“Quem não é capaz de sonhar com a história diante dos documentos não é historiador.” F. Braudel

“Quem não é capaz de sonhar com a história diante dos documentos não é historiador.” F. Braudel
Villa Borghese, Roma, Itália.

«Fabíola», do Cardeal Wiseman

quarta-feira, 16 de novembro de 2011


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Tenho a sorte de ser orientado por um professor versátil. Para me ajudar na árdua tarefa de desenvolver a minha dissertação sobre a cristianização do exército e a política imperial, ele sugeriu-me um romance escrito no século XIX:

CARDEAL WISEMAN. Fabíola ou A Igreja das Catacumbas. Tradução de Leyguarda Ferreira. Lisboa: João Romano Torres, 1969.

Após empreender uma verdadeira peregrinação por Lisboa e, especialmente, pelo Bairro Alto, encontrei-o num sebo que em 2014 completará 100 anos, a Livraria Barateira, Lda. 

[NOTA: Caso queira adquirir uma edição impressa, acesse a Estante Virtual]

Logo de início, Gentil Marques, o autor do prefácio, diz que o que impulsionou o Cardeal Nicholas Wiseman (1802-1865) foi o amor pelo tema. Isso condiz com o espírito desse sevilhano que, desde criança, "amava as flores, o céu e a verdade". Permanece um mistério como o autor, homem extremamente sobrecarregado pelas atividades do seu ministério, conseguiu levar a cabo a missão de escrever esse excelente romance. Tudo isso deve contagiar o leitor: é animador saber que A Igreja das catacumbas (como Fabíola também é conhecida) não foi escrita por interesses financeiros ou quaisquer outros, mas tão-somente pelo amor!

Posto isso, vamos ao enredo. A estória se passa em Roma, no início do século IV d.C., durante a última grande onda de perseguição aos cristãos. Essa perseguição foi a promovida por Diocleciano e seus colegas tetrarcas entre 303 e 311 (só para constar, a 1ª dessas "ondas" ocorreu sob Décio, entre 249 e 251, e a 2ª, sob Valeriano, entre 257 e 260). Logo no 1º capítulo já ficamos extasiados com o enorme exemplo de fé do jovem Pancratius, que recebera o exercício de desenvolver a frase "o verdadeiro filósofo deve estar sempre disposto a morrer pela verdade." Seguindo suas convicções, mudou a palavra "filósofo" por "cristão", e "verdade" por "fé". Um colega pagão incomodou-se e procurou-o para uma luta, após a aula. Ao ver que Pancratius não cederia, insultou-o e agrediu-o. A seguir, o professor chegou e estava pronto para punir o agressor. Contudo, demonstrando um genuíno espírito cristão, Pancratius insistiu para que o colega petulante não fosse castigado. Ao relatar o episódio em casa, afirmou ter sido aquele um dia feliz porque havia vencido a luta do autocontrole!

Finalizo com uma citação, muito bem fundamentada historicamente (como todo o pano de fundo da obra, diga-se de passagem). A explicação sobre as causas das perseguições anticristãs no Império Romano não poderia ser melhor:

[...] O ódio ao cristianismo tinha origens políticas tanto como religiosas, pois era considerado contrário à prosperidade e à extensão do Império Romano, obedecendo a um poder invisível e espiritual. Os cristãos eram acusados de 'irreligiosi en Caesares', isto é, desleais para com o imperador, e isto bastava. A sua segurança dependia do espírito popular e qualquer demagogo ou fanático podia facilmente incitar contra eles os sentimentos de ódio e de vingança, sem que o seu procedimento, a sua atitude pacífica, conseguissem defendê-los das perseguições. (p. 76)

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