“Quem não é capaz de sonhar com a história diante dos documentos não é historiador.” F. Braudel

“Quem não é capaz de sonhar com a história diante dos documentos não é historiador.” F. Braudel
Villa Borghese, Roma, Itália.

«Pensamentos», de Marco Aurélio

sábado, 31 de dezembro de 2011



O imperador Marco Aurélio (161-180) legou à filosofia ocidental uma grande joia do estoicismo: a obra Pensamentos (ou Meditações). É nela que podemos ler as belas citações abaixo:

Qual é a duração da vida do homem? Um ponto no espaço. A substância? Variável. As sensações? Obscuras. O que é o seu corpo? Putrefação. Sua alma? Um torvelinho. Seu destino? Um enigma. Sua reputação? Duvidosa. Tudo o que provém de seu corpo é como água da torrente, e o que dimana de sua alma é como um sonho, como o humo. Sua vida é um combate perpétuo, um descanso em terra estrangeira, e sua fama depois da morte um esquecimento absoluto. Qual é a única coisa que pode facilitar sua viagem nesse mundo? A Filosofia. Ela consiste em velar pelo gênio que reside em seu interior, de modo que não receba nem as afrontas, nem as feridas, e que não se deixe arrastar pelos prazeres nem pelas dores, que não faça nada fortuitamente, que não empregue os embustes nem a hipocrisia, que nunca conte com que o outro faça ou deixe de fazer, que aceite tudo o que aconteça ou o que corresponda como procedente da mesma origem e, por fim, que aguarde a morte com paciência, como uma dissolução dos elementos que constituem o organismo de todo ser animado. Se estes elementos não sofrem dano algum ao transformar-se perpetuamente de um estado ao outro, porque te inspiram desconfiança ou temor? Tudo se encontra regido pela Natureza, logo não há nenhum perigo.
MARCO AURÉLIO, Pensamentos, Livro II.17.

Se alguém me consegue mostrar e provar que estou errado no pensamento ou na ação, eu mudo de bom grado. Eu procuro a verdade, o que ainda nunca magoou ninguém. Só a persistência na auto-ilusão e na ignorância é que magoa. - IDEM, VI.21.


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- Leia AQUI a obra completa de Marco Aurélio.
- Ver a biografia McLYNN, Frank. Marco Aurélio: guerreiro, soldado e imperador. Lisboa: Civilização, 2010.

A reabertura do mausoléu da família Scipioni

sábado, 24 de dezembro de 2011


Era a notícia que faltava para terminarmos o ano "com chave de ouro": o mausoléu de uma das famílias mais tradicionais da Roma Antiga será reaberto à visitação pública no próximo dia 27. Ele já estava fechado há 20 anos.

O maior representante desta família foi Cipião, o Africano, (em latim, Publius Cornelius Scipio Africanus), célebre pela atuação durante as guerras púnicas, nas quais derrotou o invasor Aníbal de Cartago, no século III a. C. O heroi romano, contudo, não foi enterrado ali. Acusado de ter recebido suborno, deixou Roma e nunca mais voltou. Diz-se que passou seus últimos em sua propriedade em Litermum (perto de Nápoles), e que antes de morrer pediu que seu corpo ficasse aí, não na Roma ingrata. Seu pedido foi atendido e seu túmulo ainda existia em Litermum, segundo o historiador romano Tito Livio. "Pátria ingrata, não te deixarei nem meus ossos", dizia seu epitáfio.

O monumento funerário, composto por uma série de galerias subterrâneas de dois metros de altura, com elegantes sarcófagos, está localizado junto à Porta di San Sebastiano, a algumas centenas de metros das Termas de Caracalla, um dos locais mais fascinantes da parte histórica de Roma.

O túmulo foi descoberto por acaso, em 1780, por dois religiosos, proprietários de um vinhedo. Os trabalhos recentes de restauração, no valor de 1,3 milhão de euros, foram financiados pela prefeitura de Roma e começaram em 2008.


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Veja o vídeo: http://veja.abril.com.br/multimidia/video/mausoleu-da-familia-scipioni-reabre-em-roma

A queda do Império Romano

quarta-feira, 14 de dezembro de 2011


A sua voz era fraca,
O seu andar era lento,
os seus olhos escavados.
A sua face estava caída
e a fome tinha gasto os seus membros.
Os seus ombros fracos mal conseguem
apoiar o seu escudo não polido.
O seu capacete torto mostra os seus
cabelos grisalhos e a lança que ela
carrega não passa de ferrugem.
Claudiano, De bello Gildonico, Livro XV.





