quarta-feira, 5 de agosto de 2015
Esse livro de Henri Pirenne (1862-1935) já nasceu como um clássico. Assim, parabenizo os tradutores Mauro Baladi e Regina Schöpke, e as editoras cariocas Contraponto e Ed. PUC-Rio pela publicação dessa obra em 2010.
O autor explica que, onde se estabeleceram (exceto na Bretanha), os germânicos mantiveram a língua como único meio de expressão (p. 110). As invasões não modificaram o caráter da vida intelectual na bacia do Mediterrâneo ocidental (p. 114). Até o século VII, nenhum indício anunciava o fim da "comunidade de civilização" estabelecida pelo Império Romano [segundo o H.-I. Marrou, essa comunidade foi o projeto de Alexandre Magno, e Roma, de fato, foi a responsável por criá-la]. "O mundo novo não perdeu o caráter mediterrânico do mundo antigo" (p. 134).
Para Pirenne, só a expansão do Islã, entre os séculos VII e VIII, pulverizou essa comunidade mediterrânica. "O germano se romaniza a partir do momento em que entra na România. O romano, ao contrário, se arabiza a partir do momento em que é conquistado pelo Islã" (p. 144). "O Islã rompe a unidade mediterrânica que as invasões germânicas havia deixado subsistir. (...) Trata-se do fim da tradição antiga" (p. 155).
A conquista da Espanha, em 711, e a imediata insegurança que se instalou na costa da Provença tornaram impossível a navegação comercial no Mediterrâneo ocidental (p. 155). "A antiga unidade econômica do mediterrâneo é rompida e continuará assim até a época das Cruzadas. Ela havia resistido às invasões germânicas, mas cede diante do avanço irresistível do Islã" (p. 157).
"O comércio não desapareceu (...), mas assumiu outro caráter. (...) A desaparição do empréstimo a juros comprova, por sua vez, a regressão econômica produzida pelo fechamento do mar" (p. 164). Posto isso, eis que se coloca a questão: por que os muçulmanos não assumiram o lugar dos antigos comerciantes do Levante bizantino? Pirenne explica que o nível de inimizade entre eles e os cristãos era tal que eles só pensavam em pilhar. Se os comerciantes árabes faziam comércio, faziam-no entre si. Os judeus, numerosos em todas os lugares, formaram a única classe cuja subsistência se devia aos negócios. Pelos contatos que tinham entre si, passaram a ser o único vínculo econômico entre o Ocidente e o Oriente (p. 165).
A partir desse ponto, a regressão econômica e cultural da Europa ocidental se acentuou. Como os cristãos não possuíam frota, o Ocidente tornou-se "um deserto e um alvo de pirataria". A seguir, os portos e as cidades foram abandonadas. "O laço com o Oriente é cortado, e nenhuma relação se estabelece com as costas sarracenas" (p. 174).
Pela primeira vez - e assim permanecerá durante séculos - o eixo da civilização ocidental foi empurrado para o norte, entre o Sena e o Reno (p. 175). Com o império de Carlos Magno (768-814), forma-se o "cenário da Idade Média" (p. 222). Após o Tratado de Verdun (843), esse cenário foi reforçado com a legislação econômica de Carlos, o Calvo e Luís, o Germânico. Tal legislação, "em vez de procurar fomentar o lucro, condena-o, ao contrário, como um torpe lucrum [ganho ilícito]" (p. 249). Enfim, "o Império Franco lança as bases da Idade Média europeia. Porém, a missão que cumpriu teve como condição prévia e essencial a subversão da ordem tradicional do mundo" (p. 280).
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