“Quem não é capaz de sonhar com a história diante dos documentos não é historiador.” F. Braudel

“Quem não é capaz de sonhar com a história diante dos documentos não é historiador.” F. Braudel
Villa Borghese, Roma, Itália.

Marranismo às Avessas

terça-feira, 21 de junho de 2022

 

Salônica na atualidade.


No século XVI, Salônica se tornou o grande centro judeu do Levante e a principal cidade de acolhida dos marranos. Os rabinos recomendavam que eles fossem ajudados, a qualquer preço, a tornar-se de novo bons judeus. Doutores não hesitavam em proclamar os marranos arrependidos como melhores judeus do que os mais pios dos judeus. Mas a rejudaização nem sempre era fácil; o judeu corrente via o marrano negativamente e o tratava de Kistanios (e não de Kristianos, a fim de evitar a pronúncia do nome de Cristo).

Mesmo em terras do Islã, onde nessa altura era mais cômodo ser judeu do que ser cristão, a ambiguidade marrana não era facilmente superada. Salônica fervilhava com famílias em situação religiosa imprecisa, meio-cristãs, meio-judias. Certas pessoas iam errando de uma fé para outra, e alguns, depois de efetuar o retorno à religião ancestral, eram tomados de nostalgia pelo catolicismo, e regressavam a ele. Ocorreram casos de marranismo às avessas: indivíduos exteriormente judeus, mas internamente cristãos. Houve também descrentes que adotaram pro forma o Islã, alguns dos quais fizeram gloriosas carreiras militares a serviço do sultão otomano.  

Adaptado de POLIAKOV, Léon. De Maomé aos Marranos. Tradução de Ana M. Goldberger Coelho e J. Guinsburg. São Paulo: Perspectiva, 1984, p. 209.

Make the Roman Empire Great Again

domingo, 19 de junho de 2022

 

#InMemoriam John Chau

sábado, 18 de junho de 2022

 

Em 17 de novembro de 2018, o missionário John Allen Chau foi assassinado a flechadas pelos nativos da ilha Sentinela do Norte, no Oceano Índico. Chau sabia dos riscos, pois se planejou para a missão durante nove anos. "Podem pensar que sou louco nisto tudo, mas acho que vale a pena anunciar Jesus a estas pessoas", escreveu ele em seu diário.

Jamais nos esqueceremos do seu martírio.

Créditos: @VOM_USA (Twitter)

A Visão Conservadora da Polícia

sexta-feira, 17 de junho de 2022

 

George Dixon, o policial de Dock Green, série de televisão da BBC (1955-76).

A força policial "deveria ser uma expressão da sociedade civil, enraizada na comunidade local e tanto suscetível às condições locais quanto às exigências do governo nacional. Assim era na Inglaterra da minha juventude [anos 1950-60], realmente famosa no mundo pela postura e ethos de sua força policial. Nossa polícia não era um braço do governo central, mas uma organização local responsável perante os conselhos municipais. O próprio policial era treinado como um amigo da comunidade que servia, e um indicador disso era andar armado apenas com um bloco de notas e um cômico apito feito de estanho. Conhecia as pessoas na área em que fazia a sua ronda e tinha um interesse benigno e paternal pelo bem-estar delas. As crianças iam até ele quando estavam perdidas, estrangeiros pediam orientações e todos o cumprimentavam com um sorriso. Idealizados, mas não caricaturados, nas séries de TV dedicadas ao mundo do policial Dixon de Dock Green, sua função era consertar o que estivesse errado, restaurar o equilíbrio e orientar a própria comunidade ao longo de seu caminho pacífico para qualquer lugar. O policial Dixon cultivava begônias, cantava no coro da polícia, era membro da equipe policial de dardos, e, em geral, era um digno participante dos 'pequenos pelotões' de Dock Green, como qualquer um daqueles que poderiam ser chamados para servir no júri.

Concebida dessa maneira, a força policial inglesa servia para enfatizar uma verdade fundamental sobre a lei inglesa, que existe não para controlar o indivíduo, mas para libertá-lo. O common law está do lado do cidadão contra os que desejam subjugá-lo sem o seu consentimento - sejam políticos usurpadores ou criminosos comuns."   

SCRUTON, Roger. Como ser um conservador. Tradução de Bruno Garschagen. 3 ed. Rio de Janeiro: Record, 2015, p. 201-202.

