde estas incluíam o consistório, o colóquio e o sínodo, forneceu a espinha dorsal do movimento de resistência huguenote. Noutros lugares assumiu, por vezes, uma tal importância política e social que veio a ser o factor determinante da história do país. Na Holanda deu novo ímpeto à rebelião contra a Espanha e derrotou os críticos arminianos do rigorismo calvinista no começo do século XVII. 

O Calvinismo foi indubitavelmente robustecido nas lutas contras as potências e os principados pela sua sublime fé na sabedoria orientadora e na graça misericordiosa de Deus. Longe de tornar os homens indiferentes à virtude (como realmente de início poderia supor-se), a crença na predestinação estimulou-os a viverem uma vida digna, interpretada às vezes num sentido demasiado estreito. Segue-se que eram raros os calvinistas que pensavam em termos da sua própria condenação eterna (...). A maior parte dos calvinistas estavam convencidos de se encontrarem entre os eleitos da graça divina."   

GREEN, V. H. H. Renascimento e Reforma - a Europa entre 1450 e 1660. Tradução de Cardigos dos Reis. Lisboa: Dom Quixote, 1991, p. 187 e 194. 

O Massacre de Kibeho

sábado, 7 de outubro de 2017

Um militar do serviço médico da ONU presta socorro a uma sobrevivente do massacre de Kibeho. Fotografia de George Gittoes. 
Fonte: Africanagenda.net  

Na África, mais de meio milhão de tutsis tinham sido assassinados por hutus em 1994. A vingança tutsi não se fez esperar. No dia 18 de Abril de 1995, depois de declarar os campos de refugiados no Sul um 'viveiro' de guerrilheiros hutus no ano anterior, o governo do Ruanda mandou encerrar os campos. Encerrar queria dizer matar. Um soldado das Nações Unidas presenciou a cena num dos campos: 'Os soldados agiam como bárbaros, perseguindo e apanhando refugiados que tinham fugido ao seu cerco.' Muitos dos apanhados foram mortos a golpes de baioneta. Um trabalhador de uma organização humanitária ocidental que estava no campo de Kibeho no auge do massacre disse aos jornalistas no dia seguinte: 'Vimos o exército alvejar a tiro pelas costas pessoas que fugiam do campo, velhos e mulheres, sem distinção.' Os hutus sobreviventes do massacre de Kibeho foram levados a pé para o estádio de uma cidade vizinha onde, um ano antes, milhares de tutsis tinham sido massacrados por hutus. Quando chegaram ao estádio, escreveu Eve-Ann Prentice, correspondente diplomática do jornal The Times, 'foram apedrejados ou agredidos à catanada por civis.

GILBERT, Martin. História do Século XX. Tradução de Francisco Agarez. 3ª edição. Alfragide, Portugal: Dom Quixote, 2014, p. 596.

O Desafio da Reprodução em Roma

sexta-feira, 6 de outubro de 2017

Escultura em bronze do século I, conhecida como Vênus de Barcelona. "O amor é fastidioso nas mulheres", segundo Aristóteles; "a fêmea, em razão da sua debilidade constitutiva, alcança rapidamente a idade adulta e a velhice...". Com o corpo estropiado e os problemas do pós-parto mal solucionados, a mulher prefere prescindir das relações (ROUSSELLE, p. 354). 
Museu da História da cidade de Barcelona.

No Império Romano, a população poderá ter sido de 60 milhões de habitantes. A esperança de vida à nascença situava-se entre os 20 e os 30 anos. A realidade era especialmente dramática para as crianças e para as mulheres. Tanto no mundo romano quanto em todas as sociedades anteriores aos progressos da obstetrícia e da profilaxia neonatal, o destino das mulheres era fixado pela maternidade. Entre 5 e 10% das mulheres que davam à luz morriam do parto ou de suas sequelas.

Assim, a primeira certeza sobre a vida feminina em Roma é a do risco mortal dos partos, em todas as classes sociais. As parteiras e os médicos nunca estavam seguros de garantir que o parto chegaria a um final feliz. Sabia-se bem que a largura da bacia condicionava os partos. Nas famílias abastadas, os médicos aconselhavam que se moldasse o corpo da moça, assim como o do rapaz, com a ajuda de ligaduras que envolviam completamente a criança nos dois primeiros meses de vida. A ama ou a mãe apertavam as ligaduras nos ombros e em volta do peito, que se desejava estreito, deixando completamente livre o quadril para obter uma bacia larga (ao passo que se comprimiam as ancas dos rapazes). 

Contudo, apesar do perigo dos partos, a obsessão das mulheres era sobretudo a esterilidade. Outra preocupação era com o risco de morte dos filhos, quer durante a gravidez, quer à nascença, quer nos primeiros anos de vida. Todas as classes sociais estavam expostas e acostumadas a esses riscos. A mortalidade infantil devia aproximar-se de um quintoNa Etrúria, na Gália, na região do Eufrates e em todas as civilizações do império, as mulheres e os seus maridos invocaram as divindades para obter a segurança do feto, do recém-nascido e da criança. Os ex-votos testemunham a importância da sua preocupação.