Não estará seguro aquele que te esquecer.
Que possa eu louvar-te ainda que o sol se torne escuro.
Pois contar as glórias de Roma é como contar
as estrelas do céu.
Rutílio Namaciano (séc. V)

O tema sempre será apaixonante. Os antigos já debatiam-se com a questão. Além de Rutílio, Boécio (c. 480-524 ou 525) não concebia o fim da civilização romana, embora servisse na corte do rei bárbaro Teodorico, o grande. Desde Gibbon e sua colossal obra no século XVIII, até hoje, a historiografia se debruça sobre as causas da queda do maior império de todos os tempos. Aliás, são de Gibbon as palavras abaixo:

Enquanto esse grande organismo [o Império Romano] era invadido pela violência sem freios ou minado pela lenta decadência, uma religião pura e humilde foi brandamente se insinuando na mente dos homens, crescendo no silêncio e na obscuridade; da oposição tirou ela novo vigor para finalmente erguer a bandeira triunfante da Cruz por sobre as ruínas do Capitólio.
GIBBON, E. Os cristãos e a queda de Roma. São Paulo: Penguin Classics Companhia das Letras, 2012, p. 7.

Enfim, são múltiplas as visões sobre o fenômeno, e a posição de Gibbon é devidamente refutada na minha dissertação de mestrado. Seguindo na linha de Gibbon, Arther Ferrill e Bryan Ward-Perkins (autores, respectivamente, de A queda do Império Romano - a explicação militar e de A queda de Roma e o fim da civilizaçãodefendem que o desaparecimento político do Estado romano representou o fim de sua civilização. Por outro lado, historiadores que seguem a tendência inaugurada por Peter Brown (criador do termo Antiguidade Tardiadestacam as permanências e transformações da cultura clássica a partir do contato com o cristianismo. Finalmente, destaco uma discussão histórico-filosófica que talvez esteja no meio termo - O fim do mundo antigo, do historiador italiano Santo Mazzarino.

Como prova de que séculos de investigações não esgotaram o tema, recentemente foi lançado um livro muito interessante sobre o assunto:

GOLDSWORTHY, A. O fim do Império Romano - o lento declínio da superpotência. Lisboa: A Esfera dos Livros, 2010.

Adrian Goldsworthy já escreveu vários livros sobre a civilização romana - com destaque para a História Militar - e nesta obra defende as guerras civis e a instabilidade política como a principal causa da extinção política do Império. Um quadro panorâmico sobre o Baixo Império, e um texto tremendamente bem escrito! Ele busca aproximar a História do grande público, sem perder o rigor científico.


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- Imagem: detalhe do quadro O saque de Roma pelos visigodos em 24 de agosto de 410, de Joseph-Noel Sylvestre (1847-1926).
-Leia o artigo O fim do mundo antigo: uma discussão historiográfica, de Gilvan V. da Silva, na Mirabilia.
- Leia o artigo El fim del Imperio Romano de Occidente, de Manuel Muñoz García, na Tempora Magazine.
- Assista: The fall of the Roman Empire (1964), do diretor: Anthony Mann. Vale a pena também ver o documentário Império Romano - o último imperador.

Uma História do Cristianismo (BBC)

segunda-feira, 12 de dezembro de 2011


"A história do cristianismo tem sido um incessante renascimento de um encontro com Jesus Cristo, o Filho de Deus ressuscitado. Para alguns, como as Igrejas Ortodoxa e oriental, os encontros têm sido feitos através de um ritual, tradicional ou intimamente místico. Já para os católicos ocidentais, por meio da obediência à Igreja. Para as igrejas protestantes, através da Bíblia. E é a variedade que é tão marcante na jornada do cristianismo." 
Diarmaid MacCulloch

O documentário A history of christianity está dividido em seis partes:

01 – O cristianismo primitivo

02 - Catolicismo - a imprevisível ascensão de Roma

03 - Ortodoxia - do Império ao Império

04 - Reforma - o indivíduo diante de Deus

05 - Protestantismo - a explosão evangélica

06 - Deus no banco dos réus

A série foi transmitida originalmente pela BBC Four. O Professor Diarmaid MacCulloch – um dos maiores historiadores vivos do mundo – revela as origens do cristianismo e explora o que significa ser cristão. O objetivo da BBC era produzir uma série ‘divisora de águas’ que examinasse as origens do Cristianismo e a relevância da fé no mundo atual. O professor de História da Igreja na St. Cross College Oxford, Diarmaid MacCulloch, considera a evolução da fé cristã e suas quatro formas principais: ortodoxa, cristianismo oriental, catolicismo ocidental e o protestantismo.

O historiador que apresenta a série declara-se apenas "um amigo sincero do cristianismo", e em certas partes deixa transparecer o seu ceticismo. Mas, no geral, a visão é bem equilibrada. Portanto, trata-se de um documentário a ser visto.