“Quem não é capaz de sonhar com a história diante dos documentos não é historiador.” F. Braudel

“Quem não é capaz de sonhar com a história diante dos documentos não é historiador.” F. Braudel
Villa Borghese, Roma, Itália.

#15Fatos A Educação na Antiguidade

segunda-feira, 11 de junho de 2018

Detalhe de um relevo encontrado perto de Trier (180-185 d.C.). Mostra um mestre com três discípulos. 

1. O essencial da nossa civilização (incluído o nosso sistema de educação) adveio dos greco-latinos. No Baixo Império Romano (284-476 d.C.), a conversão do mundo mediterrâneo ao cristianismo não alterou o quadro geral da educação clássica. A escola antiga prolongou-se pela Alta Idade Média, até que sua experiência foi interrompida. Seus procedimentos foram retomados, imperfeitamente, pela renascença carolíngia. Coube à Renascença, entre os séculos XV-XVI, resgatar a tradição clássica. 

2. A história da educação antiga é um reflexo da passagem progressiva de uma cultura de nobres guerreiros para uma cultura de escribas. Assim, inicialmente (essencialmente na sociedade homérica), a cultura grega inicialmente era privilégio de uma aristocracia de guerreiros. Durante séculos, a educação antiga conservou muitos traços desta origem aristocrática e cavalheiresca. Mesmo quando se julgavam democráticas, as sociedades antigas viviam sobre uma tradição de origem nobre. 

3. A educação homérica possuía uma faceta técnica e uma faceta ética. Através da faceta técnica (manejo de armas, esportes e jogos cavalheirescos, artes musicais e oratória, sabedoria) a criança era preparada e progressivamente iniciada em certo modo de vida. Já a faceta ética, mais que uma simples moral de preceitos, era um certo ideal da existência, um tipo ideal de homem a realizar. 

4. A educação literária grega sempre teve Homero como centro de todos os estudos. Isso se deu porque a ética cavalheiresca permaneceu no centro do ideal grego, e Homero foi o intérprete eminente desse ideal. Os textos de Homero formavam um manual ético.

5. Embora o conteúdo técnico da educação grega tenha evoluído profundamente, a ética de Homero conservou, ao lado de seu valor estético, uma projeção permanente. O verdadeiro alcance educativo de Homero residia na atmosfera ética em que atuavam os seus heróis, bem como em seu estilo de vida. 

6. Eminentemente militar e aristocrática, Esparta permaneceu semi-iletrada. A educação espartana clássica buscava o "adestramento" do hoplita, e era organizada inteiramente em função das necessidades do estado. Embora a educação do jovem espartano fosse precipuamente militar, sua educação não era mais a de um cavalheiro, mas a de um soldado. Nesse sentido, sua educação conservadora conservou, de suas origens cavalheirescas, o gosto e a prática dos esportes hípicos e atléticos. A cultura espartana também não ignorava as artes, e o elementos intelectual era essencialmente representado pela música, que estava ligada à dança. 

7. A pederastia ocupou um lugar notável no âmbito da pedagogia helênica. Essa "inversão", contudo, era considerada anormal na maioria das cidades gregas. É importante destacar que a essência da pederastia helênica reside num companheirismo de guerreiros, e a atração entre homens parece ser uma constante das sociedades guerreiras. 

Entre os gregos, a família não podia constituir o plano da educação - a mulher só era julgada competente para a criação do bebê, e o pai era monopolizado pela vida pública. Além disso, a escola não existia na época arcaica e, mesmo após ter sido criada, permaneceu um pouco desprezada. Assim, a ligação amorosa entre um homem mais velho, o erasto, e um mais jovem, que era por ele iniciado em atividades sociais (clube, ginásio, banquete) era a técnica-padrão de toda a educação.  

8. Em Lesbos, em fins do século VII a.C., surgiu uma escola "morada das discípulas das Musas". A instituição, uma espécie de confraria religiosa, funcionava como um complemento à educação das jovens, no período entre a infância e a idade do casamento. Contudo, o amor sáfico, diferentemente da pederastia de Platão, era apenas uma paixão humana, ardente e frenética. 

Safo teve algumas concorrentes em sua época, como Andrômeda e Gorgona. 

9. Em Atenas, a educação perdeu seu caráter essencialmente militar no século VI a.C. Na primeira parte do século V a.C., a educação ateniense era antiga, até mesmo arcaica. Apesar disso, representou, mesmo assim, um progresso notável na evolução de uma cultura de guerreiros para uma cultura de escribas. No último terço do século V a.C., surgiram grandes inovações pedagógicas com a geração dos sofistas e com Sócrates. No fim do século IV a.C., a efebia (a formação militar obrigatória dos 18 aos 20 anos) parece ter atingido o seu pleno desenvolvimento.

10. A geração de Isócrates (436-338 a.C.) e Platão (427-348 a.C.) conduziu a educação antiga à sua maturidade. Esses dois grandes mestres expurgaram a retocaram as técnicas educativas de seus predecessores. Ocupando uma posição intermédia entre esses dois educadores, os socráticos menores eram educadores profissionais (à exceção de Fédon de Élis), e deram seu contributo para a evolução das ideias pedagógicas.  

11. A partir da geração que se seguiu a Aristóteles e a Alexandre Magno, a educação antiga se tornou verdadeiramente uma educação em sua forma clássica. Nos séculos seguintes, a educação perdeu muito do que restava do seu caráter nobre, da sua cultura física e do seu aspecto artístico e notadamente musical. A educação teve os seus elementos literários reforçados e tornou-se mais escolar. 

12. A educação helenística ultrapassou a época propriamente helenística para estender-se pelo período romano. É importante destacar, assim, que não houve educação ou civilização autônomas propriamente romanas. A educação romana foi apenas uma adaptação da educação helenística aos centros de expressão latina. Na metade oriental do mundo mediterrâneo, a educação helenística (clássica) se prolongou por toda a história bizantina. 

13. O preceptor ou pedagogo era o encarregado de conduzir a criança nos trajetos diários entre o domicílio e as escolas. Era um simples escravo que zelava: 1º) pelo aspecto moral (protegia contra os perigos das ruas, ensinava boas maneiras, atuava na formação do caráter e da moralidade); 2º) atuava como repetidor das instruções dos mestres, ensinava as lições e se responsabilizava por toda a educação moral. Deste modo, perpetuava o papel do "preceptor" dos heróis homéricos.  

14. Nas épocas helenística e romana, tanto o ensino primário quanto o secundário foram carregados de pretensões "enciclopédicas", uma consequência inevitável do progresso da cultura. A alta cultura helenística permaneceu baseada na poesia, não na ciência. A civilização helenística opôs-se às culturas revolucionárias e inovadoras, se imaginando solidamente fundamentada num "imóvel presente". 

15. No Baixo Império Romano, os homens não se consideravam como representantes de uma cultura em vias de extinção. Sua missão era a de preservar, ante os bárbaros, a civilização e a cultura (sendo que esta se identificava cada vez mais com a tradição literária clássica). Entre os cristãos, graças a uma influência judaica que enfatizava o papel da família na formação da "consciência religiosa", a família cristã passou a ser encarada como o meio natural em que se devia formar a alma da criança.   

Bibliografia consultada: MARROU, Henri-Irénée. História da Educação na Antiguidade. Tradução de Mário Leônidas Casanova. São Paulo: Herder, 1966. 

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