A Expulsão dos Judeus da Espanha

quarta-feira, 15 de junho de 2022

 

A expulsão dos judeus de Sevilha, obra de Joaquín Turina y Areal (1847-1903). 


Em 2 de janeiro de 1492, os Reis Católicos, Fernando e Isabel, entraram solenemente em Granada; a Reconquista estava completa. Em 31 de março do mesmo ano, decretavam a expulsão dos judeus da Espanha. Dava-se quatro meses para que os judeus liquidassem seus negócios e vendessem seus bens móveis e imóveis; mas a exportação de dinheiro e metais preciosos lhes era interdita. Em 2 de agosto, apenas dois após após o prazo para que os judeus deixassem a Espanha, Cristóvão Colombo partiu com as suas três caravelas que chegariam à América no dia 12 de outubro.

Os judeus, que ainda contavam com representantes poderosos na corte, tentaram obter a revogação do edito ou uma prorrogação do prazo. Contudo, seus esforços foram vãos, apesar de terem oferecido imensas somas de dinheiro ao tesouro. Um batismo de última hora era o único expediente que permitia remanescer no solo da mãe pátria. Nas últimas semanas que restaram aos judeus na Espanha, o clero espanhol lançou-se a uma ativa propaganda missionária, amiúde coroada de êxito. Segundo uma testemunha judia, muitos judeus, "grandes e pequenos", e até mesmo rabinos, preferiram ficar na Espanha, convertendo-se ao catolicismo.

As estimativas mais sérias dão a entender que quase 150 mil judeus aceitaram o exílio (a maioria foi para Portugal). Apenas 50 mil preferiram uma conversão de última hora. Um verdadeiro êxtase apoderou-se dos corações, e a provação era comparada à saída do Egito. Dizia-se que ela seria seguida de uma terra prometida de glória e honras. Outros acreditavam que a Espanha logo chamaria de volta seus filhos, de modo que certos exilados, depois de terem vendido seus bens, enterravam o dinheiro no solo da mãe pátria.

Segundo Bernaldez, em alguns meses os judeus venderam tudo o que puderam. Davam uma casa em troca de um asno, uma vinha por um pedaço de tecido ou tela. Antes de partir, casavam entre si todos os seus filhos de mais de doze anos, para que cada menina tivesse a companhia de um marido. A seguir, partiram no seu duro êxodo, enfrentando a fome e a sede, a doença ou inúmeras outras dificuldades. Quanto aos cristãos, em sua grande maioria, não se comoveram muito com a partida dos judeus.

O epílogo do drama foi representado em Portugal. O rei D. João II admitiu os exilados, mediante a taxa de oito cruzados por cabeça e sob a condição de deixarem o país no prazo de oito meses. Uma parte deles, de fato, seguiu para a África. A maioria, porém, não pôde ou não se resolveu a fazê-lo. Findo o prazo, o monarca começou a vender esses judeus como escravos. Seu sucessor, D. Manuel I, ordenou que eles fossem libertados. Pouco depois, porém, um projeto de casamento entre ele e a infanta da Espanha tomou corpo. Os Reis Católicos passaram a lhe exigir, então, a completa cristianização de Portugal.

Ora, uma expulsão teria sido um desastre imediato para a vida econômica do país. O batismo forçado passou a ser a única saída vislumbrada pela administração portuguesa. Na Páscoa de 1497, a coisas se precipitaram. As crianças eram tomadas de seus pais e levadas às pias batismais; os pais que não as seguiram de boa vontade eram arrastados à força. Vários milhares foram batizados durante algumas semanas (inclusive judeus portugueses). Os suicídios foram numerosos, bem como outros incidentes atrozes. O papa Alexandre Bórgia esforçou-se para limitar os estragos e, afinal, os judeus batizados tiveram, em Portugal, plena licença para levar uma vida de judeus, a ponto de serem autorizados a se reunirem em culto. Podiam também enriquecer, o que interessava ao tesouro real, que lhes extorquia de tempos em tempos. Isso durou meio século.

A população portuguesa reagia com fúria, atacando os judeus em terríveis pogroms, como o de Lisboa, em 1506, que causou mais de mil vítimas. Finalmente, a Inquisição copiada da Espanha foi adotada em Portugal, de conformidade com um breve pontifical de 1536, e começou a grassar com a mesma implacabilidade de seu modelo.  