Bibliografia consultada: ROUSSELLE, Aline. A política dos corpos: entre procriação e continência em Roma. In: DUBY, Georges & PERROT, Michelle. História das Mulheres. PANTEL, Pauline Schmitt (dir.). Volume 1 - A Antiguidade. Tradução de Alberto Couto et. al. Porto: Afrontamento, s/d, p. 352-355.

A Agenda Pró-Pedofilia

quarta-feira, 4 de outubro de 2017

Lavrentiy Beria (1899-1953) era o braço direito de Stálin e um dos poucos que contaram com sua inteira confiança. Na foto, está com a filha de Stálin no colo enquanto o chefe trabalhava ao fundo.

Além de ser um assassino brutal e sádico, mentor e comandante de incontáveis massacres, Beria foi responsável pela polícia política de Stálin, pela KGB (na época, NKVD) e um dos comandantes dos grandes expurgos dos anos 30.

Beria foi também um bajulador incansável de Stálin e um dos responsáveis por tornar seu regime a mais poderosa máquina de propaganda política da história. Ele chegou a estruturar para a polícia política soviética o que chamou de "psicopolítica", ou "a arte e a ciência de estabelecer e manter o domínio sobre os pensamentos e as lealdades dos indivíduos, funcionários, departamentos, das massas, e a efetivação da conquista das nações inimigas através de "cura mental"." O manual soviético de Psicopolítica idealizado e coordenado por Beria pode ser lido em inglês aqui.

Como se não faltassem credenciais para Beria ser recebido com festa no inferno, ele também era pedófilo, assim como Mao Tsé-Tung. Lembrei dele quando vi muita gente compartilhando hoje uma matéria do WorldNet Daily sobre um assunto que o Olavo de Carvalho já alerta há anos: a pedofilia é a próxima 'revolução sexual' que alguns intelectuais "progressistas" estão tramando.

O assunto é tão repugnante que é realmente difícil abordar o tema sem que se tenha náuseas. A própria hipótese de que um dia uma das mais abjetas formas de perversão humana seja socialmente aceita como apenas uma 'preferência sexual' é tão absurda que o debate não se coloca e a agenda dos defensores da pedofilia vai, aos poucos e sem alarde, avançando, tanto na academia quanto até no judiciário, como em sucessivas decisões de perdão ou penas quase simbólicas para pedófilos.

A estratégia dos defensores da pedofilia pode ser resumida assim:

1. Criar um eufemismo ou um novo nome para a pedofilia, abandonando o termo desgastado. Estão tentando emplacar algo como "amor intergeracional".

2. Tirar toda a responsabilidade individual do pedófilo: "ah, ele não tem culpa de se sentir atraído por crianças."

3. Fabricar estudos embusteiros e falsos para convencer a comunidade acadêmica e os formadores de opinião que é algo relativamente comum, que há farto material comprovando que a pedofilia é uma característica humana e que só é condenada pelo moralismo irracional burguês e cristão.

4. A imprensa começa a abordar o assunto "sem preconceitos", entrevistando os defensores do assunto na academia apenas para "abrir a discussão".

5. Filmes e novelas começam também a abordar o assunto "sem moralismos" e "humanizando" os pedófilos.

6. O movimento ganha as ruas e é considerado uma forma de resistência contra a discriminação.

7. Políticos passam a ver ganhos na defesa do grupo e propõem legislações que aprovem a pedofilia como forma de "incluir socialmente" os pedófilos.

8. Livros didáticos produzidos por governos, segundo orientação da ONU, tratam a pedofilia positivamente e em histórias em quadrinhos simpáticas para as crianças.

9. Uma lei criminalizará os "pedofóbicos" como os que têm preconceitos contra os pedófilos e suas "formas de amar".

Esse é um processo que pode e tem que ser parado nos estágios iniciais, antes que seja tarde.

Alexandre Borges
Publicado no Facebook (2 de janeiro de 2014).


Referências:

CORSI, Jerome R. "PEDOPHILIA THE NEXT 'SEXUAL-RIGHTS' REVOLUTION?", in WND.

CARVALHO, Olavo de. "Cem anos de pedofilia", in: O Globo.

CONSTANTINO, Rodrigo. "Dawkins não vê problema na “leve pedofilia”. Eu vejo sérios problemas em Dawkins!", in: Gazeta do Povo.

BRASIL, Felipe Moura. "A matemática da suruba", in: Veja.

"Acusado de estuprar três meninas de 12 anos é absolvido pelo STJ", in: G1.

Se tiver estômago, leia:
GHIRALDELLI JÚNIOR, Paulo. "Amor e sexo entre pequenos e grandes", in: Rede Dante.