Adaptado de POLIAKOV, Léon. De Maomé aos Marranos. Tradução de Ana M. Goldberger Coelho e J. Guinsburg. São Paulo: Perspectiva, 1984, p. 166-170.

A Disputa de Tortosa

segunda-feira, 13 de junho de 2022

 

No início de 1412, em Castela, São Vicente Ferrer conseguiu impor um novo estatuto dos judeus, o estatuto de Valladolid. Entre outras coisas, eles foram proibidos de vender ou oferecer produtos alimentícios aos cristãos, fazer com que estes lavrassem para eles os campos ou mudar de domicílio. Quanto a suas roupas, seu feitio deveria ser humilde, de tecido grosseiro e comportar naturalmente um signo distintivo bem visível. Daí para a frente, em todos esses pontos, Castela passaria a seguir a tendência antijudaica do resto da Europa.

Nessa época, o papa Benedito XIII, de quem Vicente Ferrer era confessor, encontrava-se numa situação difícil devido ao Grande Cisma. Em 1412, tomou a decisão de converter todos os judeus em bloco. A demonstração que ele preparou ficou na história como a Disputa de Tortosa.

A demonstração durou perto de dois anos, e o campeão do cristianismo foi o erudito Josué de Lorca. Ele foi enfrentado por catorze rabinos. Muita sutileza foi gasta de ambos os aldos, mas o verdadeiro espetáculo estava no auditório. Entre mil e dois mil espectadores assistiam a cada sessão, sendo uma parte deles judeus que, seguindo um combinado prévio, se levantavam ao fim de cada colóquio para declarar que haviam se convencido dos argumentos de Lorca. Então, pediam para ser batizados ali mesmo. Três mil judeus passaram pelos batistérios de Tortosa entre janeiro de 1413 e novembro de 1414.

Atormentados e ameaçados, a maioria dos rabinos desistiram e suplicaram que se lhes permitissem voltar para casa no verão de 1414. Apenas dois rabinos seguiram até o fim na disputa.

Pouco depois, Benedito XIII foi condenado pela Cristandade no Concílio de Constança. Porém, ele podia se gabar de que, de Perpignan a Cádiz, os judeus novamente se convertiam em massa. Nas crônicas judaicas, 1391 ficou como "o ano das perseguições e da opressão", ao passo que 1413-14 é "o ano da apostasia".     

Adaptado de POLIAKOV, Léon. De Maomé aos Marranos. Tradução de Ana M. Goldberger Coelho e J. Guinsburg. São Paulo: Perspectiva, 1984, p. 140-142.

Como e onde morreram os imperadores

domingo, 12 de junho de 2022

 

No mapa, as mortes de imperadores durante a Crise do Século III.
Clique na imagem para ampliá-la.

O Grupo Bilderberg

sexta-feira, 10 de junho de 2022

 

A Espanha das Três Religiões

terça-feira, 7 de junho de 2022

 

Na Espanha das Três Religiões (catolicismo, islã e judaísmo), onde todos os cultos eram respeitados, a passagem de um culto para outro era proibida ou muito dificultada, pois mesmo as conversões ao cristianismo de judeus ou mouros sofriam vários entraves.

O exercício de cada culto era oficialmente protegido pelo poder e até mesmo regulamentado por ele. Assim, pela vontade do monarca e da lei cristã, a observância do Shabat e das festas eram obrigatórias aos judeus. Em tudo, o judeu devia comportar-se como bom judeu, sendo que até a Igreja espanhola o proibia de se converter ao Islã, assim como o inverso.

No que diz respeito às conversões ao cristianismo, a situação era mais complexa. A igreja espanhola não podia deixar de querer a conversão dos infiéis, mas, ao menos antes do surto no séc. XIII das grandes ordens de pregadores franciscanos e dominicanos, e dos esforços desenvolvidos por estes em Aragão, ela quase não a procurava na prática. Consequentemente, nada era feito para levar o judeu ao batismo, e muitas coisas contribuíram para afastá-lo deste.    

Adaptado de POLIAKOV, Léon. De Maomé aos Marranos. Tradução de Ana M. Goldberger Coelho e J. Guinsburg. São Paulo: Perspectiva, 1984, p. 102-103.

Castelo de Chambord, França

domingo, 5 de junho de 2022